Cinema Has Been My True Love: The Work and Times of Lynda Myles

Amor e cinema: indissociáveis

Por Paula Hong

Durante o Festival É Tudo Verdade 2024

Cinema Has Been My True Love: The Work and Times of Lynda Myles

A reflexão sobre os feitos ao longo da vida, pessoas que deixaram suas marcas, trocas produtivas, ações em prol da arte — tudo isso suscita recobrar uma diversidade de acontecimentos que marcam uma vida inteira. Faz sentido que o formato que engloba tais reflexões seja o cinema quando anos de dedicação foram atribuídos a ele. É o caso de Lynda Myles no novo documentário do crítico e cineasta irlandês Mark Cousins, dono de longos títulos como “The Story of Film: An Odyssey”, “The Story of Film: A New Generation” e “Women Make Film: A New Road Movie Through Cinema”, para citar alguns de suas mais prolíficas obras. Ele estreia no É Tudo Verdade deste ano o seu mais recente trabalho, “Cinema Has Been My True Love: The Work and Times of Lynda Myles”, no qual lança luz (tanto metafórica quanto literalmente) sobre a produtora, escritora e diretora britânica do Festival Internacional de Cinema de Edimburgo, Lynda Myles.

Seguindo a receita de seus filmes anteriores, Cousins conduz o documentário sem muitas elaborações técnicas e inovações no que tangue à montagem; permanece o combo da narração somada a imagens de arquivo/passagens de filmes citados e algumas raras intervenções pessoais que conferem ritmo ao filme. Nos primeiros minutos, já adverte: o filme foi feito com três câmeras, algumas lentes, 5 caixas de pizza e, claro, muita conversa. Assim, o filme se apropria das narrações de Myles que se coloca através dos feitos de sua vida no cinema — desde os primeiros filmes que assinou como diretora até a significativa passagem de consolidação de movimentos e iniciativas dos quais fizera parte — em contrapartida com o que se espera de um filme que esteja lidando com uma figura pouco conhecida mas ainda assim relevante para o cinema. 

O costume de estar atrás das câmeras reforça a dificuldade de falar sobre si. “Cinema Has Been My True Love: The Work and Times of Lynda Myles trabalha em torno deste aspecto de Myles de forma muito orgânica, de modo que suas experiências como produtora e, mais tarde, escritora e curadora da área de cinema atestam um acúmulo venerável de conhecimento sobre as áreas que somente anos de dedicação e trabalho conseguem oferecer. Por intermédio das narrações, as quais contêm impressões e relatos de filmes e personagem-chaves da história do cinema (às vezes de forma cronológica, às vezes não), somos contemplados com uma mulher que melhor se apresenta pelo que sabe sobre a sétima arte do que sobre um formato clássico biográfico que remonta todo o percalço que a levou até o cinema. 

Isso é simbolizado não somente pela narração mas também logo no começo da obra, com dois planos interpolantes: um frontal que registra o rosto de Lynda assistindo a algumas cenas de filmes (que mais tarde tece um breve comentário exposto em forma textual) e outro mais aberto que capta o espaço onde ela e o cinema são fundidos pela luz da projeção contra seu corpo. Embora belo, sugestivo na intenção de transmitir o entrelace inerente (conquanto tardio, como admitido pela própria Myles) entre ela e o cinema, ancorado nas falas manejadas pela montagem como uma espécie de devaneio, “Cinema Has Been My True Love: The Work and Times of Lynda Myles dificulta a devoção total da atenção (tal qual a personagem se dedica ao cinema) pelo ritmo demorado, alargado por empenhar-se na extração do máximo de alguém cuja dificuldade de falar sobre si é clara. 

No entanto, o filme é bem sucedido nessas tentativas de aproximação, de acessar certas camadas dela durante as cenas de passeio de carro, com a câmera a um palmo ou dois de distância de seu rosto que olha para além da janela do carro. Essa composição é atrelada às suas falas, com breves inserções de Cousins, instigando Myles a falar mais e mais sobre momentos canônicos — e outros menos, mas igualmente importantes — do cinema, conferindo a inegabilidade que a perspectiva e as contribuições ativas de Myles têm na construção de um tipo de cinema que acreditasse — aquele que concede lugar a quem pensa diferente, a quem rompe com regras incrustadas, a quem trabalha com apoio do anseio de trazer uma nova roupagem ao cinema sempre em ascensão. Ao cabo, “Cinema Has Been My True Love: The Work and Times of Lynda Myles, exibido no Festival É Tudo Verdade 2024, é um documentário que paga tributos a Lynda Myles, deixando que ela fale por si mesma: essa figura revertida pelo cinema, seu verdadeiro amor.

3 Nota do Crítico 5 1

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