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Amanda

CRÍTICA

Dramas em lágrimas encenadas

Por Fabricio Duque


A essência da arte do cinema é contar histórias. E os franceses sempre conseguiram aproximar ainda mais a conexão do público a trama abordadas em seus filmes com análises existencialistas dos comportamentos sociais, estes humanizados cúmplices na transmissão de emoções teatralizadas. Sentimentos passionais sempre foram permitidos como alegóricas inerências. Mas a Nouvelle Vague, movimento que lutava pela fílmico francófono não encontra mais espaço, porque o mundo mudou e acelerou demais seu tempo de percepções de coisas e suas relações interpessoais. “Amanda” ainda que busque uma revisitação, sofre com a própria modernidade de um mundo em paranoia. O medo foi e está mais visível e com liberdade cerceada. Esta é a premissa do longa-metragem dirigido pelo francês Mikhaël Hers (de “Aquele Sentimento do Verão”, 2015).

“Amanda”, exibido no Festival de Veneza 2018, também corrobora outra interferência direta: a estrutura mais suavizada, popular e palatável advinda da televisão, que por sua vez tenta se adequar às obras mais de Hollywood. É gritante a semelhança. Assim, o aprofundamento do drama é simplificado por manipulados e apelativos gatilhos comuns demasiadamente sentimentais. O espectador entende completamente o caminho proposto. A primeira parte constrói um cotidiano mágico e de sonhos à moda Disney, de apresentação-preâmbulo, a fim de familiarizar quem assiste com a intimidade de indivíduos que passarão por um trauma pessoal de cunho sócio-político.

Um homem de 20 anos (o ator Vincent Lacoste), entre bicos e o trabalho de podador na Prefeitura, vive adiando o tempo para tomar decisões mais sérias. Este sonhador solitário sucumbe ao encanto de uma vizinha recém-chegado. Porém, o ritmo descontraído de sua vida aumenta sua velocidade quando sua irmã mais velha é brutalmente morta em um ataque. Agora, ele deve se encarregar de sua sobrinha de sete anos, Amanda (a atriz mirim Isaure Multrier que interpreta a protagonista e seu ponto de vista).

“Amanda” é sobre a ressignificação da sociedade, que precisa aprender rápido e urgente a teoria de Darwin de “descender com modificações” e “os organismos mais bem adaptados ao meio têm maiores chances de sobrevivência”. Mas a aceitação leva tempo e aos poucos ganha naturalidade. Como se o passado fosse esquecido e muito distante. Aqui, uma ação modifica toda uma família. A crônica estuda de caso aborda crescimentos, novas organizações e re-agrupamentos. Com ou sem música de Elvis Presley.

O filme pode ser considerado uma modernista fábula social. A liberdade de ser e existir é encarcerada por uma tragédia, que reverbera um cerceamento vendido como proteção. O sonho de antes vira a crua realidade. Mortes, estatísticas. O sentimento de medo gera mais medo em um círculo vicioso de destruição psicológica de cada um. Acostuma-se. Inevitável ao ser humano. Continuar vivendo com o novo não mais livre.

Mas há em “Amanda” uma escolha que ajuda a deixar o filme na superfície: a interpretação do ator principal. Nós precisamos falar sobre Vincent Lacoste (de “Conquistar, Amar e Viver Intensamente”, “Diário de uma Camareira”, “Camille Outra Vez”) que opta pela zona de conforto em uma encenação altamente dramática, sensivelmente fora do tom, com artifícios de choros histéricos sem lágrimas. Talvez seja responsabilidade demais. Talvez tenha faltado um pulso mais forte da direção de Mikhaël Hers. Há quase uma confusa inversão de conceitos. Na parte um, o sonho quer a teatralização da alienação existencial e os atores estão mais realistas, já na segunda, o ambiente é a realidade com seus atores pesando a mão em emoções clichês. Qual a verdade a ser consumida?

Contudo, apesar de seus desequilíbrios e irregularidades, o longa-metragem conserva sua essência: a de ser um drama potencializado nas tragédias de fim e recomeço. Que nunca foi e nunca será fácil. Só que para o espectador ajudar o filme, o filme precisa ajudar o espectador. Com tantas voltas, viaja para reconquistar, volta para reconquistar, brigas-conflitos armados demais. É tanto sobe e desce dentro da superficialidade temática que nós temos a certeza que seu diretor perdeu uma grande oportunidade de realizar uma obra-prima. Talvez “Game of Thrones” esteja errado na frase “o mal sempre vence”, porque a vida sempre dá um jeito de florescer com final felizes e novos começos. Como já dizia na animação “Rei Leão”, é o “ciclo da vida”. Sim, entendemos tudo isso. Não é um filme ruim, apenas comum e naturalmente ordinário que se iguala a “Elvis has left the building” (Elvis deixou o prédio, expressão que diz que se foi).

3 Nota do Crítico 5 1

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