Reprise Mostra Campos do Jordao

Toquinho Maravilhoso

Dualidades perigosas

Por Vitor Velloso

Durante o Festival de Cinema de Gramado 2024

Toquinho Maravilhoso

Com um título que sugere ao espectador qual o caráter da obra, o documentário dirigido por Alejandro Berger Parrado intitulado “Toquinho Maravilhoso” procura traçar a carreira de Antonio Pecci, o Toquinho, sua vida pessoal, seus feitos musicais, sua contribuição para a música brasileira e suas influências artísticas, em um tom de louvor constante. Esse lugar de uma obra que se debruça sobre um artista para comemorá-lo não é incomum, mas tem algumas particularidades que devem ser levadas em consideração, especialmente quando há determinadas polêmicas envolvidas que são ignoradas completamente pela produção, sem o espectador saber o motivo. Há duas possibilidades nisso: 1) a celebração do artista em primeiro lugar ou 2) Ou a obra concorda com seus posicionamentos. Em ambos os casos, o silêncio/ausência demonstra complacência. 

De toda forma, a retirada de qualquer gesto político, tanto de Toquinho, quanto de toda a cultura brasileira, é notável em “Toquinho Maravilhoso”, já que uma menção superficial acerca do contexto de 64 é absolutamente insuficiente para dar conta de qualquer análise crítica, tanto de sua obra, quanto de qualquer inserção do artista na realidade brasileira. Assim, toda a estrutura do filme, funcionando quase como um institucional, enfraquece a experiência de compreender sua carreira e como ele se tornou uma referência para sua geração. Por mais que os trechos onde explica o início de seu aprendizado com o violão e algumas questões de sua infância, sejam realmente interessantes, eles continuam carregados de uma exaltação quase desmedida à Toquinho, sem nem mesmo fazer esforço para traçar alguns aspectos concretos dessa trajetória ou procurar contextualizar melhor socialmente os aspectos abordados nos depoimentos do protagonista. E este é um problema recorrente na obra, sua centralização é tamanha que torna-se incapaz de se distanciar para ampliar sua própria abordagem. Não por acaso, as fontes das entrevistas são sempre de pessoas muito próximas ao núcleo familiar do violonista, reduzindo a abrangência até para os inúmeros elogios que o público tem de lidar ao longo da projeção. 

É possível que o leitor acredite que alguns apontamentos são excessivos ou pessoais, mas quem teve contato com o documentário pôde notar como seu caráter monotemático torna-se monótono e cansativo. Por exemplo, a montagem tem alguma dificuldade em conectar determinados depoimentos, deixando lacunas temáticas que prejudicam o ritmo e a continuidade. Não por acaso, o mesmo acontece com algumas imagens de contextualização de períodos mais iniciais da carreira de Toquinho, que parecem mal estruturadas no corpo final do projeto, transformando “Toquinho Maravilhoso” em uma experiência que exaustivamente parece se manter em um pedestal cíclico. 

Não por acaso, mesmo com curta duração, o filme parece se arrastar de forma exagerada por uma construção que termina do mesmo que inicia, uma ode descontextualizada, com pouca personalidade para articular uma proposição de discussão sobre os próprios feitos e méritos do protagonista, pois se aproxima tanto de um perfil idealizado pela produção, que parece não conseguir materializar uma representação que seja justa, nem para o protagonista, nem para o público, pois distorce seu registro para uma adequação funcional ao projeto.

“Toquinho Maravilhoso” pretende realizar uma homenagem, mas sua missão é tão unidimensional que torna-se cega em sua estrutura, mantendo o projeto tão distante de seu público, quanto de realizar um trabalho que nos permita compreender Toquinho em sua integridade, pois há uma seleção de assuntos e temáticas a serem abordadas, com uma motivação que pode ser questionável sob algumas perspectivas. A exibição no Festival de Gramado vai garantir uma excelente repercussão para a obra, mas o resultado final é tão irregular que não consegue destaque com outras obras cinematográficas que se debruçaram sob alguns artistas brasileiros, filmes contemporâneos ou não. 

2 Nota do Crítico 5 1

Pix Vertentes do Cinema

  • Eu fico me perguntando porquê “Deus deu a voz para nós seres humanos”Aí veio na minha mente(primeiramente foi para o adora-lo, segundo para se comunicar, terceiro foi para nos descobrir os nossos talentos).

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