Leonora, Adeus
Pirandello apenas para Taviani
Por Giulia Dela Pace
8½ Festa Do Cinema Italiano, Festival Internacional de Cinema de Berlim
Luigi Pirandello foi um dos grandes dramaturgos italianos e até mesmo do mundo. Com as renovações que trouxe ao teatro e sua originalidade, ressalta-se a reinvenção do humor, o poeta siciliano levou em 1934 o Prêmio Nobel da Literatura para casa. Embora esse grande prêmio não pudesse ter sido entregue em pior momento, pois o fascismo de Mussolini ainda governava o território e o “patriotismo” de um homem à beira da morte gritou mais alto: Luigi Pirandello participou da campanha de coleta de ouro, organizada pelo próprio Mussolini, e entregou a medalha com o objetivo levantar fundos para o país conseguir fracassar miseravelmente na guerra Ítalo-Etíope. Então, oitenta e seis anos após sua morte, Pirandello é homenageado por Paolo Taviani, em seu novo filme “Leonora, Adeus”.
O longa é uma espécie de testamento do cineasta, assim como é uma carta de amor ao país; ao cinema e a Pirandello, mas também uma homenagem ao irmão, Vittorio Taviani, com quem dividiu grande parte de sua carreira no cinema e prêmios de grandes festivais. Paolo dedicou “Leonora, Adeus” a Vittorio, quatro anos após o falecimento do irmão.
Embora tenha sido uma bela homenagem a tudo e a todos, um filme não se faz brilhante ou ganha importância por simplesmente prestar honrar certos nomes. Como também não se resume simplesmente em suas potencialidades comunicacionais, mas carrega a força da arte pela palpabilidade de alguns espectadores sobre as mínimas trivialidades de uma obra cinematográfica. Então, cada filme, teoricamente, poderia ser bom e ruim ao mesmo tempo, já que depende apenas de quem o vê? Sim e não.
No caso de “Leonora, Adeus”, embora o contexto seja tocante, o longa por si só é feito de forma amadora e se contrasta com a longa carreira brilhante do cineasta e de seus homenageados, pois não há muito esmero sobre a direção, fotografia, iluminação…ou qualquer outro recurso. Embora o filme não tenha tanto apreço pela técnica, ele parece mais um momento para prestar homenagens e também se divertir fazendo o que o diretor passou mais de cinco décadas gostando de fazer: simplesmente, filmes.
Mas ainda há de se questionar e apontar certas questões. Por exemplo, o roteiro, em especial, é desconexo. Parece quase que foi feito para ser compreendido apenas por Taviani como um filme mais introspectivo, apesar de sua estrutura tradicional de começo, meio e fim. Portanto, as mensagens do filme acerca da morte, envelhecimento e absurdos entre real e ficção ficam ruidosas e pouco se compreende das narrativas dispersas e rasas, ainda mais pela divisão – a grosso modo – de três curtas dentro de um longa. No primeiro temos Pirandello em seu leito de morte divagando por suas, quase póstumas memórias, sobre escolhas de vida e aparência de seus filhos, que envelhecem conforme se aproximam do pai. No segundo a aventura de um policial que é encarregado de levar as cinzas de Luigi Pirandello de Roma de volta à Agrigento – cidade siciliana de origem do poeta – e o faz com esmero, apesar dos infortúnios no caminho. E por fim, o terceiro “ato” – que mais parece uma ideia da madrugada do cineasta que foi introduzida posteriormente a toda produção, pois não se casa bem com o restante das narrativas – é marcado por cores, enquanto o restante do filme é filmado em preto e branco, e pela adaptação de uma peça de Luigi Pirandello que termina com um assassinato condicionado por um prego.
Acaba que o conceito e contexto do filme fica mais interessante do que o resultado da produção por si só. É essa carta de muitos amores não românticos restritas críticas ao fascismo italiano – que poderiam ter sido mais duras –, que comunica muito mais com Taviani do que com os espectadores. E aí cria certo distanciamento das narrativas para pensar muito mais em seu conceito, algo que se assemelha um pouco com a ideia de humor de Luigi Pirandello – para o autor, o humor se difere do cômico quando há distanciamento da piada e momento de reflexão do espectador para compreender as razões desta.
Por fim, quando atingimos certa idade nos tornamos crianças novamente, e aí cabe aos críticos e espectadores se distanciar para compreender a mensagem do filme por ser contexto também, pois não se critica a pintura de uma criança que retrata seus pais por seus traços pouco verossímeis e técnicas nada profissionais de desenho, mas seu processo de diversão, espairecimento e tentativa de agradar a quem se presenteia com a obra. Isso também é parte da função do espectador: pensar ativamente sobre o que se vê e como se vê.