Um Amante Francês
O blasé europeu contínuo
Por Vitor Velloso
“Um Amante Francês” é um filme previsível. Em programação somente na Zona Sul carioca, o típico filme de comédia francês, que ganha algum público durante sua breve passagem no circuito, ganha alguma notoriedade através da língua europeia que conquistou o eixo da classe média pelo mundo.
Dirigido por Olivier Baroux, com uma carreira repleta de projetos parecidos, o longa demonstra que a tentativa de inversão de antigos valores sociais não necessariamente se caracteriza em subversão. Não apenas o fato de se aplicar um humor tóxico e pouco pragmático para com a temática, já que a divergência entre o assunto e a infantilidade canhestra das piadas tornam o exercício de mirar a tela do cinema mais doloroso que previsível. O longo tempo de projeção, que parece se estender com a progressão da narrativa, é uma questão frágil já que com seu ar descolado de projetos canastrões, “Um Amante Francês” prova ser mais que isso, com diversas adjetivações possíveis, “bobo” não se aplica progressivamente aqui, o tom deve se elevar.
Os fios narrativos são definidos através de estereótipos pré-concebidos de projetos industriais de sucesso, não à toa, trata-se de um remake de “Como se tornar um conquistador” (2017). Seus arcos dramáticos são resolvidos em três linhas, a típica mudança através de uma queda nos padrões de vida que resultará na readequação no modo de viver daquele protagonista. Todas as padronagens possíveis em um roteiro que busca conciliar a comédia com pequenas aberturas ao drama, estão aqui. Ainda que não leve a sério suas relações interpessoais, as tentativas fálicas de promover essa interação direta com a família é incomoda pelo tratamento que leva, um mero artifício textual para alavancar e facilitar essa breve jornada do personagem. A relação direta de Alex (Kad Merad) e Hugo (Léopold Moati) é recheada de masculinidade tóxica e de humor sensacionalista, ainda que a intenção do filme seja promover esse embate direto da construção social dos homens, nada aqui funciona da maneira que é intencionada.
Assim, todas as questões formais do projeto se perdem nesse industrialismo barato de gatilho fácil, detendo em si uma fragilidade que não facilita o longa em sua manutenção no circuito, muito menos no engajamento do público com as questões projetadas no ecrã. A direção forçosa de Baroux, tem a necessidade constante de abusar de zooms, do plano e contra plano, além de impor certa artificialidade a misancene (versão brasileira Herbert Richers) na busca de uma determinada conjugação com a linguagem televisiva, típica de outros filmes com o mesmo tom. Sem buscar nenhuma diferenciação em seu fim, “Um Amante Francês” se entrega a todos os clichês da cartilha e mantém uma embriaguez tola de ganchos frívolos da comédia que busca essa virilidade desconstruída do século XXI.
Curiosamente cai em todas as armadilhas possíveis nessa tentativa de combater um moralismo senil de uma sociedade igualmente problemática. Ainda que não falhe a ponto de ofender o espectador com seu desenho tosco de argumentação medíocre, não consegue chegar a lugar nenhum com sua apresentação. E a tônica geral do filme não se distancia disso, falhar em todas suas proposições, principalmente no chamariz do gênero. Rir aqui, é um exercício de conciliação com os neurônios, não só pelo conteúdo do roteiro, mas pela falta de carisma de Merad. Apesar de suas buscas em demonstrar o cansaço e a preguiça de seu personagem, não alcança uma potência em sua fisicalidade que possa recompensar os fracassos textuais.
Enquanto tudo desmorona aos poucos, sem nenhum alarde drástico, a montagem consiste em recortar uma composição comercial para a farofada instalada, não que conceitualmente não haja lógica na concepção do produto, mas não é capaz de estruturar uma diretriz que mantenha o compasso narrativo e “cômico”, sem quebrar o ritmo da projeção com uma tirada ou outra fora de tempo. E essa constante se mantém até o fim, fragmentando a experiência e deixando claro que em menos de uma semana toda aquela narrativa se perderá na memória, pois a marca do padrão é ser um produto de consumação rápida de pouca reflexão, aliás, quanto mais se pensa no filme, menos caminhos se abrem na determinação de um texto para o mesmo.
Essa unilateralidade no projeto inteiro, mostra como parte do cinema comercial francês precisa de uma revisão drástica.