Curta Paranagua 2024

A Grande Dama do Cinema

Crepúsculo… pera lá

Por Vitor Velloso

Existe um certo estigma por trás da comédia, algo que já foi amplamente discutido por pessoas com mais relevância que eu, exemplo, Belmondo. É uma questão pouco justa com o gênero, pois algumas mentes arcaicas acreditam na superioridade eterna do drama, porém, o mínimo de revisão histórica nos mostra que trata-se apenas de um preconceito tolo que a alta burguesia/aristocracia fundamentaram buscando envernizar um (pseudo) tratamento intelectual da arte, sem perceber que a postura apenas traz a ignorância quanto ao que de fato importa no processo experiencial.

Assim, se falarmos de uma comédia latino-americana, é possível que uma expressiva parcela irá duvidar da qualidade do filme, por uma questão de colonização cultural, norte-americana e européia. Ainda que os países latinos provaram ao mundo a qualidade de nosso cinema, incluindo a comédia (mesmo que a maior quantidade não entre na equação, assim como nos EUA e Europa), a maior rejeição vem do próprio país onde o filme é realizado.

Dirigido por Juan José Campanella, “A Grande Dama do Cinema”, busca uma compreensão da ficção através dela mesma, na ideia de absorver elementos do próprio cinema a partir de uma estrutura metalinguística. Na prática essa possível complexidade é bastante diluída, pois a abordagem que Campanella adota aqui, vai flertar com elementos primordiais da comédia, utilizando o drama exatamente a fim de flexibilizar mais a noção narrativa que é construída através da problemática inicial. Assim, a própria sinopse já revela parte das ambições do cineasta, uma estrela decadente que despontou como atriz há décadas, Mara Ordaz (Graciela Borges), vive com um roteirista, Martin (Marcos Mundstock), e um diretor de cinema Norberto (Oscar Martinez), além de seu marido, Pedro (Luis Brandoni) , um ator que não vingou. Nesta casa a harmonia é uma palavra inexistente, o constante conflito rege cada segundo da colossal residência, antes luxuosa, agora mantém a silhueta do passado com a presença da decadência no presente. Mas com a chegada de dois pilantras, Bárbara (Clara Lago) e Francisco (Nicolás Francella), que se aproximam dos artistas aposentados com fins de tomar a casa e vendê-la por preços avassaladores, faz a dramatização ali existente apenas no campo do diálogo, ganhar contornos trágicos.

O trunfo do filme é exatamente a fixação precisa em um lugar onde comédia e um excesso dramático possam coexistir, a hipérbole aqui serve para manter sob controle toda a premissa rocambolesca que se desenvolve, não à toa, diversos absurdos narrativos são acrescentados a partir de uma necessidade de fugir das multi-camadas possíveis que a estrutura criaria. Assim, clichês tomam conta da trama, auto-conscientes, e flexibilizam a relação do público com as referências que vão tomando forma.

O longa é uma reimaginação de um filme de 76, de mesmo nome, logo, grande parte das questões são comuns em ambos.

O elenco possui uma química impressionante, tendo como âncora a constantemente deslumbrante Graciela Borges, que guia os personagens com uma organicidade própria dela, seu modelo decadente, menos ingênuo que soa e mais iludida que acreditamos, conduz o espectador à um olhar lúdico acerca desta história, tentando nos convencer de acreditar em concretude na possibilidade da ficção, nos lembrando que estamos assistindo a um projeto fílmico.

Acaba que algumas dessas decisões que possibilitam o senso comum na trama, vão criando pequenas barrigas no longa, deixando-o em curtos momentos monótono, sempre projetando algo a ser ultrapassado, estas repetições tornando-se demasiadamente constantes, através de uma rígida decupagem, criam a necessidade de existir uma virada a cada instante, ou perde-se o espectador, mas a frequência mantém a previsibilidade e assim apenas no, assumido, terceiro ato que temos o desfecho de todas as enrolações possíveis no fim da história. Mas até lá, é possível pegar-se distraído e refletindo sobre elementos que não adicionam tanta personalidade à obra, como a trilha sonora e a direção de arte, que não mantém um grau de mediocridade mas não conquista seu espaço, fazendo apenas o necessário para que o fluxo seja mantido.

Não é propriamente um grande filme, muito menos um “Crepúsculo dos Deuses”, mas sem dúvida entretém e atinge objetivos curiosos, ainda que opte por alguns caminhos fáceis.

3 Nota do Crítico 5 1

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