Amadurecimento em francês
Por Vitor Velloso
Comédias dramáticas que envolvem o amadurecimento de seus personagens são extremamente comuns no mercado cinematográfico, mas quando esse amadurecimento surge de uma reflexão futura partindo de seu eu vinte cinco anos mais velha, temos algo brevemente diferente dos padrões da indústria. Longe de ser original o longa “Quando Margot Encontra Margot” chega aos cinemas brasileiros no mesmo esquema da maioria das distribuições de longas franceses, nas áreas nobres de cada cidade, na maior concentração de brancos por metro quadrado. Também sem fugir dos clichês europeus, trata-se de um filme esquecível que até o fim do mês saiu da memória da maioria dos espectadores.
Dirigido por Sophie Fillières, que escreveu junto com Grandrieux o inesquecível “Sombre” (1998), o produto francês possui uma narrativa convencional e uma construção dramática bastante comum, a diferença é que sua abordagem apesar de soar imatura à primeira vista, consequência de sua direção e da fotografia, mas que reserva algumas camadas interessantes, que mantém seu filme minimamente assistível. Ainda que parte dos diálogos entristecem a alma e alguns momentos onde o drama deveria tomar conta de maneira mais sutil, e nitidamente era a intenção, a música não ajuda em nada, o projeto reserva uma pequena reflexão do ser humano dentre sua jornada ao desconhecido (amadurecer), mas com “colas” do futuro. Enquanto parte da indústria buscaria um senso cômico por trás de tudo isso, aqui também ocorre, mas sempre há espaço para uma pequena autocrítica, será que essa muleta do que fazer não atrapalha diretamente o progresso dela enquanto pessoa? Mas principalmente, enquanto mulher? Claro que nenhuma das respostas vão muito no cerne da questão, ficam mais na superfície servindo de “moral da história” aos desavisados, com um nível de exposição que incomoda o bom senso à medida que o público vai sendo subestimado e à necessidade de expôr gravemente as intenções da autora torna-se um dos pontos frágeis da narrativa.
As atuações estão compatíveis com os papéis, não se destacam demais e conseguem transmitir bem aquilo que o texto pretende. A fotografia fica em um esquema televisivo bastante comum desses projetos de dramédia. A cadência do filme fica naquele esquema de clichês, um ritmo lento, beirando o tédio, salvo por uma tirada ou outra. Aliado da misancene pouco criativa de Sophie, a montagem não constrói nada e fica em um automatismo pouco produtivo. Frustrante é um bom adjetivo que serve de síntese à experiência de assistir ao longa, pois quando acredita-se haver uma substância curiosa no texto que pode ser desenvolvida à algumas reflexões do que define a mulher, acima do próprio processo de amadurecimento convencional cinematográfico, na verdade é só um verniz que serve de gancho para os otimistas de plantão. E os pequenos gatilhos utilizados pela cineasta são tão pobres e esteticamente enquadrados no senso comum, que nada que está sendo projetado na tela consegue surpreender. Mesmo as partes cômicas, que ainda que arranque um riso ou outro, não sustenta quase uma hora e quarenta.
Quanto mais produtos como este chegam nos cinemas, menos esperançoso ficamos acerca da questão dos exibidores no Brasil, que sempre priorizam os estrangeiros e que tendem à uma mediocridade assombrosa. Enquanto diversos filmes brasileiros buscam salas para serem exibidos, diversos franceses, norte-americanos, britânicos e argentinos lotam as salas da nobreza tupiniquim que apenas fica mais europeizada. A colonização cultural aguda que vivemos no cinema que é financiada pelas distribuidoras e exibidores, apenas agrava nossos meios de produção e quantidade de público. É difícil chegar nestes cinemas da Zona Sul carioca e achar um longa brasileiro, principalmente se não for da chanchada global. Desta forma, é de se comemorar que um Cine Arte UFF e a Cinemateca existem, e o IMS fica restrito na Gávea.
“Quando Margot encontra Margot” não é tóxico diretamente, muito menos propositalmente, sua despretensão deixa claro isso, há uma intenção maior em números de bilheteria e só. Por tabela esses filmes europeus vão padronizando os brasileiros, a ponto de diversas se referirem a eles com o título original, fazendo biquinho aqui e acolá para pronunciar certo na língua-colonizadora-mãe, “La Belle et la Belle”, não possuem nem o trabalho de traduzir, apenas evoca um poética especial diante da frase mas reserva o conhecimento ao seu clubismo eurocêntrico. Não traduzi pois não conheço a língua, mas fica cada vez mais desinteressante conhecendo seu público.