Cabras da Peste
Chumbo uilis
Por Vitor Velloso
Netflix
A gigante do streaming volta suas atenções, momentaneamente, para o cinema brasileiro novamente. Divulgando massivamente “Cabras da Peste”, a Netflix busca pegar parte do público que acompanhou “Cine Holliúdy” e “Cine Holliúdy 2 – A Chibata Sideral” e alavancar alguns cliques a mais. O projeto é dirigido por Vitor Brandt e tenta colocar um pouco de riso no rosto dos brasileiros nesse período de isolamento social. Porém, por mais que Edmilson Filho e Matheus Nachtergaele se esforcem para compor um longa engraçado, esbarram constantemente em piadas genuinamente vexaminosas e um esforço constante do roteiro em uma cena engraçada que funcionaria de forma isolada. O tom expositivo reforça isso, trazendo cortes velozes para uma montagem que tenta jogar de acordo com as falas de seus protagonistas. Um barato entre o Guy Ritchie e uma versão tupiniquim, um tanto mambembe, de “Chumbo Grosso”.
O filme até se esforça em caracterizar o clichê como uma questão cômica que vai permear grande parte da obra: Cicatrizes, asiáticos que sabem lutar, Bruceuilis e resgates de cabras fazem parte de um esquema estereotipado que se utiliza das representações perpetuadas pela grande mídia ao longo dos anos. Porém, o longa sabe brincar com todos os clichês que permeiam sua construção. As cenas de ação são repletas de exageros, movimentos espalhafatosos, coreografia sem sentido, alívio cômico sempre que uma brecha é encontrada, sempre trabalhando na dicotomia dos “buddy movies”. Aqui, esse eixo entre os dois até consegue ser funcional em alguns momentos, mas os andamentos da narrativa são de causar bocejos.
Por sorte, a dinâmica entre Nachtergaele e Edmilson Filho gira em torno de fragmentos dessa trama e com isso, algumas cenas conseguem maior destaque, como a do interrogatório. Este é outro ponto basilar para que “Cabras da Peste” mantenha o espectador até o fim da projeção, são muitas participações “especiais” coadjuvantes que vão se amontoando e que acabam dinamizando um pouco, criando novas oportunidades e estilos humorísticos, na particularidade de cada um. Aqui, explica porque a fragmentação se torna um recurso narrativo da obra, pois confia diretamente em setores específicos da trama (quando não elabora novos) para que haja uma nova brecha humorística para ser explorada.
Pode até ser que parte do público tenha uma boa experiência com o filme e consiga fazer do riso uma constante. Existem muitos motivos que conseguem alavancar o longa para esse boca-a-boca frenético que está acontecendo. “Cabras da Peste” mira cifras e consegue uma boa repercussão, apostando alto no carisma de seus protagonistas, que conseguem atrair um público que acompanha a carreira dos dois atores, a Netflix prova que sua publicidade vem sendo funcional e o projeto está sendo comentado por todos. Mas antes de tudo, é um entretenimento que sabe muito bem o que está fazendo no gênero e como sacanear ele, assumindo o tosco como a estética possível.
Em um momento como esse, com o isolamento social e uma política genocida que se confunde nas palavras, o filme brasileiro em exibição na Netflix pode ser uma boa alternativa para tentar distrair um pouco a cabeça da enxurrada de notícias ruins diárias. E por mais que haja problemas na condução, no ritmo, em escolhas que a narrativa faz para forçar piada etc, é de alguma importância que um projeto desse esteja disponível para uma parte dos brasileiros, ainda que em um setor limitado.
A cena de diálogo no carro, sobre os filmes que eles gostam, revela uma consciência da própria forma cinematográfica. “Cabras” está preocupado com o simples, a exposição das recorrências “dramáticas”, da comédia, da ação, das pataquadas e por aí vai. É um modo automático de produção que se torna funcional mercadologicamente pela grande distribuição que a Netflix promove. Está longe de ser um filme sólido, ou mesmo engraçado de maneira constante, mas provoca uma risada ou outra, possui uma química fantástica com os protagonistas e alguns coadjuvantes de destaque. Acaba pecando no ritmo em diversos momentos da exibição e provando uma irregularidade que custa caro no fim das contas, contudo… eu ri bastante com os nomes dos irmãos.