Festival Curta Campos do Jordao

Bizarros Peixes das Fossas Abissais

Em busca das profundezas abstratas

Por Fabricio Duque

Festival do Rio 2023

Bizarros Peixes das Fossas Abissais

Antes de mergulhar na obra “Bizarros Peixes das Fossas Abissais”, é preciso entender que o cinema de Marcelo Fabri Marão, em cima de seus traços-desenhos, é de profundeza. De personificar as mais orgânicas, intrínsecas e genuínas idiossincrasias que se encontram no inconsciente mais surreal da existência representativa dos seres sociais, em comportamentos/formas ilógicas-esquisitas e em transmutação às características típicas dos humanos. O filme, em questão aqui, estreia na direção de longas-metragens, após ter realizado os curtas “Até a China”, “Engolervilha”, imprime a metáfora insólita da própria vida, nua, crua, esperançosa e animada. Com suas angústias, limitações, manias, particularidades, frustrações e sobrevivências, todas presentes nas andanças do caminho. Marão quer construir uma obra de jornada estranha. 

Em “Bizarros Peixes das Fossas Abissais”, os seres viventes, tão diferentes  entre si, precisam conviver juntos para realizar uma missão. Eles estão como soldados em propósitos literais de ordens a serem seguidas, ainda que não compreendidas. O filme traz isto: um descolamento suspensivo da realidade. Tudo aqui é uma “viagem” conceitual, que não é para ser entendida plenamente, mas sim servir de encontros identificáveis e subjetivos das abstrações traduzidas na imagem, igual às obras de arte de algum museu e/o de alguma escola de pintura. Junto, o filme também evoca a inferência a “Fantasia”, de Wall Disney, e/ou “Procurando Nemo” (este talvez por querer a lembrança da memória, visto que aqui, ao decorrer de seu desenvolvimento, percebemos que tudo pode ser uma ode ao simbolismo do não esquecer, com inclusive uma parte narrada, explicada e dedicada – em busca dos cacos e da planta que cura). Sim, é também sobre recuperação. 

Esses seres, arraigam-se às ideias de readequações num mundo já impossível de mudar, mas que é preciso aceitar a não simetria, o caos, a bagunça generalizada e a desordem enraizada. Essa esperança, que todos eles ainda têm, de utopia irracional, permite que possam transitar dentro de uma liberdade individual, gerando uma felicidade confortável e fácil de ser alcançada. E quando eles buscam respostas afundando nas profundezas das fossas abissais, descobrem diversidades. E ao enxergar a pluralidade existencial do coletivo, deixam de ser tão individuais. Sim, quase tudo isso esta implícito e sugestionado em “Bizarros Peixes das Fossas Abissais”. Mas é preciso que se atravesse os pragmatismos contemporâneos do olhar. De como ver as coisas, porque cada um dos espectadores, enquanto atores-receptáculos passivos, percebe uma coisa de uma forma. Logo, podemos dizer que este filme é de livre interpretação, dependendo da perspicácia e articulação psicológica de cada um do publico. 

Isso se dá talvez porque sua narrativa seja solta demais, desconexa demais, como esquetes casuais de um simbolismo que requer evolução e rapidez mental para captar tudo. Talvez sim, talvez não. Sim, este crítico adora tentar encontrar metáforas em tudo. Mas confesso que talvez meu nível de expansão cerebral não deve ser tão grande assim, pois em muitos momentos fiquei perdido, à espera de porquês e de conectivos explicativos. Talvez seja que minha cognição ainda viva na definição pronta e pratica do mundo de hoje, que já entrega tudo sem a necessidade de pensar, tampouco argumentar sobre os simbolismos sociais que nos pululam ao redor o tempo todo.

Sim, cinema também é isso. Experimentação e desentendimento. Atire a primeira pedra quem entendeu tudinho da parte final de “2001 – Uma Odisseia no Espaço”. Pois é. Há aqui muitas mensagens sublimares. Uma delas é que ser solitário protege, mas estar junto dar um conforto nas adversidades do existir. Tanto faz se você for uma nuvem (com vergonha de chover na frente dos outros – que é pequena e “no máximo consegue garoar”), uma tartaruga (com TOC – “o que é certo, é certo”), uma mulher com esdrúxulos super poderes (inclusive com uma “bunda gorila” – mas cada ação gera uma reação: suflê de cenoura como prato principal do país; a letra J eliminada do alfabeto), tanto faz se você for um senhor com Alzheimer (que vive nos traços mais básicos do desenho), o mundo sempre será o mesmo, com as mesmas questões universais, no meio de todo esse tom lisérgico e delirante, extremamente carioca. 

“Bizarros Peixes das Fossas Abissais” é também um passeio pelo Rio de Janeiro, pelas características típicas de nossos moradores com seus costumes próprios. Carnaval, Beija-Flor, Nilópolis, cabos dos postes de luz, lojas de 1,99, caldo de cana, Fernando Müller, Confeitaria Colombo. “Bizarros Peixes das Fossas Abissais” é para ser assim: uma “viagem”, um exercício de linguagem da animação e uma mensagem para “Sofia” de que “a vida passa rápido demais”. 

3 Nota do Crítico 5 1

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