Diretor: Giuseppe Tornatore
Elenco: Monica Bellucci, Raoul Bova, Michele Placido, Ángela Molina, Laura Chiatti, Enrico Lo Verso, Luigi Lo Cascio, Gisella Marengo.
Produção: Tarak Ben Ammar, Marina Berlusconi
Roteiro: Giuseppe Tornatore
Fotografia: Enrico Lucidi
Trilha Sonora: Ennio Morricone
Duração: 150 min.
Ano: 2009
País: Itália/ França
Gênero: Drama
Cor: Colorido
Distribuidora: Paris Filmes
Estúdio: Medusa Film
COTAÇÃO: EXCELENTE
A opinião
O diretor Giuseppe Tornatore busca em seus filmes explorar a simplicidade da poesia realista. A ingenuidade recorre-se à infância. O embrutecimento vem pelo tempo, pelo sofrimento. A cada tristeza, um pouco da pureza morre, até não haver esperança e expectativas. Todo mundo sofre, uns menos, uns mais. Seja por se deixar manipular, seja pela violência nata da defesa, seja por repetir ações que geram culpa. A realidade mitiga sonhos, extenua a resignação e cega os quereres. É o chamado amadurecimento. Viver a trajetória traçada sem a fantasia de quando se era pequeno.
Apresenta-se como uma autobiografia do diretor, evocando amores, sonhos e desilusões de uma comunidade inteira na província de Palermo, a partir de 1930 até a década de 1980. Durante o período fascista, Cicco é um humilde pastor que, no entanto, encontra tempo para exercer a sua paixão: livros, poemas épicos, e grandes e populares romances. Quando as pessoas passavam fome durante a Segunda Guerra Mundial, seu filho, Peppino, testemunhou essas injustiças e descobriu uma paixão pela política. Após a guerra, o destino faz com que encontre a mulher de sua vida. Uma relação desaprovada por tudo e todos, por Peppino ter se tornado comunista. O título Baarìa é uma giria siciliana para Bagheria, cidade onde Giuseppe Tornatore nasceu.
Uma criança vê um pião como um brinquedo. Quando se vê a feitura do mesmo, tão prático e rápido, um pouco do brilho é perdido. Os adultos são responsáveis pela perda disso. Com sua agressividade, eles aproveitam-se destes seres pequenos, os estimulando a crescer antes do tempo. Mas a imaginação infantil dura, como voar após correr muito.
O longa, um épico ficcional da vida do diretor, realiza a transição com corte seco, sem explicações. Respeita a inteligência do espectador quando delega a responsabilidade de montar a história. As histórias acontecem: como a professora super rígida. Não há uma sequência, não é linear, percebido ao final, se é sonho ou não.
A sensibilidade é mais um personagem do filme. Mas não há sentimentalismo. A música de Ennio Morricone abranda as barbáries da trama. Os enquadramentos de camera e a fotografia nostálgica, que aumenta quando inclui uma volta ao passado dentro de um passado, complementam a qualidade e emocionam sem o clichê barato. Há competência dos elementos.
O cinema não poderia deixar de ser retratado. Os filmes mudos, com suas legendas lidas por alguém que sentava no meio, para aqueles que não sabiam ler. Os mais fortes, os que possuíam um poder maior dominavam os fracos. Poderia ser os impedindo de comer ou por torturas, criando assim a obediência e o medo.
Os italianos possuem o exagero. Os diálogos são irônicos e passionais, utilizam o deboche puro e sincero. Dizem o que querem sem limitações. Dão tapas para demostrar descontentamento. Ação considerada defesa, para que se pudesse sobreviver em tempos de ditadura. Todos eram considerados subversivos. “E estude de vez em quando”, o pão diz quando o filho é mandado para trabalhar em outro local. E complementa “Vá ganhar o seu pão”.
A vida dos pobres pela sobrevivência. “Morta sim, difamada não”, sobre a preocupação do que os outros iriam falar se soubessem que não tinham o que comer. O orgulho de uma época, que brigava pela aparência por razões sociais e alienadas. Mesmo assim, com todo o sofrimento, a esperança das crianças não se destrói. As circunstancias do momento, como o fascismo da guerra, geram decisões radicais para não morrer. O medo e a barbárie são presentes, constantes, mas há luta.
Quando os americanos desembarcam, a “festa dos pobres” começa e instaura-se a revolução. Alguém leva uma porta de madeira como lembrança final da guerra que havia acabado, depois de não ter conseguido uma parte dos rombos aos cofres da cidade. O cinema muda seu nome. O nosso personagem inscreve-se no Partido comunista. Inicia-se o socialismo. Homens dançam com mulheres agora. “Socialismo, o que isso? – Você sabe dançar? – Não – Então não pode entender”, diálogo que exemplifica o conhecimento de uma comunidade e critica do estado com a dança. “Toda desculpa é boa para roubar”, diz-se sobre religião. “A política é boa”, repete um moribundo antes de morrer.
O diretor humaniza os costumes do local. Ele não julga, retrata apenas e aceita as inerências. As características de cada um, dos italianos para ser mais exato, são respeitadas com dignidade. Não há máscaras, nem maniqueísmo. Uma época que se lutava por valores, pela morte e do não esquecimento de nosso próximo. Um botão de luto usado por todos pelo acontecimento de um massacre.
Há a poesia da imagem realista. A realidade da pobreza. O amor de um casal que transcende barreiras da chuva dentro de uma casa em péssimo estado. Um guarda-chuva abriga o beijo apaixonado. Há supertições diversas para impedir os amarguras da vida, como o sangue de um animal para a anemia de uma grávida.
O cinema é representado em outro viés. Um pai o apresenta ao filho. No início, o garoto fica com medo do escuro. Depois acostumasse e começa a colecionar fotogramas de películas de inúmeros filmes.
O protagonista conserva a esperança até o final. “Boas notícias devem ser comemoradas”, diz sobre a vitória e sobre a gravidez de outro filho. Os filhos comportam-se mediante as crenças dos pais. Os últimos são responsáveis pela educação e futuro de suas crias. O final questiona sonhos e chances. Vale muito a pena ser visto. É um retrato de uma época, de uma vida por um diretor sensível e competente, que consegue demonstrar o desespero pela poesia, pela pureza e pela esperança. Recomendo. Indicado ao Globo de Ouro de Melhor Filme em Língua Estrangeira, Indicado ao Leão de Ouro e Vencedor do Prêmio Pasinetti do Festival de Veneza.
Giuseppe Tornatore (Bagheria, Sicília, 27 de maio de 1956) é um cineasta italiano. Entre as suas obras mais aclamadas encontram-se “Malèna” (2000), com Monica Bellucci como protagonista, e “Cinema Paradiso” (1989), com Philippe Noiret num dos principais papéis. É também diretor dos filmes “O homem das estrelas” e “A lenda do pianista do mar”. Ao longo de sua carreira, Tornatore firmou uma ótima parceria com o grande compositor Ennio Morricone.
Filmografia
1986 – O Professor do Crime (Il Camorrista)
1988 – Cinema Paradiso (Nuovo cinema Paradiso)
1990 – Estamos Todos Bem (Stanno tutti bene)
1991 – Sempre aos Domingos (La domenica specialmente)
1994 – Uma Simples Formalidade (Una pura formalità)
1995 – O Homem das Estrelas (L’uomo delle Stelle)
1998 – A Lenda do Pianista do Mar (La leggenda del pianista sull’oceano)
2000 – Malena (Malèna)
2006 – La sconosciuta
2009 – Baarìa