O Clube das Mulheres de Negócios
Obsessões
Por Vitor Velloso
Durante a Mostra CineBH 2024
O novo filme da Anna Muylaert é uma surpresa na cinematografia da cineasta, com características distintas e a proposta de uma discussão política e social, como boa parte de sua obra, mas a partir de um dispositivo inusitado. “O Clube das Mulheres de Negócios” funciona como uma sátira na maior parte de seu tempo, hora com deboche, hora provocativa.
Pouco didático sobre suas representações, o longa se articula de forma tão explícita que é capaz de gerar cenas cômicas em determinados momentos, o problema é que parte de suas propostas parecem se desgastar por determinadas prioridades do roteiro. Por exemplo, a grande quantidade de personagens retira a possibilidade de um desenvolvimento sólido de suas características, para além de uma relação esquemática na narrativa. Ainda que essa seja uma intenção proposital do filme, para desvelar as hipocrisias e milícias das personagens a partir de sua relação com dinheiro, poder e moral, essa superficialidade de cada personagem tem um peso no desenvolvimento. Pois, além de ser impossível ter qualquer empatia, por serem pessoas questionáveis, o espectador não tem nenhum desenvolvimento dramático de cada uma das personagens, tornando a experiência do projeto desgastante.
Nesse sentido, “O Clube das Mulheres de Negócios” pode ser encarado como faces distintas de uma sociedade brasileira, em que os arquétipos tomam forma a partir dessa relação de desenvolvimento quase unidimensional das personagens. Não por acaso, alguns desses dispositivos são frágeis a ponto de perderem sua justificativa. Um exemplo disso é o segmento das três mulheres que andam armadas e falam absurdos, seja um desejo pelo passado, quanto as pautas da campanha política. Elas possuem um propósito pouco claro no filme, servindo como um artifício de ligação imediata aos traços integralistas ali presentes, assim como uma espécie de síntese do governo recente que tivemos no Brasil. Porém, essa superfície é apenas sublinhada ao longo da obra, pois a funcionalidade da sequência está na abertura do caos absoluto que toma conta nos últimos minutos da projeção, transformando quase todas suas passagens em apenas um dispositivo simplificador do conflito fatal.
Desta forma, o agente catalisador soa quase ingênuo dentro de uma contextualização política e social tão complexa quanto a proposta pela diretora. Não por acaso o desenvolvimento dessa proposta de discussão, flerta constantemente com uma superficialidade que apenas estanca as possibilidades de ampliação do debate. Assim, é possível entender que essa relação entre o universo ali projetado com a troca de uma representação social entre mulheres e homens, funciona bem até o momento em que o contraste entre pesos dramáticos distintos passam a atrapalhar essa construção. Um exemplo é que em uma cena pesada para determinado personagem, uma parte do público deu risada. Está claro que a inversão gera um certo constrangimento no aspecto das sensações geradas, por conta da quebra de como a sociedade se estruturou, mas essa reação do público demonstra como essa articulação tem um funcionamento questionável.
Toda a projeção de discussão em torno da obsessão do dinheiro e de diferentes formas de poder, pode ser compreendida nas sequências das onças e das violências que acontecem com diversos personagens, ainda que só funcione a partir de uma série de dispositivos frágeis e se encerre de forma apressada para tentar gerar alguma catarse nos espectadores. Contudo, só a trilha sonora não é o suficiente para desenvolver um sentimento que permanece inerte durante quase toda a projeção.
“O Clube das Mulheres de Negócios” é uma obra ambiciosa, que pretende discutir uma larga quantidade de temáticas e assuntos, mas não consegue desenvolver as tensões necessárias para provocar os sentimentos que mira ao longo da projeção. Assim, a ingenuidade que estava em um lugar cômico, passa a incomodar pela estruturação artificial e superficial de um filme que não parece encontrar um eixo de funcionalidade.