Eu Prometo Ser Sensato
Mantendo as atenções
Por Vitor Velloso
Reserva Imovision
“Eu Prometo Ser Sensato” de Ronan Le Page parece cumprir tabela enquanto os olhos seguem voltados à cosmética cinematográfica europeia de Cannes. O barato é industrial como parte do cinema comercial francês, com direito a todos os clichês românticos que conhecemos: do início conflituoso à viagem desesperada para o reencontro. É tudo de uma chatice tremenda, ou “blasé”, para traduzir junto ao consenso da língua. As coisas funcionam no automático, uma introdução catastrófica de personagem que vai ser desenvolvido a partir da relação conflituosa com outra personagem, em um processo de “auto descoberta” mútua que termina nas lindas paisagens europeias.
O bom e velho eurocentrismo reinando nas periferias. Filmes do lado de lá chegando à rodo no streaming brasileiro, contratos unilaterais de co-produção se amontoando em nosso mercado e a crítica se estapeando para saber quem fala francês, inglês ou alemão. Se é na crise que a burguesia cresce, a nossa aproveitou para se esbaldar com o descarte e, quem sabe, vender uns DVDs depois. Na Blooks ou na Travessa mais perto de você! Apenas na Zona Sul.
Le Page é incapaz de conseguir um momento decente sequer em “Eu Prometo ser Sensato”. Tudo é enlatado, programático e segue a padronagem do euro. É uma tentativa de romancear uma narrativa tediosa que segue à risca a modelagem norte-americana. Os diálogos rápidos de sempre, o naturalismo de quinta e aquela montagem que tenta encontrar o alívio cômico no rosto da explosão de seus personagens. Cada diálogo é uma tortura, mas cada vez que Franck (Pio Marmaï) explode ao ouvir falar de teatro, é a decadência em seu máximo. Desde os primeiros minutos o espectador percebe que aquele vai ser o gatilho engraçadinho que vai retornar toda vez que o longa conseguir, afinal o surto do personagem é clamar por atenção da crítica que dá as costas para ele. Acho que eles entenderam errado o “quando a gente não pode fazer nada a gente avacalha”. Afinal, o que fez o cinema francês chegar nesse ponto? A globalização a preço de dólar?
Cheio de piadinhas prontas, o longa vai se desenrolando para uma espécie de “Os Salafrários” europeu, só que ainda mais sem graça. Os problemas dos personagens são dados que se desenrolam com o passar da comédia romântica, se imbricando, causando confusão e conflito. E é onde as coisas ficam piores, porque o diálogo expositivo é desinteressante, mas o esforço para criar comicidade a partir do físico, é lamentável. E a direção de “Eu Prometo ser Sensato” até tenta criar algum dinamismo na direção, estacionando entre o classicismo e os planos mais enxutos, mas sempre cai nas mesmices industriais. La Page foi a bala de prata do descarte da produtora para assinar a bomba, assim espero.
O figurino francês de boa parte do mercado de distribuição cinematográfica brasileiro não é novidade para ninguém, mas as bombas que chegam aqui geram um panorama da atual situação lá: irracionalismo burguês, racionalismo burguês ou enlatado de quinta. Se aqui só a antropofagia nos une, lá é o eurocentrismo. E isso até que eles fazem bem, veja nossa situação.
Para o espectador que decidir se aventurar no pastiche artificial, irá se deparar com desesperadas tentativas de reatar com o charme decadente, um amontoado de clichês e alguns gritos para lembrar qual língua eles estão falando. Ainda que o entretenimento passe longe de “Eu Prometo ser Sensato” alguns poderão se divertir com o exemplo prático de como reproduzir dos norte-americanos, sempre mantendo o mesmo estilo de pôster. Uma espécie de advertência para os desavisados.
A exibição na Mostra de São Paulo há quase dois anos só reforça que o negócio “tá feio pro nosso lado”. O “termômetro” de distribuição está com algum tempo de atraso e o momento do descarte chegou.