A Vida Sem Você
Discussões à beira da cama
Por Vitor Velloso
Cinema Virtual
Na linha dos franceses, as discussões na cama e os diálogos em torno das impossibilidades do relacionamento, marcam “A Vida Sem Você”, de David Färdmar. O filme sueco bebe diretamente da fonte desse naturalismo mais prosaico das relações e dos casais que se amam mas não podem permanecer juntos. O novo lançamento do Cinema Virtual é como um longa que já vimos diversas vezes e ainda se esforça para provocar algumas reações nos espectadores. Menos diletante que a indústria pós-Truffaut francesa e mais físico que parte da importação europeia, o projeto até é capaz de acertar algumas memórias adormecidas no espectador que já passou por situações parecidas, contudo, sempre aposta demais nesse objeto catártico de uma narrativa que não sabe para onde caminhar.
Por diversos momentos do filme, retorna-se ao mesmo ponto de antes, a saudade e as impossibilidades se chocando no romance. Está claro que um dos personagens é um controlador compulsivo, mas não é esse o foco da obra. O barato aqui é reforçar essa construção como parte de uma vida que precisa amadurecer e aprender a dizer adeus. Assim, “A Vida Sem Você” investe quase duas horas de projeção para manter um ciclo dramático repetitivo que não sai do lugar, criando uma manutenção dessa arrastada história que sempre termina com impulsos de um dos dois lados. A própria ideia da redenção vai perdendo o sentido quando essa relação não existe, apenas o desejo de um dos lados. E falar de redenção pode parecer abstrato, mas os minutos finais fazem questão de reforçar essa ideia de uma moral reconstruída em suas individualidades. Não surpreende, afinal, com a distribuição garantida na plataforma guardiã das redenções e superações, seria de se estranhar que mais um filme não fosse para esse caminho.
Com um trabalho de câmera que parece estar filmando uma websérie, o ritmo é arrastado, desinteressante e muitas vezes caótico. Em uma cena especificamente, a quantidade de cortes de plano-contraplano e ação-consequência beira a labirintite, as trocas constantes dos ângulos soam como exercício estético infantil. Aliando essa dinâmica aos diálogos expositivos e um tanto desastrosos, o espectador constantemente está desajeitado em uma experiência onde os dois protagonistas relembram o tempo inteiro: isto é um filme. Parte culpa de um roteiro desarticulado e tolo, parte das interpretações, a verdade é que assistir “A Vida Sem Você” é estar preso em um labirinto onde os cenários, as situações, os diálogos e os dramas se repetem. Uma espécie de tratamento conjunto de uma série de curtas sobre a mesma história que vão se amontoando e formam um dos ansiolíticos mais poderosos do ano. Esse cansaço repentino só é interrompido por alguma reação negativa, ou seja, algum momento vexaminoso dos atores ou do texto que nunca parece finalizado.
Não existe aquilo que é “bem feito”, mas fica claro que o problema aqui não era o orçamento, mas sim uma construção preguiçosa que persegue alguns dispositivos práticos para gerar/mostrar a tristeza de seus personagens e provocar algum sentimento mais genuíno em seu público. Poucas coisas são tão tediosas quanto ver o esforço da produção em arrancar algum tipo de catarse na banalidade industrial da mais-valia ideológica europeia, que construiu as bases dos relacionamentos de beira de cama. Esse filme aqui, aparentemente, é antitabagista, ou pelo menos não cedeu ao suposto “charme” de fumar e discutir a vida enrolado no lençol.
Quem esperava algum tipo de genuinidade de “A Vida Sem Você” vai se frustrar com um projeto que não está finalizado, é mal construído, mal atuado, com um texto vergonhoso e uma boa intenção, que é passar por cima da normatividade dessa narrativa, ampliando essa representação para o casal do filme. Mas os esforços dessa não-programática, se encerram em uma forma que segue à risca todas as burocracias que fomentaram o subgênero. A canção que dá título ao projeto, apenas mostra como essas amarras são visíveis.