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Nosso Verão Daria Um Filme

O Teatro do Verão Passado

Por Letícia Negreiros

Nosso Verão Daria Um Filme

“Nosso Verão Daria Um Filme” nos conta muitas histórias. Vemos Demosthenes e seus relacionamentos turbulentos e Nikitas e seus sentimentos não correspondidos. Panos e seus conflitos com a cachorrinha e Carmen, a própria cachorrinha, uma vítima perdida na narrativa. As histórias, por mais que interligadas, são um tanto desconexas. Pessoas, afinal, são confusas. O longa, porém, não sabe lidar com a própria confusão, entregando uma bagunça, completamente perdida, sem uma finalidade. 

Zacharias Mavroeidis aposta em uma metalinguagem para tecer seu longa. O verão que daria um filme é, na verdade, “O Verão com A Carmen”, que Nikita planeja ao longo da trama. Um filme sobre a escrita de um filme, dividido didaticamente em atos, com as instruções em tela. Até mesmo um livro de Syd Field faz uma breve aparição. Em um primeiro contato, “Nosso Verão Daria Um Filme” tem uma comicidade leve e fácil de processar. Esta, no entanto, logo fica esquecida em meio ao caos da narrativa. 

Nos são apresentados dois momentos da história: presente e passado. As cenas do presente são o ponto alto do longa. Há uma autoconsciência que se perde quando nos voltamos ao passado. A falta de rigidez e circunspeção no agir dos figurantes e em suas falas quebram a sisudez dos personagens principais, lembrando que o longa se trata, de fato, de uma comédia. Trazem, também, uma releitura levemente absurda da ideia popular de um bacanal. A praia é um lugar de liberdade, onde corpos e ações não são julgados. A nudez é amplamente abraçada. É o ambiente em que Demosthenes e Nikita se reúnem para espairecer, se concentrar em algo que não passa de um sonho – ao menos para um deles. 

No passado habita todo o caos do filme. A princípio, a bagunça parece ser justificada. “O Verão com A Carmen” destrincha o verão que Demosthenes passou cuidando de Carmen. A vida de Demos então estava, de fato, uma bagunça. “Nosso Verão Daria Um Filme” nos bombardeia com casos mal resolvidos e intrigas por todos os lados. Namoro, pais, amizade, términos, mortes. Estamos tão perdidos quanto ele. 

A confusão, porém, não nos leva a lugar nenhum. A narrativa nos desorienta de tal forma que não temos tempo de nos identificarmos com as pequenas discórdias da vida de Demos. Não há tempo de se afeiçoar aos personagens. Mal compreendemos se estes realmente possuem alguma personalidade ou são apenas peças perdidas em um cenário desorganizado. A exceção é Carmen, mais pelo carisma intrínseco à espécie do que por méritos narrativos. Então, tem-se um desenrolar sem muito impacto para a trama. O conflito não foi marcado na mente do espectador, não há aflição ou compaixão. Não se sabe exatamente onde o problema termina e a solução começa. Sem as marcações de atos não se perceberia que a história estava realmente progredindo. 

“Nosso Verão Daria Um Filme” ainda tenta trazer algum diferencial na linguagem das cenas no passado. A composição, aliada aos planos e enquadramentos, dão um ar teatral para as lembranças. É uma retomada interessante da história de Demos e Nikita. Atores de teatro aposentados tentado escrever cinema. É belo que suas memórias se organizem dessa forma, retomando – ao que parece – o momento da vida deles em que foram mais felizes. Essa beleza se estende para alguns raros momentos de uma iluminação mais interessante ou um enquadramento inesperado, mas nada além disso. Não é um filme que proporciona grandes imagens e belos quadros. 

É, na verdade, um filme que não proporciona muito. Ainda consegue, graças aos momentos na praia, arrancar algumas risadas e um certo deslumbre com as escolhas de Mavroeidis, mas que são insuficientes para sustentar o longa. Cenas que parecem ter sido pensadas para pontes e interlúdios assumem uma responsabilidade dramática que foge a sua natureza. Vislumbres do presente não podem explicar o passado. Passado este que, por mais que tente, também não explica muito.

 “Nosso Verão Daria Um Filme” se perde nessa tentativa desesperada de se explicar. É paradoxal. Quanto mais mostra, mais expõe, mais conta, menos se entende. A narrativa busca por respostas em lugares tortuosos. Carmen, por exemplo. É um pretexto para Demos e Panos voltarem a interagir, mas é abordada como algo maior. Então, some repentinamente, como se a resposta que trazia para seja lá qual for a questão não fosse mais relevante. É uma ocorrência comum na trama, as respostas, de repente, não são relevantes. 

1 Nota do Crítico 5 1

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