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Bridget Jones: Louca pelo Garoto

E se ele for perfeito?

Por Fabricio Duque

Bridget Jones: Louca pelo Garoto

Em 2001 foi lançado o primeiro capítulo da saga Bridget Jones,  dirigido pelo olhar feminino de Sharon Maguire, sobre uma solteirona de trinta e poucos anos que começa a escrever um diário e relatar suas “desventuras” pelo jeito britânico  muito particular de ser: o de normalizar as idiossincrasias comportamentais e as transformar em características cúmplices e definidoras da personalidade de quem as vive, incorporando também todo um humor peculiar dos ingleses: mais direto, articulado, espirituoso, intolerante, debochado, desconfortável e politicamente incorreto (este por ser dito sem “papas na língua” verdades cruéis – e especialmente por tratar crianças como adultos, sem suavizar expressões mais “sapecas” e drinks “moleca safada”). É como se cada um deles existisse na solidão escolhida por monólogos verbalizados em fluxo de pensamento, e que o outro apenas participa como um material cognitivo para estimular o falar e completando o vazio do silêncio. 

E vinte e quatro anos depois, um novo capítulo, dirigido pelo olhar masculino de Michael Morris, chega aos cinemas para o deleite de um público nostálgico e que entende toda essa melancolia enraizada dos “súditos da rainha”. “Bridget Jones: Louca Pelo Garoto”, o quarto filme da série, baseado no livro homônimo de Helen Fielding (e que também assina o roteiro junto de Dan Mazer junto e Abi Morgan), corrobora toda essa pilhéria ácida, espontânea, perspicaz e adulta, e funciona como uma análise de nossos tempos modernos (inclusive pela contemplação das “notas suaves e graves da vida”), ainda que o filme busque conservar uma atmosfera mais atemporal, a fim de trabalhar a questão das emoções universais, sendo a mais importante delas o eterno embate entre a solidão, dissecada como patológica, e encontrar o amor perfeito (no “objeto de desejo” do homem mais jovem, vivido pelo ator Leo Woodall, versus o “conforto” do professor de seu filho, vivido pelo ator Chiwetel Ejiofor. O longa-metragem aqui vai pelo caminho de lista prós e contras. Entre a opção imatura de se ter beleza jovem (muito mais para provar aos outros que a pessoa em questão é “vencedora”) e a opção mais confortável, a da estabilidade de aceitar uma pessoa normal. 

Neste “Bridget Jones: Louca Pelo Garoto”, a narrativa conduz seus espectadores pela edição ágil da rotina de manias subjetivas dessa personagem principal, que está solteira de novo e que sofre o luto da perda do marido com dois filhos. Mas ainda assim se sente obsediada pelo sentimento eremítico e pela inadequação  (de uma timidez incompatível) ao existir em grupo, gerando assim “papos errados” e “sem tato”. Ao se permitir vivenciar um “novo capítulo”, em que narra para o público todos os pensamentos privados que estão no novo diário, e assim livres e sem medo de serem “cancelados”. Este é um filme de situações, chamado de awkward, que pode ser traduzido por uma coloquial e sensorial estranheza surreal presente no cotidiano automatizado, que por sua vez só aparece quando a observamos com um olhar mais metafísico, o de suspender o tempo para aumentar suas reações intrínsecas ao ser humano enquanto indivíduo social (e julgados pelo coletivo). Mas “Bridget Jones: Louca Pelo Garoto” em muitos momentos cai na própria armadilha que cria: o de criticar esse novo mundo coach e o paradoxo de tornar uma obra de auto-ajuda para mulheres “inteiraças numa certa idade”. Talvez seja nisso que o filme ganhe identificação e naturalidade. Quando se apresenta sendo fiel à própria forma de se comportar. “Você vai sobreviver?”, pergunta-se. 

Mas podemos observar, não se sabe se por um reflexo do mundo contemporâneo, que “Bridget Jones: Louca Pelo Garoto” está mais encenado, mais racional, mais técnico, mais literal. Ainda que este longa-metragem consiga aprofundar questões emocionais (a da saudade do ente querido que transcende a ordem da razão) e que pulule inúmeras sacadas bem-humoradas (“Round 6” e/ou o “Tinder Nárnia” e/ou “a geração que pergunta para beijar” são algumas delas), num público às gargalhadas, que talvez em outros filmes soassem ridículos e sentimentais demais, nós temos a sensação de um certo distanciamento. De que realmente estamos lendo visualmente um livro. Isso não é ruim, é apenas uma percepção, até mesmo a narrativa que neste queira mais a estrutural comercial (e mais apelativa) das comédias românticas mais à moda de Chaplin e Mister Bean, ao invés de “Dalai Lama”, “Harry Styles”. Talvez até pela “harmonização facial” “esticada demais” com mais “botox” da protagonista, vivida pela atriz Renée Zellweger, que a faz rir demais o tempo todo e a transforma em um robô IA, “panicando” em recorrentes decisões e com “medo da realidade”, entre muitos pensamentos intrusivos.

Sim, tudo isso é “relevado” pela potência vernacular de seu roteiro em “euforia inebriante”. Assim, “Bridget Jones: Louca Pelo Garoto” é um filme sobre despedidas, sobre recomeçar, sobre não cometer os mesmos erros (e não aceitar migalhas tóxicas – dizer não e se dar o valor) de um passado não resolvido. É sobre o “está na hora de viver”. “igual e oposta”. E no melhor estilo do cinema britânico que completa os silêncios com música antiga inglesa dos anos oitenta. Talvez falte “Um Lugar Chamado Notting Hill” em “Bridget Jones: Louca Pelo Garoto”. Talvez não. Talvez este seja um reflexo do mundo que vivemos hoje, mais vazio, mais voltado à sensibilidade do sentimental potencializado, com mais “chá de sumiço” das pessoas, sem “máquina do tempo” e que tenta fechar a história do livro com um final feliz, com todas as redenções, todos os sofrimentos resolvidos e com um resumo de todos os momentos mais icônicos dos quatro filmes da saga. Então, em “Bridget Jones: Louca Pelo Garoto”, é preciso “adaptar-se e sobreviver”, sendo essa a mensagem máxima desta crônica em tom de fábula moderna e desconstruída. 

3 Nota do Crítico 5 1

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