Curta Paranagua 2024

Crítica: A Outra Mulher

Moralismo à la demente

Por Vitor Velloso


Daniel Auteuil, é um ator que provou algum valor na sua carreira por ter realizado alguns trabalhos de relevância, inclusive por ter trabalhado com o mais que superestimado Michael Haneke, participado de “Rainha Margot”… Porém, nota-se uma predisposição tenebrosa para participar de projetos dignos de pena, no últimos anos, assim como seu já recorrente companheiro de trabalho, Gérard Depardieu. E “A outra mulher” é um desses exercícios que não se compreende a existência, muito menos porque um ator de, relativo, renome, se dispõe a dirigir.

Dirigido pelo próprio Daniel, a comédia-romântica brega que chega aos cinemas, narra a história de Daniel (espero que não seja autobiográfico), um homem comum francês, com uma vida rotineira e uma baita crise de meia idade à flor da pele. Em uma noite, ele convida seu melhor amigo Patrick (Depardieu) para jantar em sua casa, e convida, claro, sua nova namorada, Emma (Adriana Ugarte) para acompanhá-lo. Porém, Patrick já havia terminado com a melhor amiga da esposa de Daniel, irritando-a por seu marido ter convidado este homem para jantar na sua casa. Ao chegarem, Daniel fica completamente estarrecido com a beleza de Emma e passa a fantasiar uma vida de fugas e aventuras ao lado dela.

O roteiro é adaptado de uma peça do próprio roteiristas, o que explica o caráter absurdamente moralista e misógino da trama, Florian Zeller, o filme prova que não há idade para ser escroto. Com o perdão da palavra, é claro. Sem querer ofender, óbvio, mas um longa sobre como é difícil aguentar estar casado, enquanto uma mulher linda e libertina está na sua frente, aparentemente, ou ao que você acha, te dando mole. “A Carne é fraca” como já diziam as vítimas do feminicídio massivo que é corroborado e patrocinado por roteiros como este. Ou será que quem disse isso foram os próprios homens? A questão é, não tem graça. Se a idade, às vezes, é um papel definidor para categorizar determinados preconceitos, a mente ao menos deveria evoluir, ainda mais tratando-se de um dramaturgo de 39 anos. Gangrena cefálica é assunto sério e deve ser tratado. Se minhas palavras e comparações estão rígidas demais, é por um motivo simples. Estou compondo um fetiche concreto por ver os moralistas sofrendo das próprias mágoas e incertezas masculinas. Pois, sem dúvida, esta reação ao corpo feminino é um reflexo de algum complexo de masculinidade, ou falta de caráter, vindo dos pais, ou construído por uma cultura de potenciais estupradores.

Obviamente, me refiro a potenciais estupradores, qualquer homem. Mas não, no filme de Daniel, não é assim, né? É apenas um retrato de um macho (abre aspas) frustrado tendo um devaneio de liberdade, com uma mulher linda e perfeita, receptiva e festiva, sedutora e inteligente… A gueixa que ele queria possuí feições latinas, não à toa ela é espanhola. A misoginia é imperialista, muda de forma e consome no imaginário popular, a mulher. Parece que estamos diante da história de “Moema”, porém virada para um homem comum francês. Quase uma mea-culpa de seu passado etnocida, mas ainda mais hipócrita e nocivo. Da mesma maneira que Griffith, em “Tolerância” pediu desculpa pelas suas atitudes racistas em “Nascimento de uma Nação” ele é homofóbico, com dez minutos de filme. A diferença é que o moralismo na época, era visto como algo natural da sociedade, mas graças a “equalização” dos conhecimentos, leia-se classe média, e hoje em dia, temos a militância ainda que um bocado ignorante, pelas redes sociais, destruindo e combatendo essas estruturas sociais patriarcais que perduram não apenas na sociedade como na arte.

A mentalidade vinda do ensino médio com piadinhas envolvendo trocadilhos possivelmente sexuais, é mais um exemplo da qualidade do projeto. Tenebroso é o mínimo que podemos falar do resultado. Em uma tentativa de pedir desculpas ao passado dos atores, principalmente Depardieu, um pôster de “Terra Treme”, de Luchino Visconti, estampa uma das paredes da casa, gerando algumas pequenas convulsões nos neurônios que tentavam compreender o que se passava na tela.

E se o machismo estúpido parece datado já na tela, imagina se na política nacional víssemos o mesmíssimo pensamento saindo das bocas de um semi-nazista. Agora, imagine se ele fosse um presidenciável? Hm… Será?

1 Nota do Crítico 5 1

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