Curta Paranagua 2024

13 Sentimentos

A artificialidade opaca das relações

Por Paula Hong

13 Sentimentos

Se faltava às comédias românticas do cinema brasileiro fincar na artificialidade discursiva do cotidiano, “13 Sentimentos”, de Daniel Ribeiro, contribui mais com uma mistura de sentimentos vacilantes e de envergamento interno a respeito de uma fabricação estética e narrativa ofuscante das relações. Com este filme, a volta de Ribeiro como diretor de longas após o tempo de uma década desde “Hoje Eu Quero Voltar Sozinho” (2014) é coerente com um dos medos de João (Artur Volpi) estar consciente de que a primeira transa após o término de um longo relacionamento ser ruim.

Portanto, é com certo constrangimento que se assiste ao filme que marca seu retorno, uma vez que seus filmes anteriores atestaram uma presença fílmica voltada para obras que exploram tão bela e habilmente as nuances sentimentais da adolescência. Mas talvez seja preciso admitir que o constrangimento deriva da capacidade de Ribeiro colocar o filme como um espelho que reflete as relações dessa geração de jovens adultos como João, fazendo com que a identificação ocorra não somente pelo modo de vida levada em grandes cidades como São Paulo, mas também pelas condições cada vez mais complicadas em explorar e estabelecer vínculos que correspondam com os modos de vida e de relações. É possível que a direção tenha sido bem sucedida em colocar em tela a dificuldade de esmiuçar nuances sentimentais de uma atuação que possivelmente se nutra da autêntica dificuldade de uma geração que lide melhor com as decepções da vida, de modo que as varre para debaixo do tapete e maquie os desconfortos com um sorriso tímido recorrente.

Assim segue “13 Sentimentos”: João, um jovem adulto com uma carreira de cineasta estagnada, volta de uma viagem que marca o término de uma década de relacionamento. O que sobra é um cubo mágico, deixado dentro da mala pelo ex-namorado; uma metáfora sinalizar que o conserto de um lado da vida consiste no embaralho do outro, e assim deve-se continuar tentando até que todas as faces da vida estejam harmonicamente na mesma cor. Entre seu vício em café, a decolagem da carreira em uma área incomum, encontros com os amigos (que só sabem cumprir mais o papel de auxiliá-lo a essa nova vida) e a insistência em fazer seu filme acontecer, João faz de seu término inspiração para um roteiro que encontra bloqueios de escrita nas tentativas de encontrar seu próximo amor. Nessa jornada, que se inicia no começo do filme, demarcando o curto período de tempo após o término de seu relacionamento anterior, João esbarra com Vitor (Michel Joelsas) em um aplicativo de relacionamento e de conversa.  

O diretor entende essas dinâmicas do mundo digital e as incorpora ao filme com o recurso da divisão em tela, capaz de exprimir conversas simultâneas e direcionado o personagem a escolher entre as opções de envolvimento casual que lhe são apresentadas nas conversas de aplicativos. Somos cúmplices, e quase tentados a dar palpites igualmente simultâneos às suas escolhas em “13 Sentimentos”. É palpável a artificialidade dos incômodos reforçados pelos flertes virtuais e para além desses aplicativos de relacionamento quando é encenado um retrato de sorrisos brancos e largos, corpos sarados e bronzeados, sempre sedentos por sexo, iluminados por uma escolha fotográfica que planifica e conjuga “aventuras” que nunca se configuram, de fato, como enrascadas que se espera da vida de solterice, como João mesmo coloca. 

Fato é que o personagem não se arrisca; não há tensões suficientes para colocá-lo em situações tão desconcertantes, tendo em vista que suas soluções são tão concomitantes aos sentimentos que, atrelados à atuação iluminada com lógica de estúdio televisivo, é difícil de absorvê-los. Os incômodos são serenos e leves demais para levar a sério uma proposta da retratação de assuntos atuais aos quais não são oferecidos recursos narrativos e estéticos que dêem conta de abordá-los. A esterilidade visual é ofuscada por um encantamento das cores quentes e coloridas que floreiam demais acontecimentos do cotidiano engrandecidos por barreiras — tanto das relações quanto dos trabalhos — solucionadas num piscar de olhos ofensivos até para o tempo fílmico.

De todo modo, a plástica tranquilidade inerente à progressão dos acontecimentos (dentro do cotidiano, das dificuldades financeiras, do engate a um novo romance, dos encontros com amigos) firma o tom morno do humor e das tensões que perpassam por toda a obra. No fim, é de se esperar que tudo dê certo, o que acalenta, mas ainda assim faz de “13 Sentimentos” um filme que não alcança a sua potencialidade, e que no entanto cumpre a proposta trazida dentro do gênero comédia-romântica.

2 Nota do Crítico 5 1

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