O Juízo
Reparação História, o Filme
Por Felipe Novoa
Slow Burn é o termo em inglês que define uma história que evolui lentamente até o seu clímax. ”O Juízo“ é um suspense nacional quase aceitável que foca demais no ‘lentamente’ e esquece do final.
O plot é bem simples mas infelizmente fraco, o protagonista Augusto (Felipe Camargo) é um pai e marido alcoólatra que foge com sua família da cidade até uma fazenda nas cercanias de Paraty pra tentar se afastar da sociedade num detox sabático. Chegando lá ele é perseguido pelo espírito vingativo de um escravo (Criolo) e sua filha que foram traídos por um antepassado de Augusto. Ele começa a enlouquecer por conta disso e seu filho vai junto apesar de ambos manterem uma aparência relativamente calma frente a seus problemas absurdos.
Infelizmente o que poderia ser um filme envolvente acaba te deixando decepcionado pelo pacing cansado e falta total de ritmo e substância. A história não avança muito e você nota isso nas várias vezes que o silêncio reina sobre a narrativa tentando criar alguma tensão mas que só parece encher linguiça.
O clima de suspense e tensão é mantido pela escolha de uma propriedade colonial na serra fluminense e pelo tempo permanentemente fechado e chuvoso na área. A casa grande onde o protagonista e família se instalam está aos pedaços, isso aliado a falta de energia elétrica e ao afastamento quase total cria uma sensação claustrofóbica que mantém o espectador atento mas não o suficiente para gerar uma tensão real. Andrucha Waddington não soube dirigir o filme de forma consistente e isso fica bem claro.
Com todos esses pontos negativos (sem contar a atuação recitada sem emoção do protagonista que eu não tenho vontade de entrar em detalhes) é bom balancear falando do pouco que funciona em “O Juízo”. A direção de fotografia teve um momento muito bom. Por meio de uma façanha chamada talento o cinematógrafo Azul Serra cria a atmosfera exata de tensão que o roteiro não sabe fazer. Os takes são bem montados, o cenário bem composto e a iluminação é fantástica. O conjunto de seu trabalho junto com a montagem de Sérgio Mekler e a direção de arte de Rafael Targat são o que salvam o filme de um destino catastrófico.
O elenco é um outro ponto positivo. Fernanda Montengro está, como de costume, excelente mesmo com sua pequena participação junto ao Lima Duarte. Eles são irmãos, ela uma espírita e ele um espírito, que de certo modo guiam e ajudam Augusto na sua loucura. Carol Castro, como Tereza, esposa de Augusto parecia estar realmente vivendo o seu papel; o pânico e cansaço estavam marcando a sua pele e você podia ver uma mulher destruída que está tentando manter a compostura mesmo com tantas preocupações e problemas na sua vida. Suas reações foram bem medidas e bem executadas.
A estreia na telona de Joaquim Torres Waddington como Marinho (filho de Augusto e Tereza) foi, infelizmente marcada por um filme fraco, mas isso não chega a desmerecer seu trabalho mas mostra nepotismo da parte da direção, afinal ele é neto de Fernanda Montenegro (ela que já esteve em mais do que alguns projetos com o diretor Andrucha Waddington) e também filho de Fernanda Torres, que foi a redatora de “O Juízo”. O rapaz parece estar agindo como algum adolescente genérico agiria na situação dele, emocionalmente alheio aos problemas dos a sua volta, fechado na sua bolha, concentrado na sua existência; isso é mais reação do que atuação.
O último pilar que sustenta o filme, surpreendentemente, é a trilha sonora, visto que ela sozinha carrega a maior parte de toda a carga emocional do filme mesmo não soando original. Pode parecer um exemplo de como fazer uma trilha sonora para suspense: violinos cortados e ríspidos, sons inquietos e inconstantes e no geral um ar bem comum e previsível de “você corre perigo”. Talvez tenha sido essa previsibilidade que conseguiu caracterizar “O Juízo” como um suspense de verdade pois em termos de enredo e roteiro faltou o suspense.
Fechando tudo faltou ritmo e uma história mais forte pra preencher as falhas que o filme apresenta. Não sou capaz de recomendar “O Juízo” porque eu estaria mentindo se dissesse que essa obra vale o seu tempo.
Ps: ninguém em sã consciência mesmo depois de ser drogada e de fugir de um estupro veria o marido se matar e acharia uma boa ideia o enterrar junto com o filho. Isso foi a parte mais insanamente absurda do filme e foi de uma falta tão colossal de conexão com a realidade que quebrou totalmente o fluxo do fim do filme gerando uma decepção grande com a produção que permitiu esse despautério.