Curta Paranagua 2024

A Caminho da Lua

O pop lunar

Por Vitor Velloso

Netflix

A Caminho da Lua

“A Caminho da Lua” de Glen Keane é uma animação que pode encantar pelas luzes e pelas cores, mas não consegue esconder seus problemas gerais, entre o genérico e o industrial, a obra possui altos e baixos que tornam a experiência frágil.

O projeto inicia sua jornada com algumas delicadezas, buscando caminhar com a felicidade, mas flertar com a tristeza vindoura. Antecipa algumas memórias para nos apegarmos ao longo da projeção, contudo, o inglês que norteia a linguagem de uma obra em torno da cultura chinesa, já ativa um alerta que se concretiza posteriormente. É uma obra norte-americana que se utiliza dos mitos chineses, e só. Uma tentativa de conquistar mercado no maior concorrente econômico do país imperialista.

O longa se utiliza de toda uma estrutura própria do industrialismo na animação, a aventura é ditada por uma jornada que segue à risca os passos de um(a) herói (na) retirado diretamente das bases teóricas do arcaico Joseph Campbell e tira qualquer brilhantismo presente uma possível reformulação à base de uma cultura chinesa. A Chang ‘e é uma cantora pop retirada de um misto norte-americano e K-pop, é uma tentativa de assimilação que termina mostrando toda a verdadeira intencionalidade de “A Caminho da Lua” que apenas pavimenta novas possibilidades de capital.

Porém, se para algum entretenimento serve o filme de Glen Keane, as cores e os movimentos tratam de seduzir o olhar do espectador para as pirotecnias tecnológicas e formais aqui presentes. A qualidade da animação busca um destaque em meio as suas fragilidades e pode acabar conquistando parte do público. Sem dúvida, o excesso é um dos diferenciais da obra. Em determinados momentos são explosões e um misto de cores que é possível perder parte das ações, já que o importante de fato está diretamente no pictórico. E essa lição, é dada pelos norte-americanos, que conduzem a narrativa atrás de uma catarse que faça fisgar e conquistar o coração para além de toda a parafernália colorida.

E é onde mora outro problema de “A Caminho da Lua”, sua parte musical. As músicas da obra não ajudam a compor uma narrativa, pelo contrário estão a serviço de um escapismo da própria direção, que pode ser funcional em parte dos momentos, mas cansa rapidamente por criar uma sequência grande de canções que saturam as cenas. Sem contar que o inglês na China incomoda um bocado.

É um movimento que o mercado vem fazendo ao longo dos anos, seja com “Doutor Estranho” (2016), “Mulan” (2020) ou agora na obra de conciliação emotiva da guerra cambial. Os EUA se esforçam para colocar amarras na segunda maior economia do planeta, que segue priorizando obras nacionais aos blockbusters da “terra da liberdade”. Vale lembrar que antes da pandemia, entre os 10 filmes no topo das bilheterias chinesas, apenas um era norte-americano. A tentativa de infiltração, possui resistência e não anda tão bem das pernas como gostariam. O fracasso de “Mulan” é apenas um dos exemplos possíveis.

Agora a gigante do streaming, tenta uma nova investida, apelando para a animação e uma distribuição generalizada para a “projeção” doméstica. “A Caminho da Lua” é um produto que parece tentar algum caminho menos desonesto e encontrar algum sentimento no meio de tudo isso, mas após os primeiros minutos abandona por completo a ideia e só articula uma assimilação da cultura chinesa para tentar angariar alguns espectadores. Infelizmente, todo o jogo formal de cores e movimentos que saturam a imagem, estão à serviço de um interesse do capital que não encanta, nem entretém como poderia.

Para quem procura uma diversão em família, com os símbolos “fofos” que conquistaram a internet e mantém o cidadão preso ao celular, como coelhinhos etc. Pode investir algum tempo aqui e poderá arrancar um sorriso da criançada, mas não deve passar muito disso. Nem o desenho de uma possível moral que conquiste os pais para ensinar “os valores” de uma suposta tradição (com representação ditada pelo EUA) consegue se sobressair em algum momento. O mais perto disso é o irmão caçula Chin, que recebe menos atenção que poderia. Esse é o sentimento que “A Caminho da Lua” transmite, um projeto que não consegue findar nenhuma de suas iniciativas e fica tropeçando em seus próprios interesses comerciais e políticos.

2 Nota do Crítico 5 1

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