Curta Paranagua 2024

Puan

Inspiração limitada

Por Vitor Velloso

Festival do Rio 2023

Puan

É curioso notar como as coisas que davam certo em “Vermelho Sol” (2018), de Benjamín Naishtat, se perdem em um misto de bobeira com desordem em “Puan”, de María Alché e Benjamín Naishtat. Aliás, o projeto procura flertar com a comédia de uma forma pouco eficaz na maior parte do tempo, justamente por possuir um desequilíbrio em sua forma, sem saber para onde caminhar, nem exatamente aonde quer chegar. 

O longa consegue saltar de um sutil humor, onde apresenta um possível conflito de egos entre dois professores, um telefone tocando durante as palavras que são ditas em uma homenagem a um falecido e o desconforto da cena, para uma tentativa de fazer comédia com um personagem, Marcelo Peña (Marcelo Subiotto) que senta na fralda suja de um bebê. Esse salto nas diferentes formas de procurar o humor demonstra esse descompasso em “Puan”, que parece abandonar todas suas metas dentro de um bloco narrativo para encontrar alternativas fáceis na comédia, seja com um humor físico ou mesmo com atitudes tão bizarras de personagens que geram algum desconforto imediato. Desta forma, o longa funciona em diferentes rotações e acaba escolhendo o caminho mais preguiçoso: tornar essa disputa acadêmica uma espécie de analogia dos acontecimentos no filme, delinear uma moral e embarcar em uma dualidade que os diretores acreditam ser o mais interessante, mas não é. O resultado disso é a clássica saída de tentar enveredar o projeto para uma discussão política vazia e completamente artificial, que surge na reta final a partir do fechamento da Universidade por falta de verba. O problema é que não existe ao longo da película nenhum tom de discussão nesse sentido, nem uma mera citação das questões materiais que abalam as universidades latinas, ou seja, a questão é jogada ao espectador, com a finalidade de demonstrar as diferentes perspectivas dos professores durante uma manifestação popular e colocar o protagonista em uma situação privilegiada para a última cena, onde irá lecionar uma aula sobre “pensamento latino-americano”. 

É tudo tão desorganizado nesse sentido, que nem mesmo o personagem Rafael, interpretado por Leonardo Sbaraglia, consegue ter alguma relevância no desenvolvimento dramático da obra. Ele é um contraponto direto da vida pacata e prosaica de Marcelo, uma espécie de egocêntrico que larga sua vida na Europa da noite para o dia e apenas serve como dispositivo. Não por acaso, suas motivações sempre são turvas e dúbias para o público, pois não temos uma aproximação mínima necessária para compreensão do personagem em si. “Puan” vai se perdendo nas tentativas de aproximar uma forma de tradição no humor argentino, muito bem representado, em suas particularidades, por “Rojo” (2018), mas não sabe como criar uma identidade própria na medida em que se aproxima de características mais populares do cinema.

Desta forma, o filme perde em todas as frentes que procura traçar algum desenvolvimento no lado dramático e no humor, enfrentando um grave problema para manter o espectador interessado na obra até o fim da projeção. Porém, isso não quer dizer que “Puan” é arrastado ou lento, é apenas desinteressante e soa completamente perdido. 

Por outro lado, existem alguns méritos aqui, em especial na primeira metade, onde introduz uma fórmula de humor mais sutil, que beira o absurdo pelas situações protagonizadas por Rafael e demonstra as dificuldades de Marcelo com sua autoestima acadêmica diante do caos que se instala a partir da morte de um professor. Esse retrato inicial consegue fisgar o público e mantém alguma esperança nessa verve do “homem comum” se tornar uma “dramédia” interessante, especialmente pelas relações com a filosofia, matéria lecionada por ambos personagens. Mas o filme não consegue avançar a partir daí e todo o esboço visto no longa anterior de Naishtat, vira um ideal a ser seguido, ainda que a estrutura narrativa seja completamente diferente e possua um limite gravemente definido pela insistente tentativa de transformar um suposto cinismo em recorte humorístico. Não existe máscara ou boa vontade que salve “Puan” de sua desordem, nem mesmo uma aproximação política desordenada.

2 Nota do Crítico 5 1

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