Proerd
Por Vitor Velloso
Quando a proposta do filme é debater alguma temática contemporânea que está em alta, seja por interesse das ideias, ou apenas por oportunismo, deve-se levar em consideração uma possibilidade de ser equivocado no discurso que vai ser utilizado durante a projeção. Nestes casos, formalmente, mas acima de tudo em seu conteúdo. “Uma Viagem Inesperada” é um longa que possui alguns objetivos claros, o primeiro é ser acessível ao público, não à toa há uma aproximação na abordagem, nas escolhas dos atores etc. Um outro objetivo, é ser um drama familiar que força alguma catarse, apelando (com bastante frequência) para o emocional com uma pieguice única.
Dirigido por Juan José Jusid, que soa como estreante aqui, mas já possui uma vasta filmografia com mais de 15 filmes, “Uma Viagem Inesperada” irá contar a história de Pablo (Pablo Rego), que trabalha numa empresa petrolífera no Rio de Janeiro e namora Lucy (Débora Nascimento). Um certo dia ele recebe uma ligação em vídeo de sua ex-esposa que diz que o filho deles, Andrés (Tomás Wicz), levou uma faca para o colégio e que ela precisa do apoio do pai do garoto, Pablo, para resolver essa mudança de atitude muito grave no filho. Então ele retorna à Argentina e decide fazer uma breve viagem com o garoto, buscando uma reaproximação.
Além da trama já ter sido contada, de maneiras mais interessantes, um milhão de vezes, existem questões formais que chamam a atenção com três minutos. Aquela imagem lavada televisiva, com cor e estética de novela das sete, já causa um certo impacto. Toda a construção da encenação com uma música piegas, dirigindo pela orla do Flamengo, esbanjando sorrisos, lembra uma propaganda publicitária. Em seguida, a cena da ligação, onde uma decupagem precoce, pouquíssimo fluida, sem ritmo algum, domina a cadência. É difícil manter-se esperançoso após este início, mas as coisas vão mais fundo. Pois sua intenção de manter-se acessível ao grande público justifica tudo isso. Porém, quando o longa decide debater a questão do Bullying, assunto central do texto, e o jovem contemporâneo, abuso de bebidas e drogas, é quando as coisas deslancham.
O Bullying não é um assunto que deixamos inerte a fim de ressuscitá-lo nos últimos 20 minutos de filme. É necessário um debate concreto e sério sobre o assunto, além da importância social já amplamente divulgada, há uma contextualização, infeliz e não-planejada, mas que é inevitável, o atentado de Suzano, que levantou diversas questões antigas sobre o tema e nos lembrou de outros massacres que devem ser discutidos. Além disso, a questão do adolescente, que possui 16 anos, é curiosa, já que ao tentar mostrar como esse efeito cascata reage diretamente na psique do adolescente, o texto além de confiar demais na atuação de Tomás, que não cumpre o que tá no papel, acredita que sua primeira reação a isso, é um episódio de violência em potencial, quando levou a faca ao colégio, mas que deságua em bebedeira e uso de drogas. Ora, se um caso de rejeição social se resolve em âmbito social, com “rejeitados” que parecem ter saído de malhação, onde todos os padrões de beleza e arquétipos do belo devem ser cumpridos, os casos seriam mais simples do que parecem não é? Além do mais, relacionar a delinquência de um pequeno grupo de jovens, às drogas e bebidas, parece um bocado precipitado, visto que a grande maioria das reações ao bullying é exatamente um isolamento social, aliás, existe um abismo entre os dois grupos que ele tenta unificar. E quando vemos de fato onde ele vai, na festa, é necessário rir, já que o ambiente é periférico, com latas de lixo pegando fogo, jovens passando de um lado ao outro com skate e bicicletas, bebendo direto da garrafa, fumando e usando maconha. Uau. Reconstrução de uma visão (branca) setentistas de como funcionavam os guetos norte-americanos. A diferença é que aqui estamos na américa latina e o caucasiano Andrés, meio Peter Parker do Tom Holland , flerta com uma garota para esquecer seus problemas na escola e familiares.
A fotografia fria e lavada, novelesca, que domina a projeção inteira, aliada dos diálogos pavorosos, expositivos e quase cômicos de tão descontextualizados, somada a direção de Jusid, arquiteta um dos piores filmes do ano.