Curta Paranagua 2024

O Rolo Perdido

O patrimônio e a História

Por Vitor Velloso

Durante o Festival É Tudo Verdade 2020

O Rolo Perdido

O cinema é patrimônio, é memória e identidade cultural de um país. “O Rolo Perdido” de Ariel Nasr é um documentário que busca compreender como essa relação histórica influencia uma geração inteira a construir um modernismo cinematográfico e influenciar o Afeganistão, colocar medo nos Talibãs e ser referência até hoje, mesmo que sem o devido reconhecimento. E aqui, há muitos fatores para um certo apagamento histórico dessas películas. Uns na ordem da destruição, outros de questões culturais, como a exclusão criada pelo Ocidente. 

O filme de Nasr consegue provocar a vontade de assistir algumas das obras que cita. E este é um dos principais méritos do longa, que acaba referenciando de maneira constante, absorvendo em sua linguagem, os filmes que está debatendo. Esse tom híbrido, não recorre ao caráter formulaico de um “filme-processo” e aquela burocracia majoritariamente burguesa. Aqui o diretor está realmente interessado em remontar o imaginário por trás de um movimento histórico no cinema afegão. De maneira clara, suas intenções perpassam pela ideia de conceber uma sociedade, uma coletividade particular ao cinema, o que se configura em uma utopia privada do cineasta. Algo que latente durante a exibição de “O Rolo Proibido” não incomoda, pois há maturidade para se estruturar que a utopia vem de uma necessidade histórica de reacender a chama do movimento dialético desse cinema. 

Algumas ideias políticas bastante plurais, dizendo o mínimo, vão se somando na montagem, mas o documentário acaba patinando em seccionar momentos mais oportunos para introduzi-los, o que acaba gerando um vácuo nessa construção que vinha em progresso. Consequentemente, o ritmo torna-se lento e o espectador anseia por momentos onde o cinema retoma a vida sem alguns atravessamentos vindos da ilha de edição, pois aqui mora o problema, o projeto parece estar apegado demais à essas intervenções que não consegue organizá-los de maneira mais dialética, como aparenta estar querendo. E aqui entra uma frente direta do materialismo, que o longa parece flertar constantemente, mas não chega às vias de fato por uma falta de diretriz mais apurada em como articular a concepção histórica com as relações políticas e econômicas que geraram essa orientação estética que vemos na tela. Não que o documentário recusa o debate em torno das movimentações dessa imagem e da produção no cinema, porém o faz como quem receia tocar em temas excessivamente voláteis.

Ora, não é esse o verdadeiro cenário que vive o Afeganistão? Em todos os cenários possíveis, mesmo que dentro da utopia estética de absoluta leveza criada aqui, por uma nostalgia, há uma influência exterior às movimentações artísticas aço presentes. Ainda que alguns discursos sejam de ordem burguesa e um crédito absoluto nos sentidos criativos da arte, exemplo da idealização do sentimento como ordem cinematográfica, existe ali uma digressão no modo de produção que é, de longe, a compreensão mais instigante presente na obra. E “O Rolo Proibido” consegue traduzir isso de maneira parcial com diversas imagens de arquivo, trechos de filmes, entrevistas etc. É uma multiplicidade nos âmbitos da linguagem que o diretor se utiliza de cada um pouco. 

Diferentemente de outros projetos que costumam caminhar na mesma direção, o longa não se detém à exposição, pois está empenhado de fato em singularizar o momento histórico e destrinchar o mesmo com a progressão dos anos, em seus desdobramentos estéticos, mas novamente, sem uma análise crítica que seja multifacetada na estética e na política, pois a desorganização da montagem acaba criando silhuetas e becos sem saída. Não à toa, constantemente o assunto é atravessado, envergado ou até desviado de maneira brusca. A explicação está diretamente ligada à questão de como essa estrutura se forma para que o fluxo dessas ideias não seja quebrado com essa intensidade e frequência. 

“O Rolo Perdido” é um filme que consegue adicionar algumas muitas obras à lista de “Assistir Depois” e acrescenta mais um cinema regional que instiga à pesquisa. Mas por excessos e vazios díspares acaba criando alguns vácuos na própria estrutura, que são sempre atravessados de maneira contrária à sua imagem. Acaba sendo uma boa pedida para nos lembrar do cinema como patrimônio e memórias, além de dar luz à uma cinematografia que não possui o renome que deveria.

3 Nota do Crítico 5 1

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