As Constituintes de 88
Vinte e seis andorinhas em ação
Por Fabricio Duque
É Tudo Verdade 2019
A essência de todo e qualquer documentário consiste em desenvolver um tema real, conceituado em ideias que surgem do conhecimento de mundo e de influência do meio em que seu realizador vive. A palavra-gênero já nos mostra que é um documento que reitera a verdade sobre acontecimentos da História.
O novo curta-metragem do diretor carioca Gregory Baltz (de “Ouro para o bem do Brasil”) reverbera questões atuais de luta sociopolítica pela análise do passado, observando com crítica passiva ao buscar o questionamento primitivo de regras, deveres e direitos. “As Constituintes de 88” não impõe o discurso, apenas permite que a história de mulheres ativistas pela mudança da Constituição conte, embase a própria polêmica e se perpetue por si só.
Não é um filme fácil, pelo contrário. Não pela referência a um mundo atual que parece inverter seus caminhos percorridos, tampouco pela nostálgica e poética estética narrativa (de usar a técnica do cinema como veículo), que se liberta da forma, do espaço e da necessidade à padronização. Não. É complexo por sua ambiência de naturalizar e humanizar o tema proposto, como em uma viagem ao tempo, que recebemos o passado como uma lembrança fabular de tão distante, ainda que com intervalos tão curtos. Sim, quase todo documentário faz assim. Mas aqui há um que de diferente. De vírgula deslocada. Algo que nossos olhos e nossas percepções humanas ainda não conseguem captar tão rapidamente.
Talvez por mergulhar na liberdade da simplicidade ou talvez por adentrar em uma seara que ao mesmo tempo deveria ser unida, mas que no fundo é a experiência mais solitária de todas (a das mulheres em Assembleia composta majoritariamente por homens), provando que uma andorinha faz verão sim, mas que o processo é lento, demorado e excessivamente perturbador de vinte e seis mulheres que levantaram a bandeira e poder “de maneira suprapartidária, para garantir igualdade de gênero nas discussões sobre direitos sociais e políticos”. Exibido no Festival É Tudo Verdade e no Festival Cine Ceará 2019, o curta-metragem é sobre a missão nossa de cada dia, de reordenar. Neste caso, reelaborar.
Abrindo um parêntese pessoal, e assim me incluo para que eu possa resumir a experiência de ter assistido o filme. Conversando com o diretor, eu disse que não conseguiria escrever a crítica de forma tão imediata, porque “As Constituintes de 88” fez com que fosse levado a um lugar que até agora não sei explicar. Parece que fui conduzido ao mundo invertido do seriado Netflix “Stranger Things” e ou a algum universo paralelo que fiquei e não consegui voltar. Por isso a demora em traçar linhas analíticas, então, neste caso, é um elogio a esta obra que gera a unicidade da sinestesia. Fecha parênteses.