Sibyl
Quando só a crença não adianta!
Por Fabricio Duque
Durante o Festival de Cannes 2019
O último filme da mostra competitiva a Palma de Ouro do Festival de Cannes 2019, “Sibyl”, dirigido e roteirizado pela realizadora francesa Justine Triet, seu terceiro filme, desenvolve-se por uma comédia-metalinguagem de situações da vida privada, em que os acasos redefinem o caminho seguido, recalculando a rota. De um lado, temos a psicanalista Sibyl (Virginie Efira, que já trabalhou com a diretora em seu filme anterior “Na Cama com Verônica”) que quer interromper os atendimentos para se dedicar à escrita. Do outro, uma visita de uma paciente, Margot (Adèle Exarchopoulos), uma atriz em crise. É o material perfeito para o romance. A terapeuta pensa e adentra em um jogo de manipulação.
Outra característica empregada é a verborragia típica dos franceses, que dão voltas e voltas tudo para dizer que “o frango é bom” de um restaurante em que “a comida anda em uma esteira”. “Sibyl” é um filme de momentos. A maior parte em elipses. De “prioridades subjetivas”. Mas também se apresenta como um teatro. Em núcleos e conversas, muito parecido com a estrutura de uma novela. É explícito perceber a encenação forçada na sessão de terapia. E/ou o “desespero” de soar natural “o bloqueio da escrita”. E/ou os encontros dos Alcoólicos Anónimos. E simplesmente a narrativa muda o foco. A câmera passeia com leveza e podemos perceber que a intensidade de antes era para traduzir a quase insanidade. Quase um sussurro. Sem trilha-sonora e nenhum som-ruído acompanhante. Lembranças de sua mente? Cantar no bar “Fever”? Ou uma projeção fértil da própria história que está escrevendo? É verdade ou criação?
“Sibyl” investe no propósito do caos. Fragmentado, não linear e em digressões. De “largar” diálogos como artifício da confusão, criando assim cenas espirituosas, por exemplo com a irmã. Ou “Você não precisa aprender a manipular sua mãe, a tia ensina” gera boas risadas, principalmente por causa da “tia maluquinha”, que canta livremente. Pois é, já foi dito que é uma obra de instantes casuais, que mergulha em dramas existenciais e diretoras (a do filme ficção) em surtos. Sim, há um humor perspicaz, mas ainda assim o longa-metragem sofre de fragilidades inerentes. Especialmente pelas referências ao filme “Dirty Dancing” (1987), de Emile Ardolino.
O filme traça o perfil de Sibyl. Já foi “cantora, assistente, agora diretora”, que precisa lidar com a problemática cena de sexo. Quase uma versão heterossexual de “Azul é a Cor Mais Quente”, de Abdellatif Kechiche, que contou com Adèle no elenco. Nós também podemos interpretar que a surreal experiência que a terapeuta se aventura é na verdade um confronto-violação ao futuro livre. Com ou sem “Sometimes I Feel Like a Motherless Child”, embalada por Julie London. “Uma maneira definitiva de ajudar a viver, de criar ficção, até de escrever um livro ou fazer um filme”, a diretora explica o tom caminho na coletiva de imprensa no Festival de Cannes.
“Eu gosto de fazer isso, mexer, manter as coisas frescas. Fazer com que os atores mudem de direção mesmo para a mesma cena. Se você mudar de direção, não usará aquela nota que está tentando. Por exemplo, com cenas de amor, mesmo que sejam muito coreografadas, é bom fazer mais cômica uma vez e mais sério na próxima. Gosto quando, por exemplo, há uma certa gargalhada do nada, gosto das surpresas. Eu empurro os atores emocionalmente com muita força no começo de uma série de tomadas, e eles adoram isso, para ficarem realmente emocionais e sentirem que fizeram sua melhor cena. Mas, na verdade, o próximo, quando o contém um pouco mais, mas ainda tem um traço de emoção em seu rosto, geralmente é a melhor opção. Eu preciso realmente desgastar meus atores. Por exemplo, Virginie no final, quando está chorando no cinema, estava realmente nesse estado. Mesmo quando dissemos ‘cortar’, ela continuou chorando. Adoro colocá-los nesse estado, mas é claro apenas quando a cena exige”, finaliza Justine Triet.