Um Tio Quase Perfeito 2
Quase totalmente imperfeito
Por Victor Faverin
Boletos a pagar. Muitos boletos. Essa é a única justificativa possível para os integrantes adultos de “Um tio quase perfeito 2” (2021), longa-metragem dirigido por Pedro Antônio Paes (que também conduziu o primeiro), toparem a empreitada. Impressiona como o argumento “filme para toda a família” é usado nos dias de hoje – principalmente no cinema nacional, Leandro Hassum que o diga – como desculpa para motivar pais e mães a levarem seus filhos ao cinema em tardes recheadas de pipoca, sorvete e gritaria na tentativa de compensar ausências ou simplesmente em busca de diversão sem compromisso com a prole sem, com isso, oferecer em troca algo que compense minimamente o esforço.
No entanto, se você considera que os seus entes (queridos ou não) merecem entretenimento de qualidade, fique longe dessa obra. Agora, se os dias de quarentena foram sufocantes e você quer arrumar qualquer motivo para sair de casa e ficar longe do home-office e do sofá da sala, acredite, sentirá falta até mesmo das reuniões de Zoom com aquele colega puxa-saco do chefe que nunca desliga o áudio e deixa vazar o som do latido do cachorro e da panela de pressão caso opte por desperdiçar 100 minutos de seu tempo assistindo Marcus Majella e companhia em tela.
É até curioso observar como o filme foi capaz de extirpar todo o carisma e a boa vontade que o público construiu com o protagonista no primeiro filme. No de agora, o tio Tony mantém o traquejo com as crianças, ou “talento”, como ele mesmo diz, mas se torna cansativo, invejoso e demasiadamente infantil, incapaz de fazer rir. O diretor parece querer mostrar que todas as tramoias engendradas pelo personagem – que denotam, no mínimo, desvio de caráter – podem ser brevemente esquecidas pelas crianças, irmã e mãe. Aliás, a utilização dos sobrinhos, declaradamente como claque, soa ainda mais artificial do que em sitcoms ou em programas de auditório dos anos 1990 e corrobora para o sentimento de vergonha alheia que a audiência será capaz de sentir em grande parte do filme. Nada, entretanto, soa tão vexatório quanto as discussões entre o tio Tony e o novo tio Beto (Danton Mello). Enquanto o primeiro quer manter o monopólio da atenção dos sobrinhos com diversão quase irrestrita, o segundo busca incluir responsabilidades e um cardápio orgânico na alimentação dos pequenos. A dualidade e os confrontos não fogem de obviedades (as abraçam de peito aberto, na verdade), chegando ao ápice de presenciarmos guerras de dedos e de repetições de palavras entre ambos. Nem as crianças fazem tamanho papelão em cena (parece que Lucas Neto está formando uma legião, aliás).
Fatores que poderiam deixar “Um tio quase perfeito 2” minimamente interessante – como descortinar a insinuada dubiedade de Beto ou o mau humor de seu filho – são abandonados sem mais nem menos durante o segundo e terceiro atos. Cabe apenas ao público aguardar o desenrolar de um roteiro sem qualquer inspiração. Todavia, é preciso reconhecer a vontade a qual Majella se entrega ao papel, tentando evocar um timming cômico que carece de material mais elaborado para florescer. Nesse caso, é válido dizer que alguns esquetes do canal “Porta dos Fundos” aproveitam muito melhor o potencial do ator, o que já não acontece tanto no programa televisivo “Vai que cola”, uma evidência de que maior tempo em cena nem sempre favorece comediantes.
Outro aspecto que vale o registro positivo é a naturalidade mostrada pelos atores mirins (com uma exceção) durante os diálogos. Isso não é um grande mérito também, já que a história exige carga emocional com a profundidade de um pires de cada um deles, mas o longa poderia ter sido ainda pior se as crianças agissem mecanicamente. Voltando ao que incomoda em “Um tio quase perfeito 2”, a incursão de efeitos gráficos para simular conversas em aplicativos entre os personagens é absolutamente desnecessária. A impressão que dá é que mostrar pessoas falando com a boca grudada no celular não é o suficiente para mostrar que se trata de uma troca de mensagens por meio digital.
Para finalizar, a última cena do filme presta um grande desserviço à causa vegana, tão injustificadamente perseguida. É feio de assistir e soma-se ao grande carrossel de cenas dispensáveis do longa. Já que estamos falando de comida, “Um tio quase perfeito 2” precisaria melhorar muito para ser considerada uma comédia pastelão. Se ainda estiver interessado em ver o filme, um conselho: aguarde a próxima quarentena, junte a turminha da pesada na sala de casa e o confira na Sessão da Tarde.