Gnomeu e Julieta: O Mistério do Jardim
Uma ode ao materialismo vulgar por dois olhares
Por Gabriel Silveira
Por Vitor Velloso. Era uma vez… num lugar muito muito distante, onde pessoas viviam na cidade dos anjos, um elenco milionário foi chamado para fazer um filme de animação do “Gnomeu e Julieta”, e olha que o elenco nem era ruim Johnny Depp como Sherlock Gnomes, Emily Blunt como Julieta, James McAvoy como Gnomeo e Chiwetel Ejiofor como Watson. Bom, o resto da história vocês vão acompanhar mais pra baixo, mas já adianto, não termina bem.
A animação “Gnomeu e Julieta: O Mistério do Jardim” conta a história de uma sumiço repentino de ornamentos de jardim, onde Sherlock Gnomes e Watson vão investigar, com a ajuda não desejada de Gnomeo e Julieta. A narrativa não consegue cativar, nem segurar a atenção do público. Ela é contada de maneira apressada e desordenada. Os estímulos visuais e a animação plástica sendo exposta a cada frame, dão o tom às crianças. As vozes combinam com os personagens, pois parte dos atores já haviam trabalhado na franquia anteriormente. Sim, há um filme do Gnomeu e Julieta de 2011. Mas ainda que as vozes combinem, não podemos deixar de notar que o sotaque britânico recair para Gnomeu, já que McAvoy é inglês, e não para Sherlock (que originalmente é britânico). Ver Johnny Depp, que vive uma fase terrível na carreira, forçar um sotaque, é… triste.
A comédia de “Gnomeu e Julieta: O Mistério do Jardim” gira em torno de piadinhas corridas e soltas à narrativa. Geralmente envolvendo alguma moralidade semi-fabulesca, quando não é uma anedota de gênero, envolvendo algum gatilho comercial oportunista. John Stevenson, diretor, possui certa experiência com o cinema de animação, com seu Kung Fu Panda, que gerou uma bilheteria considerável, mas críticas divididas. Seu novo longa, não sei se fará tanto dinheiro assim, pois seu apelo comercial é certamente inferior.
A irreverência dos acontecimentos, que desafiam a lógica de construção narrativa, são verdadeiras deixas para criar dinamização na animação canhestra. Que apesar de possuir uma variedade breve de detalhes, falha em suas texturas. As cores são vívidas para hipnotizar o olhar infantil, mas seus tons saturados cansam os olhos e tudo fica artificial demais, todos os personagens parecem bonecos mal pintados comprados na loja da esquina.
Por Gabriel Silveira. E é nesta plasticidade fracassada dessas personagens que “Gnomeu e Julieta: O Mistério do Jardim” aproveita uma deixa para cair em uma canonização de uma estética que não parece, a priori, uma intenção da direção, não que a intenção desta seja relevante quando se tem o produto final em mãos. Mas, no discurso deste enredo que utiliza de um aproach para com um um imaginário infantil — quase como de um criança que estrutura enredos de improvisos com suas peças de brinquedos em seu jardim — torna-se funesta a experiência de assistir toda a construção deste imaginário de um âmago, uma essência, absolutamente materialista. “Toy Story” teve uma aproximação da condição do brinquedo em sua narrativa de uma maneira que toda uma vulgaridade consumista do status-quo do produto infantil pudesse ser permeado pelo lúdico emanado do carisma daquelas personagens que gerava um senso de compreensão, de uma empatia para com o lúdico na fantasia infantil por parte dos produtores da franquia, capaz de resultar numa verosimilhança funcional.
Em “Gnomeu e Julieta: O Mistério do Jardim” a vulgaridade do materialismo e do consumismo norte americano globalizado é abraçado como se por um polvo, com todos os seus tentáculos e ventosas. Na odisseia dos gnomos catalisada pelo martírio do universo canônico das figuras de Sherlock Holmes de jardim toda a figuração do produto, do plástico, embalagens, uma ostentação de stream de smartphones, um show de dança de cabaré performado por uma pseudo-Barbie lutadora de boxe cantando um pastiche de canção pop da Billboard 40; tudo isso é sintetizado numa decupagem barata e esquética que falha miseravelmente em até mesmo alcançar algo próximo de um ponto doce de um almejo funcional de um público alvo ideal. Para uma audiência adulta, o cômico, que procuram, falha neste embrace do distanciamento do lúdico que procura tangenciar temáticas adultas de uma maneira blasé mascarada de infantil. Para uma audiência infantil, tal ode ao materialismo vulgar afirma-se como uma toxina fatal as mentes em fase de crescimento.