Quinto ao Sétimo dia do Festival de Berlim 2017

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Mais Pílulas Críticas do Quinto ao Sétimo Dia

Por Fabricio Duque

Hoje, no sétimo dia do Festival de Berlim de 2017, fez sol aqui em Berlim. O dia ainda está mais quente. De menos oito graus a mais seis. Está gostoso. Ouvi de uma berlinense: “pessoas com sol são mais felizes”. Sim, mas o frio também é bonito. Temático. Turístico para quem mora em um com mais quarenta. O momento fez com que eu lembrasse de uma cena de “Praia do Futuro”, quando a personagem de Wagner Moura ao sair do aquário em que trabalha, fecha os olhos, sente o sol penetrar em seus ossos, esquentar sua pele, sorri, e é reenergizado. Este instante do filme foi exatamente o que experimentei quando o sol apareceu. Ainda na foto, um protesto silencioso (apenas uma placa com dizeres) de um refugiado em um ano que Berlinale está quase majoritariamente política em defesa dos imigrantes por seus representantes cinematográficos, vide Aki Kaurismaki e sua excelente nova obra.


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THE PARTY”, novo filme de Sally Potter (de “Orlando”, “Ginger & Rosa”), que concorre ao Urso de Ouro aqui no Festival de Berlim 2017, comporta-se como um exemplar do excêntrico e ingênuo cineasta “trash” Ed Wood (que na maioria das vezes só realiza um tomada), tudo porque a diretora, que tem urgência passional do resultado final (“rápida e furiosa”) – filmou em apenas duas semanas, e que disse que prepara cada ator, os “cozinhando devagar”, “move rápido seus atores nas filmagens”. O filme é considerado uma “comédia de humor negro” (sobre um jantar, em comemoração a uma Primeira Ministra inglesa, que sai errado), por causa de seus diálogos sociais afiados, cínicos, verdadeiros e constrangedores. Tenta-se, por opção uma “não versão idealizada, mas o caminho é bem diferente. “The Party”, que é baseado na ‘”premissa que política está em todo lugar e não no Parlamento” é o que chamamos de filme pseudo-cult, por tentar construir a espontaneidade, mas o que se consegue é um tom forçado, que busca manipular o espectador com seu humor caricato, teatralmente exagerado, com pinceladas de picardias com os efeitos colaterais de “cheirar cocaína”, dentro de um roteiro frágil, óbvio e paspalhão. “Toda relação lida com troca de poder e todo mundo tem seus segredos”, disse na coletiva de imprensa, e continua: “Todo contraste pode se tornar uma liberação. Eu espero ter criado uma atmosfera explosiva”. Sobre o filmar em estúdio, ela disse: “Muita energia. É mais eficiente e dinâmico, dando a máxima oportunidade para grandes performances emergirem e também se sentir dentro do humor”. Sobre filmar em preto-e-branco: “O monocromático sempre abre espaços na mente que permitem uma emocional coloração fluída. Isso é como se a imaginação pudesse ser pega para caminhar. O mundo da luz e da escuridão é reconhecida e real – uma magia”. Uma camerazinha.


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FÉLICITÉ”, do diretor parisiense Alain Gomis (de “Tey”, “Andaluzia”), que concorre ao urso de ouro do Festival de Berlim 2017, é um retrato de uma mulher independente que trabalha como cantora em um bar. Quando seu filho sofre um acidente, ela precisa fazer de tudo para pagar a cirurgia. A narrativa ambienta-se pelo tom musical catártico da música típica, à moda de um “Buena Vista Social Club”, pela atriz irretocável e fantástica Vero Tshanda Beya que encarna (pela sutileza naturalista) com unhas, dentes, suor e sangue sua protagonista. Aqui é uma crítica social a um povo que não vive mais, apenas sobrevive, esperando o fim chegar. É cru, realista, orgânico, parecido com o cinema filipino de Brillante Mendoza. Entre histórias paralelas, causos, contemplação da imagem, tipos caricatos locais, conflitos materiais de comprar uma geladeira, “Félicité” radiografa o machismo, o descaso do governo pelo hospital público, mães que também são pais, a resignação apática submissa dos coadjuvantes, a comunidade que ajuda, a perda diária da esperança, tudo é sinestesia ao espectador, que embarca em uma fábula cósmica existencialista de uma família que aceita a alienação e o “brinde” da gargalhada de vez em quando. Três camerazinhas.


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WILDE MAUS”, do comediante queridinho austríaco Josef Hader (que também é o protagonista), que faz sua estreia na direção em um longa-metragem, concorre ao Urso de Ouro 2017. O filme é acima de tudo uma crítica a idiotização e aceleração da sociedade, que não permite que gostos distintos possam existir paralelamente como uma forma adicional de opção. Aqui, um crítico de música clássica é despedido por ter seu estilo antiquado irônico “barroco”, e por não expandir conhecimento ao saber sobre a versão da Quinta Sinfonia com o grupo White Stripes. “Wilde Maus” é uma viagem-jornada dele em se adaptar à modernidade. Assim, passa e se identifica por tipos livres pelo caminho, tudo pelos detalhes que o prendem ao analógico (“paradoxo do passado”): o jornal, o trem, o parque de diversões. E todos os personagens interagem como se este fosse um filme coral. Ele vai descobrindo pequenas vinganças que ganham dimensão radical de tortura psicológica-física. É um filme surtado, que despretensiosamente, embarca em um surreal recomeço. Divertidíssimo, metafórico e que é uma afiada luta pela desaceleração do mundo. Quatro camerazinhas.


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HELLE NÄCHTE – BRIGHT NIGHTS” , do diretor alemão Thomas Arslan (de “Gold” e professor de narrativa na Universidade de Berlim), que concorre ao Urso de Ouro do Festival de Berlim 2017, é um filme, que sobre recomeçar, recuperar o tempo perdido da relação de um pai (o ator Georg Friedrich – que também está em “Wilde Maus”) com seu filho. Por um acontecimento trágico na família, todos buscam redenções e acertar contas com o passado. “Helle Nächte – Bright Nights” é uma viagem road-movie à moda de “Out of Nature”, em que é pontuado por uma recorrente sensação de abandonos, silêncios e de defesas. Não há como não definir este filme se não pela expressão “uma direção subjetiva interativa de um carro”, visto que há um plano sequência interminável de uma transição temporal em que nós somos passageiros desta condução. Sim, talvez o diretor tenha esquecido a câmera ligada. Assim, a relação entre os dois fortalece-se pelo respeito em um entender os dramas, a rebeldia silenciosa, culpas, ressentimentos, tempos, manias e socialização do outro. Três camerazinhas.


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Aguarde mais pílulas críticas: “Mr. Long”, do diretor Sabu, fica com três camerazinhas; “THE OTHER SIDE OF HOPE“, mais uma obra-prima do diretor finlandês Aki Kaurismaki, com cinco camerazinhas plus mais; “Beuys”, de Andres Veiel, o documentário sobre o polêmico artista plástico, com três camerazinhas; “Colo”, da portuguesa Teresa Villaverde, com três camerazinhas; “Return to Montauk”, de Volker Schlöndorff, com três camerazinhas.

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