Balanço Geral e Vencedores do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro 2024
Após polêmica na noite de premiação, o filme pernambucano “Salomé” leva o Troféu Candango de Melhor Filme
Por Fabricio Duque (convidado pelo Festival de Brasília do Cinema Brasileiro)
Parece lógico, quase clichê, dizer que um festival de cinema sempre tem muita coisa acontecendo ao mesmo tempo em seu. redor. Sua organização busca a inclusão de atender a todos os públicos, temáticos, geográficos e idiossincráticos. Cada festival também traz uma forma, uma essência. Essas demandas derivativas precisam ser aceitas e não tão questionadas. Sim, não é nem um pouco fácil ser um dos “maestros” e diretores artísticos. É exatamente isso que aconteceu com o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, que, neste ano de 2024, chega a sua quinquagésima sétima edição (e que poderia ter sido a edição 59 se não fosse os impedimentos da ditadura e da pandemia), de 30 de novembro a 07 de dezembro. Sim, mas a consequência mais importante que nós recebemos é poder vivenciar plenamente uma experiência, de cinefilia embutida, especialmente pelas escolhas da curadoria. Isso gera uma expansão de nossas sensações, prolongando possibilidades infinitas, metafísicas e até mesmo fisiológicas, esta porque o meio pode alterar as percepções pelas condições derivativas, como a temperatura climática (gelada) de uma sala de cinema, por exemplo. E/ou pelo clima seco de cerrado (ainda que este ano esteja bem mais úmido por acontecer em dezembro – mas ano que vem o Festival de Brasília retornar para setembro, informação anunciada oficialmente no palco da noite de abertura). Ou as cadeiras extremamente desconfortáveis (digo até que estas podem ser as piores do mundo – saímos com dores na lombar) da Sala 1 do Cine Brasília, que agora, por decreto, renomeou-se para Sala Vladimir Carvalho, com 606 lugares (atualmente). Sim, toda essa experiência é interferida pelo espaço. “Eu acredito no futuro, porque no presente eu já cavei muito”, frase, que está no catálogo oficial do festival, dita por Vladimir Carvalho (1935-2024).
O Festival de Brasília do Cinema Brasileiro 2024 é muito mais do que isso que tentei traduzir, visto que tudo se desenrola pelo acaso, numa liberdade de não engessar os desdobramentos consequentes desta ação gerada. Cada conversa, cada debate, cada “esbarrada” em alguém na mesa de café da manhã nos leva a outras experiências. E sim, o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro é isto: uma sucessão de possibilidades cinéfilas e enriquecedoras. E cada um deve estar aberto para vivenciar tudo plenamente. É, pois é, não é nem um pouco fácil fazer este balanço geral, porque é preciso filtrar e resumir todas essas experiências. Até porque todas têm sua importância. Como lidar e mensurar ordem de mais ou menos do que é relevante? Pois é, meu trabalho aqui é torturante e cruel para essas “reflexões sobre suas mais intensas provocações” (Claudio Abrantes, Secretário de Cultura e Economia Criativa do DF e Presidente do 57o Festival de Brasília); esses “reflexos da mudança do cenário político do país e da própria progressão dos modos de se fazer e pensar cinema ao longo das décadas” (Sara Rocha, Diretora Geral do 57o Festival de Brasília); e esse “olho sempre voltado com muita atenção para o passado que nos trouxe até aqui” (Eduardo Valente, Diretor Artístico do 57o Festival de Brasília).
Além da seleção de filmes brasileiros, o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro 2024 trouxe ainda homenagens mais que especiais, começando pelo Troféu Candango Conjunto da Obra para a atriz Zezé Motta (“Uma mulher, uma beleza que nos aconteceu”, frase de Caetano Veloso em “Tigresa”). Já a Medalha Paulo Emílio Salles Gomes (para “reverenciar as contribuições de nomes ilustres do audiovisual brasileiro na luta pela preservação da memória do nosso cinema”) foi entregue a João Luiz Vieira, professor titular do Departamento de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal Fluminense – UFF. Para as homenagens póstumas, o festival prestou tributo a Mallú Moraes, que foi professora da UNB e que atuou criando figurinos, como atriz e como música para os filmes de seu marido Geraldo Moraes – é mãe do ator Bruno Torres; e também ao cineasta Vladimir Carvalho (que “foi morador do DF desde 1970”), que também recebeu o Prêmio ABCV, este junto com a documentarista Delvair Montagner. O Prêmio Leila Diniz (para “homenagear mulheres cuja prática e trabalhos marcaram a história do cinema brasileiro, na frente ou atrás das câmeras”) foi entregue à produtora Sara Silveira.
O Festival de Brasília do Cinema Brasileiro 2024 abriu com o filme “Criatura da Mente”, de Marcelo Gomes, sobre a obra do neurocientista Sidarta Ribeiro (o “procurador da mente”). Uma obra que “refloresta a mente” em “viagens de autoconhecimento” que “acessam o subconsciente”. A Mostra Competitiva de Longas-Metragens contou com seis filmes, escolhidos pelo time da comissão de seleção, composto por Janaína Oliveira, Leonardo Bomfim, Luís Fernando Moura e Rafaella Rezende; e tendo como Júri oficial: o cineasta Affonso Uchôa; a diretora Carina Bini; o curador Heitor Augusto; a atriz Mariana Nunes; e a cineasta Sandra Kogut. Os concorrentes foram: o mineiro “Suçuarana”, de Clarissa Campolina e Sérgio Borges (este o escolhido como Melhor Filme pelo Vertentes do Cinema); o brasiliense “Pacto da Viola”, de Guilherme Bacalhao; o mineiro “Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá”, de Sueli Maxakali, Isabel Maxakali, Roberto Romero e Luisa Lanna; o amazonense “Enquanto o Céu Não Me Espera”, de Christiane Garcia; o pernambucano “Salomé”, de André Antonio; e o paulistano “A Fúria”, novo filme de Ruy Guerra em parceria co-direção com Luciana Mazzotti.
Já na seleção de curtas da Mostra Competitiva, com o Júri Oficial formado por Lila Foster, Mirella Façanha, Paola Malmann, Simone Zuccolotto e Thiago Costa, tivemos: “Inflamável”, do diretor estreante Rafael Ribeiro Gontijo; “Descamar”, dirigido pelo escritor, professor e curta-metragista Nicolau; “Confluências”, novo documentário da veterana cineasta e professora de cinema Dácia Ibiapina sobre o saudoso mestre quilombola Nêgo Bispo; “Javyju – Bom Dia”, estreia da cacica Kunha Rete, que divide a direção com Carlos Eduardo Magalhães; “Mãe de Ouro”, de Maick Hannder; Yuri Costa trouxe “E Seu Corpo é Belo”; Samuel Lobo e Rodrigo de Janeiro apresentam o documentário “Dois Nilos”; Antonio Fargoni, que idealizou o movimento do Cinema Instantâneo, apresentou “E Assim Aprendi a Voar”; “Kabuki”, única animação da competição, realizada em stop motion pelo premiado quadrinista e curta-metragista Tiago Minamisawa; “Chibo”, dirigido por Gabriela Poester e Henrique Lahude; “Maremoto”, de Cristina Lima e Juliana Bezerra; e “Mar de Dentro”, de Lia Letícia.
A cerimônia de encerramento, que exibiu o documentário “O Menino d’Olho d’Água”, de Lírio Ferreira e Carolina Sá, sobre a “complexidade harmônica”da vida, obra e criação do músico Hermeto Pascoal, fez jus à fama polêmica e histórica do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro por ter se “comparado ao Oscar” quando fez “uma brincadeira” (muito desconfortável, por sinal) ao anunciar o Prêmio de Melhor Filme. Tudo aconteceu quando o festival “mudou o protocolo” pelo apresentador, que chamou ao palco parte da direção do festival a fim de divulgar o grande vencedor da noite, mas um deles resolveu “brincar” com o nome errado do filme, fazendo que a comparação com o episódio oscarizado de “La La Land” fosse inevitável. O filme laureado oficial era para ser “Salomé”, mas foi anunciado “em tom de brincadeira” “Suçuarana“. Nosso site, de forma exclusiva e melhor ângulo, captou todo o momento, e assim o vídeo reel do Instagram, que pode ser conferido antes deste bloco-parágrafo, alcançasse mais de 300 mil visualizações. Sim, é óbvio que o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro não deve ser lembrado e definido só por esse instante, mas que o acontecimento foi marcante, isso foi!
CONFIRA A SEGUIR A LISTA COMPLETA COM TODOS OS PREMIADOS DO FESTIVAL DE BRASÍLIA DO CINEMA BRASILEIRO 2024
LONGAS-METRAGENS
Melhor Longa-metragem pelo Júri Oficial
Salomé (PE), de André Antônio
Melhor Longa-metragem pelo Júri Popular
Salomé (PE), de André Antônio
Melhor Direção
Sueli Maxakali, Isael Maxakali, Roberto Romero e Luisa Lanna por Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá (MG)
Melhor Ator
Wellington Abreu por Pacto da Viola (DF)
Melhor Atriz
Sinara Teles por Suçuarana (MG)
Melhor Ator Coadjuvante
Carlos Francisco por Suçuarana (MG)
Melhor Atriz Coadjuvante
Renata Carvalho por Salomé (PE)
Melhor Roteiro
André Antônio por Salomé (PE)
Melhor Fotografia
Ivo Lopes Araújo por Suçuarana (MG)
Melhor Direção de Arte
Maíra Mesquita por Salomé (PE)
Melhor Trilha Sonora
Mateus Alves e Piero Bianchi por Salomé (PE)
Melhor Edição de Som
Pablo Lamar por Suçuarana (MG)
Melhor Montagem
Luiz Pretti por Suçuarana (MG)
Prêmio Especial do Júri
Ao cineasta Ruy Guerra, diretor de A Fúria (RJ)
CURTAS-METRAGENS
Melhor Curta-metragem pelo Júri Oficial
Mar de Dentro (PE), de Lia Letícia
Melhor Curta-metragem pelo Júri Popular
Javyju – Bom Dia (SP), de Kunha Rete e Carlos Eduardo Magalhães
Melhor Direção
Lia Letícia por Mar de Dentro (PE)
Melhor Ator
João Pedro Oliveira por E Seu Corpo é Belo (RJ)
Melhor Atriz
Carlandréia Ribeiro por Mãe do Ouro (MG)
Melhor Roteiro
Nicolau por Descamar (DF)
Melhor Fotografia
Fernanda de Sena por Mãe do Ouro (MG)
Melhor Direção de Arte
Caroline Meirelles por E Seu Corpo é Belo (RJ)
Melhor Montagem
Cristina Amaral por Confluências (DF)
Melhor Trilha Sonora
Ruben Feffer e Gustavo Kurlat por Kabuki (SC)
Melhor Edição de Som
Kiko Ferraz e Ricardo Costa por E Seu Corpo é Belo (RJ)
Menção Honrosa do Júri
Ao filme Dois Nilos (RJ), de Samuel Lobo e Rodrigo de Janeiro
MOSTRA BRASÍLIA
Melhor Longa-metragem pelo Júri Oficial
Tesouro Natterer, de Renato Barbieri
Melhor Longa-metragem pelo Júri Popular
A Câmara, de Cristiane Bernardes e Tiago de Aragão
Melhor Curta-metragem pelo Júri Oficial
Via Sacra, de João Campos
Melhor Curta-metragem pelo Júri Popular
Manequim, de Danilo Borges e Diego Borges
Melhor Direção
Adriano Guimarães pelo filme Nada
Melhor Ator
Eduardo Gabriel Ydiriuá pelo filme Manual do Heroi
Melhor Atriz
Gleide Firmino pelo filme Via Sacra
Melhor Roteiro
Andrea Fenzl, Victor Leonardi, Renato Barbieri, Neto Borges e Rodrigo Borges pelo filme Tesouro Natterer
Melhor Fotografia
Emília Silberstein pelo filme Xarpi
Melhor Montagem
Silvino Mendonça pelo filme A Sua Imagem na minha Caixa de Correio
Melhor Direção de Arte
Maíra Carvalho, Marcus Takatsuka e Nadine Diel pelo filme Nada
Melhor Edição de Som
Guile Martins e Olívia Hernández pelo filme Nada
Melhor Trilha Sonora
Márcio Vermelho e Pedro Zopelar pelo filme Tesouro Natterer
Menção Honrosa do Júri
A Juliana Drummond pela excepcional performance nas apresentações da Mostra Brasília – Troféu Câmara Legislativa da 57ª edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro
MOSTRA CALEIDOSCÓPIO
Melhor Filme
Filhas da Noite (PE), de Henrique Arruda e Sylara Silvério
Prêmio Especial do Júri
Topo (SP), de Eugenio Puppo
MELHOR FILME DE TEMÁTICA AFIRMATIVA
Candango concedido pelo Conselho Distrital de Promoção da Igualdade Racial – ao filme exibido pelo festival que melhor evidencia temáticas afirmativas.
Confluências (DF), de Dácia Ibiapina
PRÊMIO ZÓZIMO BULBUL
Prêmio concedido por júri indicado pelo Centro Afrocarioca de Cinema e a Associação dos Profissionais do Audiovisual Negro (APAN). Excepcionalmente em 2024, o júri decidiu premiar dois curtas ao invés de um curta e um longa-metragem.
Melhor Curta-metragem
Mar de Dentro (PE), de Lia Letícia
Prêmio Especial do júri
Dois Nilos (RJ), de Samuel Lobo e Rodrigo de Janeiro
PRÊMIO MARCO ANTÔNIO GUIMARÃES
Prêmio concedido ao filme exibido que melhor trabalha memória e arquivo do audiovisual brasileiro, com júri indicado pelo Centro de Pesquisadores do Cinema Brasileiro – CPCB.
Barreto, Fotógrafo das Lentes Nuas (RJ), de Miguel Freire
PRÊMIO ABRACCINE
Prêmio concedido por júri indicado pela Associação Brasileira dos Críticos de Cinema.
Melhor Longa-metragem
Salomé (PE), de André Antônio
Melhor Curta-metragem
Kabuki (SC), de Tiago Minamisawa
PRÊMIO CANAL BRASIL DE CURTAS
Prêmio no valor de R$ 15 mil concedido pelo Canal Brasil ao Melhor Curta-metragem segundo júri montado pelo próprio canal.
Kabuki (SC), de Tiago Minamisawa
TROFÉU SARUÊ
Troféu concedido pelo jornal Correio Braziliense ao melhor “momento” do Festival de Brasília.
A Fúria (RJ), de Ruy Guerra e Luciana Mazzotti
PRÊMIO CANAL LIKE
Prêmio no valor de R$ 50 mil em apoio de mídia e publicidade em veiculação no Canal Like, concedido ao filme vencedor de Melhor Longa-metragem pelo Júri Oficial.
Salomé (PE), de André Antônio
PRÊMIO VERTENTES DO CINEMA
Suçuarana (MG), de Clarissa Campolina e Sérgio Borges