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A Mulher do Meu Marido

A Mulher do Meu MaridoA Mulher do meu marido

De Rir de Tanto Chorar

Por Jorge Cruz

 

 

Gabi Lopes, influenciadora digital brasileira, recebeu algumas boas lições em 2019. Chegando ao final da décima primeira temporada do reality showO Aprendiz”, suas escolhas acertadas se limitaram aos procedimentos do programa e a seu perfil no Instagram, seguido por mais de dois milhões de usuários. Não só ela participou do maior fracasso da televisão brasileira no ano (menos de um ponto de média no Ibope em pleno domingo), quanto de um projeto que propõe muito pouco e alcança quase nada chamado “A Mulher do Meu Marido”.

É possível enquadrar esse longa-metragem em uma modalidade de comédia que a própria Globo Filmes, uma das maiores entusiastas do carioca way of life veio abandonando com o tempo. Quando Paulo Gustavo e Leandro Hassum ainda não existiam para garantir o roteiro fácil nas bilheterias, Jorge Fernando ficou encarregado de abrir os cinemas no ano de 2004 com “Sexo, Amor e Traição”, uma produção que contou com uma música gostosa de Luciana Mello e um povo brasileiro disposto a prestigiar o cinema nacional a ponto de atingir dois milhões de espectadores em sua passagem pelas telonas. Antes disso, em 1998, “Como Ser Solteiro”, mesmo com a concorrência desleal do fenômeno “Titanic”, passou dos 150 mil espectadores.

Talvez haja motivos para que produções nesse estilo não sejam lançadas nos últimos tempos e os realizadores de “A Mulher do Meu Marido” não tenham se dado conta disso. Nada justifica em meio ao transbordamento de talentos no cinema nacional, que vive um período de experimentações estéticas e de linguagem de qualidade, uma trama que apresenta o Rio de Janeiro idealizado, do banquinho e violão, higienizado e hermeticamente lacrado às margens do Pão de Açúcar. As expectativas de sucesso comercial não devem ter levado em conta a escalação de Luana Piovani como protagonista ou se valor de Maria Clara Gueiros como alívio cômico. Portanto, reforçar a narrativa tradicional e replicar uma ambientação tão cínica e carregada de desfaçatez quanto o trabalho desenvolvido por Piovani, só pode ter sido algo consciente.

Não que o elenco não seja de notável talento. A falta de expectativa comercial reside no fato de que não há apelo em nada que compõe “A Mulher do Meu Marido”. O máximo de nostalgia alcançada com o roteiro de Marcelo Santiago, também diretor, é colocar Toni Garrido em um luau na praia cantando Drão, de Gilberto Gil. Estamos diante de um produto ultrapassado, que já nasce velho. Nem o hilário Paulo Tiefenthaler no papel de Pedro consegue evocar um sorriso, já que interpreta no piloto automático como boa parte do elenco. Quem dera se o maior tropeço do texto fosse escantear Maria Clara Gueiros, deixando sua personagem quase meia hora desaparecida no miolo do filme. “A Mulher do Meu Marido” consegue tirar a raspa do tacho de prazer e expectativa que o público poderia ter com um prólogo que inviabiliza a diversão nos dois atos seguintes.

É uma ambientação juvenil se comparada com o que a produção nacional fazia há mais de duas décadas. Quando Sandra Werneck dirigiu “Pequeno Dicionário Amoroso” o ano era 1997 e já era possível desenvolver um romance fora do convencional tendo uma cidade grande de agente definidor. Woody Allen faz isso há cinquenta anos, por exemplo. Sem contar o anacronismo nas situações que o roteiro quer ser engraçado. Soa agressiva uma obra que dá vida a um ginecologista que se envolve com uma paciente no consultório em um período onde denúncias contra esse tipo de conduta abusiva acontece é algo que vale se mencionar. Em um certo momento, a personagem de Piovani menciona Nelson Rodrigues com o mesmo entendimento de glamourização da classe média hipócrita que ela mesma comprou das obras do cronista. Quase como uma celebração, como se o roteiro tivesse sido escrito na década de 1960, colocado em uma garrafa e jogado ao mar, quando foi encontrado por Marcelo Santiago.

A história começa com Joana (Luana Piovani) encontrando Pilar (Aylin Prandi), amante de seu marido, para pedir que ela não abandone o cara, que volte para ele. O longa-metragem volta um ano no tempo e acredita que tornará mais interessante acompanhar as aventuras que levaram àquela situação. Só que a trama não avança, não se desenrola. É fato consumado que Pedro se envolverá com a amante Pilar e a esposa Joana terá consciência disso. Isso faz com que “A Mulher do Meu Marido”, já servida com o recheio da previsibilidade, ultrapasse os limites do enfadonho.

1 Nota do Crítico 5 1

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