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Meu Nome é Bagdá

As amazonas da cidade grande

Por Fabricio Duque

Durante o Festival de Berlim 2020

Meu Nome é Bagdá

Pouco antes do mundo parar e a pandemia soar apocalíptica, a realizadora brasileira Caru Alves de Souza (de “De Menor”) exibiu seu segundo longa-metragem de ficção, “Meu Nome é Bagdá”, no Festival de Berlim 2020, vencendo Melhor Filme pelo Júri Internacional (Crystal Bear) na Mostra Generation 14plus, cuja obra transcende a questão de gênero, abordando a vida de uma skatista, quando contempla o habitat natural de sua protagonista, que precisa quebrar barreiras extremistas de provar que o faz é mais que uma fase transgressora contra um sistema repressor. A narrativa observa sem pressa, conseguindo ainda a proeza de desconstruir a estética  voyeur invasiva de Larry Clark, e seu “Kids”, e/ou de Gus van Sant em “Paranoid Park”, com a condução da naturalidade.

Sim, mas por mais que queira “Meu Nome é Bagdá” não consegue fugir dos gatilhos estruturais, já condicionados e normatizados, do neo cinema arthouse. Tudo porque há um limiar entre dois mundos. De um lado, a busca pela por uma proposital ambiência de coloquialismo espontâneo (a fim de traduzir uma liberdade acostumada). Do outro, a inserção de câmera lenta, por exemplo, e/ou das imagens digitais e amadoras captadas pelos celulares dos personagens. Os dois querem complementar o mesmo objetivo, o de construir uma íntima afinidade com a intensão de estreitar a afinidade com o espectador. Entre conversas, papos jovens “comendo carne”, “musas encantadoras”, o filme sinaliza que aprofundará ainda mais a intimidade, a ajuda à mãe na “base da chantagem”, por exemplo.

Nós precisamos lembrar que este é um longa-metragem integrante da Mostra Geração e assim “precisa” ser mais infanto-juvenil, palatável e divertido. A abordagem tem que seguir um fluxo que questione, mas não cause “consequência”. Dessa forma, “Meu Nome é Bagdá” traz, intercalada, poesia popular, improvisos e assuntos de “Marte” (e de “conquistar o homem perfeito em dez passos”). Será que eles são extraterrestres? Seres de outros planetas inaptos e deslocados com a hostilidade comportamental da Terra? Só que são adolescentes. Rebeldes, inconsequentes, impulsivos, mimados, de “agradar, depois derruba”. Será que ETs também passam por isso? Por essa delinquência juvenil? Mas será que são delinquentes ou incompreendidos? Talvez, ainda que possa soar bem fácil compreender os jovens, nunca entenderemos suas ações e imaturidades. Sim, nós também fomos um deles um dia. A narrativa segue no limite tênue dos dois mundos mencionado acima. Há um tom de ensaio. De que estamos assistindo uma preparação para a cena. Rita Pavone, meninos de rua, desfile de moda no saguão, “Meu Nome é Bagdá” foca em subverter o gênero “um véu de ilusões” pela estética crua da imagem não lapidada e não finalizada. É como se o tempo do que se vê bagunçasse o espaço desta liberdade imprudente aos olhos da sociedade adulta. Os mais idosos “machistas” encaram. E a quarta parede é quebrada.

Outra questão importante que “Meu Nome é Bagdá” é sobre o próprio cinema brasileiro, que por “bater na tecla de não ter dinheiro” criou a estética do possível. Do que “tem na mão”. Em que a ideia é mais importante que a embalagem, permitindo assim que o conceito não precise de apuro técnico e simplesmente de evocação autoral. Pois é, e aqui ideias não faltam, que se desenvolvem por paradoxos e contradições de “conquistar”, “fazer” e “trabalhar”. “Sair dos sonhos”, diz-se, entre ofensas de “gay”, música árabe, policiais preconceituosos (“opressão exagerada” e os que “deveriam proteger”) e “queijo quente com o ferro”. Ela é “de menor”. É, “Meu Nome é Bagdá” é muito São Paulo, entranhado na alma, por improvisar a naturalidade, e especialmente por potencializar o machismo dos homens “escrotos”. Sim, é um filme feminista. Completamente Girl Power. Muito também por gerar maniqueístas arquétipos comportamentais. Tudo é exagerado. Sim, São Paulo é assim: intenso, hiperbólico, ansioso, urgente e imediatista, buscando a companhia, mas gostando de viver a própria solidão.

“Meu Nome é Bagdá”, para suavizar insere a fantasia à moda de “O Mágico de Oz”. De final de mundo. O filme traz ainda a contradição de se comportar livre com a projeção utópica do conservadorismo crônico excessivo e da nostalgia (especialmente na cena pós ônibus). Nenhum jovem sente-se totalmente confortável e imune à interferência dos amigos. É um período de descoberta. Diversão, skate, maconha e comida. O que se pode querer mais? De Spike Lee ao “ mundo da escola cheio de corações vazios”, passando por “menstruar junto”, festa funk, Mc Carol, “Meu Nome é Bagdá” é um filme sobre respeito. Sobre permissões de experiências. Sobre o skate ser “a meditação do futuro”. Sobre “as mina” confrontar “os mano” e os deixar acuados. Sobre empoderamento. Sobre levantar a voz no discurso de luta por ser o que se é. Sobre “mulheres unidas”. Sobre amazonas modernas que blindam homens e só desejam se divertir com seus iguais.

3 Nota do Crítico 5 1

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