Crítica: Uma Viagem Extraordinária
“Eu acho que um filme é como
um trem de brinquedo. Lembro que quando tinha nove anos de idade, eu criei um
teatro de fantoches, e meus pais pagaram tudo e ajudaram na iluminação e nos figurinos.
Lembro da câmera Super 8, seu som e sua vibração… era algo como Monty Python.
Eu pensei que tudo o que eu tinha que fazer era comprar uma câmera e se tornar
um diretor de cinema. Então, quando eu saí da escola eu trabalhava em uma
empresa de telefonia, que me deu o dinheiro para comprar o equipamento básico,
incluindo a câmera, o projetor e a tela”, disse o diretor Jean-Pierre Jeunet.

Por Fabricio Duque

É inevitável não pensar nos
filmes anteriores (“O Fabuloso Destino de Amélie Poulain”, “Delicatessen” e “Micmacs)
do diretor francês Jean-Pierre Jeunet, quando um novo longa-metragem é
apresentado. “Uma Viagem Extraordinária”
humaniza os personagens, utilizando-se de uma fotografia de cores vivas e de “animação”
realista e da câmera, que passeia entre uma realidade projetada (personificada
em cenas do que se pensa) e uma fantasia exemplificadora. A narrativa ambienta
uma vida simples de montanha, interiorana, naturalista, de fazenda, com “invenções”,
pais apaixonados (pai “silencioso” e mãe “obcecada” por insetos) e irmã fútil
(querendo ser famosa apenas por sua beleza), meio “A Invenção de Hugo Cabret”
de Martin Scorsese, meio “A Espuma dos Dias” de Michel Gondry, meio “O Menino e
o Mundo” de Alê Abreu, meio “O Grande Hotel Budapeste” de Wes Anderson. Individualidades
e comportamentos idiossincráticos são respeitados e “entendidos”. Jeunet faz
com que o espectador vivencie a máxima de que “quando se é criança toda
fantasia é real” pelos olhos de um menino prodígio que tenta entender “o mundo”,
suas habilidades avançadas e da “distância exata entre elas” e o pai “que
nasceu cem anos depois em uma época errada com silêncio caubói como regra”. “Desconfie
da mediocridade, é o mofo do mundo, é preciso lutar constantemente contra ou se
alastra”, diz-se. É a fábula do crescimento pelo existencialismo nostálgico,
estimulando questionamentos sinestésicos do público, e do conhecimento de mundo
(o Pêndulo de Foucault) “O imbecil é aquele que disfarça o que não sabe com uma
boa piada”, filosofa-se com opiniões já enraizadas, figurativas e de “histórias”
“Road-movie”. A “inteligência superdotada” é confrontada com o “complexo de
superioridade”. “Um eco de mim mesmo, rodando em círculos como morcegos”,
diz-se entre metáforas do desapego, “sorrisos verdadeiros e falsos”, “movimentos
perpétuos” e “parábolas” analíticas de realismo fantástico. “Por que o homem
cria tantos ângulos retos, se são tortuosos e ilógicos?”, pergunta-se, quase
retoricamente pela falta de uma resposta instantânea. A receptividade “morna”
da crítica e público corrobora a percepção de que a opinião subjetiva tornou-se
exigente demais. Espera-se mais um “extraordinário” completo do que um “excelente”
básico por exemplo. Concluindo, um filme visualmente majestoso, encantador,
engraçado, despretensioso, perspicaz, ingênuo, de pureza proposital e de uma infantil crueldade
sincera. 

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