No Meu Lugar
Um filme de Instantes
Por Fabricio Duque
O subjetivismo do ser pertencente a uma sociedade está em estágio crescente. Este aumento causa a não visão do outro. O indivíduo invisível cria as próprias regras, verdades e opiniões radicais. Isso gera a violência interna da não solidariedade e a banalização do agravo ao próximo. Quando as situações fogem do controle do limite aceitável, o caos não aceita mais este limite, fornecendo a conclusão de que não há mais saída. A exteriorização da violência é somatizada pelos acontecimentos e o meio que o vive já não se importe mais por serem corriqueiros e tão comuns a políticos em épocas de campanha. “No Meu Lugar”, longa-metragem de estreia do diretor Eduardo Valente, foge do sensacionalismo barato, retratando a normalidade e a banalização de casos violentos. Utilizando um viés experimental técnico com extrema competência, mostrando pouco as ações e agindo mais nos diálogos realistas, ele respeita o tempo da narrativa que apresenta-se humanizando os personagens. Não há julgamento entre o certo e ou errado. A câmera apenas retrata o que acontece.
“Um pouco mais do mesmo”, diz-se exemplificando a conclusão de um roteiro muito bem realizado, que Eduardo co-escreveu com Felipe Bragança. A simplicidade, quase nostálgica, embalada por músicas que lembram o instrumental de Marcelo Camelo, das ações convence fazendo esquecer que estamos em um cinema.Quando um filme é não é linear, começo, meio e fim, há a possibilidade de perder-se no caminho causando a artificialidade. Aqui não, até porque não não há efeitos de transição de explicação. É um quebra-cabeças que precisa ser montado, respeitando assim a inteligência do espectador.
O diretor de elenco Pedro Freire em “No Meu Lugar” acertou a mão das interpretações. Há cumplicidade, naturalidade e realismo nelas. Até quando utiliza a sexualidade sensual carioca, que está mais do que presente, não apela na linguagem. Pode-se caracterizar como um “filme de instantes”, que anda, anda e volta ao mesmo lugar. O pouco é usado exacerbadamente e o excesso do muito foi cortado. O existencialismo de cada um mistura-se com o do outro deixando as relações humanas fragilizadas e superficiais, enquanto o tratamento interno do próprio andante do caminho exaspera-se de forma sentimental.
Em relação a duração total, “No Meu Lugar” é bem longo. Às vezes cansativo e repetitivo, mas não atrapalha em nada o conjunto da obra. A produção é de Walter Salles, que faz lembrar muito a estética adotada nos seus filmes, como “Linha de Passe”. O diretor vem obtendo sucesso desde o seu primeiro curta “Sol alaranjado”, que o premiou no Festival de Cannes. Este ano retornou a França com o longa em questão. Vale muito a pena ser visto! É excelente. Mas corra. O leitor sabe como é o tempo de permanência de um filme não comercial em circuito, não sabe?