Festival Curta Campos do Jordao

Diário Perdido

Ficha Técnica

Direção: Julie Lopes-Curval
Roteiro: Sophie Hiet
Elenco: Catherine Deneuve, Marina Hands, Marie-Josée Croze, Michel Duchaussoy, Jean-Philippe Écoffey, Carole Franck, Eléonore Hirt, Gérard Watkins, Romano Orzari.
Fotografia: Philippe Guilbert
Figurino:Dorothée Guiraud
Produção: Alain Benguigui, Thomas Verhaeghe
Distribuidora: Imovision
Estúdio: Sombrero Productions
Duração: 105 minutos
País: França/ Canadá
Ano: 2009
COTAÇÃO: ENTRE O BOM E O MUITO BOM

A opinião

O novo filme da atriz Catherine Deneuve pode ser caracterizado pela redenção de seus personagens, por uma chance de modificação do passado tão enraizado no presente. Os sentimentos brutalizados e defensivos transformam-se, humanizados por um diário perdido. A atmosfera francesa esta atuante na trama. A descrição do lugar, com música clássica e sons de pássaros complementam a historia de uma filha que vai passar o final de semana com os pais. Ela, independente, encontra a mãe, intransigente e atrasada, o pai, moderno e compreensivo, e o tio, sonhador e resignado como dono de seu Paradiso Café. O presente da filha, uma câmera digital, aos pais demonstra o estado de definição do ser de cada um.

Três mulheres, três gerações. Ao visitar os pais na sua cidade natal, na França, Audrey (Marina Hands) descobre o diário de sua avó Louise (Marie-Josée Croze), a única lembrança de uma mulher que abandonou sua família cerca de 50 anos antes. A busca de Audrey por compreensão revela um segredo familiar guardado em silêncio pelos anos, que vai, em última instância, aclarar a relação que tem com a mãe, Martine (Catherine Deneuve).

A filha vê a sua infância quando visita a casa dos avós. Com a desculpa de que precisa trabalhar e os barulhos que a mãe faz, como televisão alta, ela muda-se para a casa dos pais de sua mãe. Resolve comprar uma maquina de lavar louça, mas o encanamento não permite. Por causa disso encontra o diário, escrito por sua avó, tida como polêmica e esquecida na família, tanto que era chamada pelo nome de Louise, sobre sua vida com seu avô e seus filhos. O impedimento de trabalhar porque o marido não queria, de estudar inglês por causa dos rumores da sociedade. A liberdade de Louise tentando vencer a hipocrisia e a sensação de vazio da época não era vista com bons olhos. A ditadura do seu marido confrontava com a maneira que ela criava os seus filhos. “Não posso trabalhar, depois não vou poder falar”, dizia.

Percebemos que a personagem principal quer ser moderna, mas possui um desejo escondido, nostálgico, de recuperar a simplicidade, o bucolismo de uma praia quase sem ninguém. Ela dialoga sobre aborto, por estar grávida, questionando se deve ou ter um filho, se possui estrutura e jeito para cuidar de uma criança, mas transpassa o querer do que não diz, contudo mais explicito do que nunca, como se fosse um socorro. As defesas sempre são um pedido de ajuda.

“Vocês nunca foram me visitar em Toronto”, diz aos pais, mostrando o medo e a artificialidade de uma relação. Isso ocasionou exacerbar o individualismo para se afastar a solidão. Há um outro diálogo muito bem construído que exemplifica um sarcasmo latente dos franceses, é quase uma inveja sem querer ser. “Você mora no Canadá. Está boa de vida”, diz-se.

Há três tempos no longa. O presente, o passado e a interação destes dois, quando um interfere e dialoga no outra. A leitura do diário realiza o processo de concretizar em imagens interativas com os personagens de épocas diferentes os mesmos anseios e duvidas sobre o que fazer. Não se pensa em fantasmas, assombrações, visões, alucinações. “Fugi para continuar lúcida”, diz-se e complementa-se “Vou embora para encontrar uma nova vida e sermos felizes novamente”. O que se vê é uma historia projetada, quase holográfica. Não há separação entre os tempos. Isso faz com que a inteligência do espectador seja respeitada do outro lado da tela.

“Você só faz chorar sobre seu triste destino”, “Tudo irrita você”, “Minha filha é a mais conformista de todas”, os diálogos podem ser de qualquer tempo e mesmo assim cabem em qualquer uma das historias. As mentiras do avô manipularam a vida dos seus pais, os deixando frustrados e amargos. “Ela era meiga e triste”, diz-se. O seu pai metaforiza sobre como educar um cachorro “Ainda faltam algumas coisas, mas estou satisfeito”. O trabalho de sua avó pode finalmente ser terminado por intermédio de sua neta. “Você viu, ela pôs o vestido”, finaliza-se. Vale a pena ser visto. As interpretações têm um tempo para se aprofundar. Recomendo.

A Diretora

Julie Lopes-Curval é roteirista, diretora e atriz francesa. Participou, atuando, no filme “O colecionador” (1992). Dirigiu “Madame Butterfly” (2001), “Seaside” (2002), “Toi et moi” (2006) com Marion Cotillard. O seu último filme é “Diário perdido”. Roteirizou “The Role of her life” (2004).

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