Mostra Um Curta Por Dia - Repescagem 2025 - Julho

Monsieur Aznavour

Incansável, inquieto e obcecado

Por Clarissa Kuschnir

Festival de Cinema Europeu Imovision 2025

Monsieur Aznavour

Nos últimos anos, o cinema tem se empenhando, e bem, em apresentar o gênero cinebiografia de forma muito mais aberta, tentando ser o mais fiel possível à vida do biografado. Afinal de contas, a vida alheia, e principalmente a de gente famosa, sempre instigou a curiosidade humana. Atire a primeira pedra quem nunca foi assim. Um bom exemplo disso é o recente longa nacional “Homem com H”, de Esmir Filho, que aborda um Ney Matogrosso sem censura (indo bem de bilheteria e rapidamente, mas infelizmente, porque poderia ter ficado mais em cartaz, ou felizmente, porque já chegou ao streaming). Da França, agora, chega aos cinemas “Monsieur Aznavour”, um dos títulos que fez parte da primeira edição do Festival de Cinema Europeu Imovision deste ano. O filme em questão aqui fez os cineastas Mehdi Idir e Grand Corps Malade se debruçarem para contar em um pouco mais de duas horas, a vida de um dos mais populares compositores e intérpretes da música romântica Francesa. E haja material para conseguir compilar (em uma bela edição) a longínqua e rica vida de Charles Aznavour, que viveu 94 anos, que tinha obsessão pelo sucesso e que foi interpretado pelo ator Tahar Rahim.

Sim, Charles Aznavour sabia muito bem o que queria e enfrentou duras críticas durante sua carreira, ouvindo até de sua amiga e parceira de trabalho por um tempo, Édith Piaf, que sua voz era rouca para cantar. Ainda bem que o artista não ouviu os “conselhos” e seguiu firme e forte em seu propósito de se tornar uma versão “Frank Sinatra da França” (como já foi chamado) ou, pelo menos, ter um cachê igual ao colega norteamericano. E o menino que cresceu na França, filho de pais armênios que se refugiaram na cidade luz para poderem fugir dos nazistas e que muitas vezes até fome passou, conseguiu chegar ao topo e conquistou o mundo inteiro através de suas clássicas canções românticas como “She” (que eu particularmente sempre gostei e toda vez que eu ouço me deixa emocionada); “La Boème”, “Hier Encore”, “Venecia Sin Ti”  e tantas outras que embalaram diversas gerações. Em “Monsieur Aznavour”, o ator fraco-argelino Tahar Rahim (de “Um Profeta”, “The Mauritanian”), que encarna o cantor, mostra-se muito à vontade, especialmente sem exageros, e bem caracterizado, em um roteiro bem redondo e bem desenvolvido, que realmente agrada. Já na pele de “melhor amiga” Édith Piaf está a atriz e comediante Marie-Julie Baup (confesso que em alguns momentos, a achei um exagerada demais, mas para quem conhece bem a vida de Aznavour sabe o quanto ela foi importante para impulsionar a carreira do cantor), além do pianista Pierre Roche (o ator Bastien Bouillon), que foi sua dupla por um tempo (mas depois acabou se instalando em Montreal, no Canadá).

Aliás, foi esse Canadá uma passagem importante para Charles Aznavour, que “quase” se rendeu aos encantos do país norteamericano, mas que felizmente acabou retornando a sua pátria amada, a França, por “outro conselho” (desta vez certo) de Piaf, que disse “seu lugar é na França e você tem que cantar para os franceses”. E assim, o artista de “voz rouca” voltou, cantou e encantou não só a França, como o mundo todo. No filme, nós podemos entendê-lo melhor. Era como se diz hoje: um workaholic.  Vivia na estrada e nos palcos. Sua sorte é que teve uma família incentivadora, inclusive com uma irmã também cantora, além de quatro filhos e dois casamentos (o segundo por muita insistência). Sim, Charles sempre foi muito inquieto, muitas vezes melancólico, meio distante do ambiente familiar e, mesmo depois de suas conquistas, parecia lhe faltar algo. O que eu mais senti falta em “Monsieur Aznavour” foi uma maior liberdade de seu roteiro, que se limitou mais na carreira dele como músico. Se era para colocar tanta coisa, poderia então ter mostrado mais dele no cinema (o cantor foi participou como ator em mais de 50 filmes, inclusive sob a direção de François Truffaut em “Atirem ao Pianista”, além de “O Caso dos dez Negrinhos” (adaptação do livro de Agatha Christie), de Petter Collinson, e “O Tambor”, do Alemão Volker Schlöndorff. Mas como nem tudo é perfeito e como não vi o documentário “Azvanour por Charles” (mas que a crítica de Fabricio Duque pode ser lida aqui), fico com os bons momentos e as belas canções (que sim, uma “crítica construtiva” aos distribuidores, poderia muito bem ter sido legendadas em português), que pude acompanhar nesta ficção francesa. Um filme que merece ser visto sobretudo nas telas dos cinemas.

4 Nota do Crítico 5 1

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