Tremor Iê

Eu odeio fogueiras

Por Vitor Velloso

Durante a Mostra de Cinema de Tiradentes 2019


Determinadas unanimidades do festival são comentadas em grande peso, infelizmente, normalmente, a unanimidade é burra, mas neste caso, me sinto um asno. “Tremor, Iê” era uma aposta da Mostra Tiradentes e todos comentavam sobre o momento de sua projeção, pois tratar de um tema tão peculiar feito o roubo dos restos mortais de Castello Branco, logo em momentos políticos tão conturbados como esse, é algo minimamente inusitado. E faço minha mea-culpa que cheguei brevemente empolgado na sessão, pois acreditava tratar-se de uma obra diferente, com um olhar distinto e uma abordagem completamente digressiva.

Acontece que nada disso se estrutura de fato na tela. E não crítico aqui de fato os olhares dos envolvidos, mas sim a condução que isso se dá. Planos longuíssimos de diálogos que parecem estar ali para cumprir tabela, com uma fogueira iluminando a situação. Não sei quanto tempo dura o plano, mas a sensação é de 30 minutos. E o que torna a experiência ainda mais frustrante é o fato de nos aproximarmos ideologicamente falando daquele universo, onde temos uma opressão às pessoas mais vulneráveis, que é tida como um governo futurista. A ideia simples de que aconteceu uma nova ditadura no Brasil e que devemos responder isso de alguma maneira, é válida e extremamente aplicável. Porém, parte do futurismo proposta por Elena Meirelles, Lívia de Paiva e pela direção de arte, funciona mais como artifício estético que puramente dramático, inclusive, revela algumas fragilidades durante o processo de montagem que circula a fim de criar alguma tensão durante a tentativa de conclusão final, mas falha em não conseguir acompanhar o som (que também não ajuda em nada) e peca em dar uma cadencia minimamente satisfatória aos absurdos de construção de universo.

Além de vários desistentes, assim como em diversos outros longas, “Tremor, Iê” conseguiu um Hater violento na saída, que quase gritou já próximo a rodoviária da cidade “Pelo amor de Deus, esse filme é a pior coisa do ano”. Além da explícita categorização excessiva e equivocada, aliás, já tivemos exibição ainda mais conturbadas apenas aqui em Tiradentes. A pretensão de fincar sua bandeira em seu pior de 2019, ainda em janeiro…temos um vidente. Mas de fato a experiência de assistir ao filme, não se torna prazerosa pois o excesso de tempo em um único plano, aliado do desinteresse geral pela caracterização do universo ali concebido, força a amizade.

As caracterizações que são dadas não apenas aos personagens, mas a própria misancene que é concebida ali, decepciona o espectador, pois, no primeiro plano observamos a protagonista acelerando com uma moto na estrada, num espírito raivoso mas libertador. E todo o plano parece que funciona, até a música entrar. E já no final, daquele projeto que chamaríamos de terceiro ato, ou conclusão, vemos uma rima visual com a primeira se dar tanto no campo formal, como narrativo. Algumas inclinações políticas que a obra parece tomar, se enveredam para outra direção ao vermos a progressão da narrativa, não há o que comentar quanto a isso, além do claro, a misancene das diretoras diante uma tensão dramática, não funciona, O que, enquanto brasileiro minimamente pensante para refletir todas as questões que estão acontecendo no Brasil nos últimos cinco dias (sim isso é uma especificação pessoal), me agrada, é este esforço em proclamar uma nova libertação, para passar por cima dos fantasmas do nosso passado, não à toa, revemos a figura de Castello Branco, para ser derrubado novamente. E assim como já aconteceu com diversas outras obras este ano, pequenas frases ou citações deixadas no fim, buscam aplausos enlouquecidos da plateia, e consegue, pois como eu comentei há um tempo, a última imagem é a que fica. Além de dar uma falsa projeção das opiniões, há manipulação ideológica que há em toda a construção, sem permitir olhar para o próprio umbigo afim de não errar novamente. Pois o que vemos hoje é a desgraça dos erros anteriores, o triplo dos erros do atual, mas sem treinar o olhar para pisar nos locais errados. E entendo que nostalgia, ainda que em um futuro, seja um dos recursos possíveis do longa, não conseguiu fisgar a grande maioria do Cine-Tenda.

1 Nota do Crítico 5 1

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