Adjetivos
Por Vitor Velloso
Alguns projetos desafiam o espectador. Em todos os sentidos que esta afirmação exala, sou obrigado a dizer, “O Galã” é um destes. O filme cria um esforço tremendo para compor uma narrativa… Olha, talvez haja uma ética na crítica que julgue minha atitude no texto abaixo, mas a verdade tem de ser dita, esse longa é uma vergonha.
“Mas não cabe ao crítico adjetivar isso e aquilo”. Sim, tem razão. Mas existe um limite humano do aceitável. Claro que não há alguma surpresa que a desgraça toma conta das comédias chanchadescas brasileiras, aliás, todo mês uma gangrena fílmica é lançada no Brasil. Este modelo norte americano de humor já vem dominando o país há tempos, a colonização cultural já se infiltrou de tamanha maneira que emplacou grandes sucessos de bilheteria como “Minha vida em Marte”. Cada projeto novo que chega, nos deixa mais claro que se não há cobrança quanto a qualidade do material, a tendência é só piorar, e não acredite que estamos no fim do poço, dá pra fazer algo pior que “O Galã”. Afinal, Danilo Gentili e cia, estão por aí.
A trama é tão desinteressante, que nem a narrativa que o diretor, Francisco Ramalho Jr., tenta utilizar, acompanha. É incrível como não há nenhum tesão no que está em tela, apenas cifras e fama. Fiuk, já conhecido por sua atuação duvidosa, divide tela com Thiago Fragoso, com seu histórico “brilhante”. Na história, há uma disputa entre eles, para decidir quem irá ocupar um papel na novela, escrita por um autor assombrosamente caricato, “interpretado” por Luiz Henrique Nogueira. Essa luta entre os dois, acontece durante a projeção, onde devemos decidir quem está pior no papel ou qual o pior personagem.
“Quantos adjetivos” Sim. A recusa de me dispor à escrita em uma aberração cinematográfica como esta, está no simples fato de sacrificar parte dos meus neurônios e de flagelar meus olhos com cada segundo de “O Galã”. A preguiça que há em cada quadro, cada linha de diálogo, não é exclusiva ao público, é nítido ver o desleixo com a condução do filme, que não há trabalho mínimo com o produto. Não há a menor dificuldade em entregar tudo que está na pauta, aliás, é pré-determinado, está praticamente pronto. O trabalho de autoria, não existe. É triste reconhecer nos maiores sucessos de bilheteria, não apenas os piores filmes do ano, mas também os mais tóxicos à indústria. Esse modelo de mercado falido que sustenta um ciclo de cópias baratas de modelos norte-americanos e de auto-referência. Ou mesmo de adaptações literárias de médio porte que buscam um público infanto-juvenil. O famigerado “Galã” está entre as duas propostas. Mirando espectadores em uma faixa etária mais infantil.
É triste, mas curioso, ver como a linguagem da internet dominou completamente esses produtos, seja na linguagem, temática ou mesmo mediocridade. Não faço aqui juízo de valor a qualidade de determinados conteúdos, porém, especificamente, de youtubers que irão sugar toda a futilidade que existe em uma geração e fomentar um grau de alienação tão assombroso quanto o resultado destas transposições à tela grande. E este tipo de formato vem se tornando cada vez mais famoso no Brasil. Além da fotografia, se é que podemos chamar isso de fotografia, composição e encenação, a própria futilidade tomou lugar no cinema. Enquanto os bolsos dos produtores enchem de dinheiro, o cinema brasileiro clama por ajuda, além do mais, se neste país, há cota de filmes nacionais, quase sempre, estas vagas serão preenchidas por estes projetos, pois os exibidores também querem dinheiro e sabendo que estas são as bilheterias fáceis, darão preferência. Dando início a uma falsa noção de progressão.
Tá certo que o problema é antigo, mas agora com o marketing visceral amparado pelas redes sociais, a viralização destes… troços. Detesto ser categórico, mas neste caso é impossível.
Para além da montagem sem ritmo, da fotografia preguiçosa, da misancene de youtube, da atuação tenebrosa e dos diálogos expositivos, há o tratamento caricato do que seria de fato um processo artístico. Um novo nível de moralismo à la anarquia.
No fim das contas tudo que se espera do Fiuk é entregue como produto em “O Galã”. A vergonha que dá de sair da sala de projeção e olhar para outras pessoas, é indescritível.