The Edge of Daybreak
A (des)evolução estética
Por Fabricio Duque
Durante o Festival de Rotterdam 2021
Walter Carvalho, diretor-fotógrafo, disse certa vez que a imagem-fotografia nunca deve roubar o protagonismo do filme. Mas esse “erro” é mais comum do que se imagina. Novos cineastas potencializam tanto a estética conceitual que desvirtuam a própria maestria. Em “The Edge of Daybreak”, integrante da competição oficial do Festival de Rotterdam 2021, a forma-embalagem, traduzida pelo monocromático, com uma sutil saturação ao sépia, recebe mais importante que a história em si. A narrativa-metafísica, de quebra-cabeças, busca montar peça a peça pela atmosfera-perspectiva psicológica.
Na descrição curricular de suas atividades, seu realizador estreante Taiki Sakpisit (do curta-metragem “Mental Traveller”), “aplica habilidades cinematográficas para criar evocações assombrosas de memória por meio da repetição e manipulação imperceptível de imagens. Os filmes produzem modos intensificados e incômodos, que costumam estar relacionados ao tumultuoso clima sócio-político da Tailândia”. O tailandês de Bangkok, referencia explicitamente Apichatpong Weerasethakul (talvez pela mesma localidade-natal), especialmente “Tio Boonmee, Que Pode Recordar Suas Vidas Passadas” e “Cemitério do Esplendor”.
“The Edge of Daybreak” é a quebra do limite linear, das projeções sensoriais e da sinestesia do olhar. O espectador leva o filme todo para conectar metáforas visuais. Aqui, ancestralidade une-se com a histórica política social, para assim construir um épico de evolução caótica e sem esperança. Nós embarcamos em uma epifania de uma realidade desconstruída em um teatro imagético de estimular a análise pela poesia do que nossos olhos recebem, entre sombras, luzes e variações surrealistas-psicodélicas. Sim, é um filme para ser assistido no cinema e não na tela de um computador (pois é, não há só flores em festivais online de cinema). Enfim. “A trilha sonora sombria (de Yasuhiro Morinaga), a ação cinematográfica mínima e o ritmo lento evocam um estado hipnótico”, disse o diretor.
O longa-metragem, em quase duas horas, gera a recorrente pergunta: até quando o fotografia sustentará sozinha o filme? E não demora. A primeira quebra acontece aos dezesseis minutos. E assim, novas irregularidades aparecem recorrentes, perdendo-se com a grande quantidade de peças. Percebemos que volta e meia é a estética a grande protagonista. “The Edge of Daybreak” (algo literal como “À Beira do Amanhecer”) desenvolve-se ora com edição mais rápida, ora mais lento. Fades temporais tornam-se constantes. Há assim uma repetição do que antes era inovação, caindo na própria armadilha-truque de ter que aceitar o gatilho comum para sair do “resta um”. Dito isso, nós podemos entender que é um filme-coral de cenas com o artifício da experimentação imagética, como por exemplo a do ônibus. De esquetes estendidas, que vez ou outra se encontram, apegando-se a outra referência: o tempo atmosférico do cineasta Lav Diaz e seu “A Evolução de uma Família Filipina”.
Ao utilizar o recurso da narrativa mental-psicológica (e sons etéreos-cósmicos-industriais de suspense-terror), consegue-se embasar a entrada e saída de personagens, impedindo que pontas soltas fiquem à mostra. Mas até isso deve ser usado com moderação. O que realmente acontece é que o diretor quer ultrapassar o fim da experiência com o extra-sensorial. Insere-se o elemento visceral, a digressão, a falta de foco, desequilibrando (arrastando) o ritmo cadenciado com ingenuidade e com o improviso da técnica (que evoca até a quebra da quarta parede).