Kitbull
Sem Ladrar
Por Jorge Cruz
“Kitbull”, curta-metragem indicado ao Oscar 2020 na “cota Pixar“, consegue trabalhar melhor a ausência de verbalização em relação a outro competidor, “Hair Love“. O motivo é tão simples quanto óbvio: ao contrário de boa parte das animações fabulescas de estúdios como esse braço da Disney, há uma predileção aqui pelo realismo. Na fórmula quase padronizada de produções com essa metragem e nessa linguagem, afasta-se as interações por palavras, passando a brincar com o uso dos sons.
Por isso, resta ao gato miar e ao cachorro latir. O que a roteirista e diretora Rosana Sullivan faz com essa premissa é uma bonita história sobre a dignidade animal, outro objeto de constantes debates na sociedade. A realizadora, apesar de jovem, está há quase dez anos na Pixar, tendo atuado no departamento de animação de filmes de continuidade de franquias, como “Universidade Monstros” (2013) e “Os Incríveis 2“ (2018). A proposta temática de abordar a relação com os bichos remonta ao passado de Sullivan, que começou sua trajetória universitária estudando veterinária. Sua profícua carreira também gerou em 2019 um livro infantil, autobiográfico, chamado “Mommy Sayang“, com ilustrações da própria artista.
“Kitbull” (que pode ser assistido na íntegra ao final da crítica) faz parte de um projeto da Pixar chamado SparkShorts, onde a empresa selecionou seis colaboradores e desafiou a produzir um curta-metragem com cronograma e orçamento limitados. A ideia era alimentar o canal do estúdio no YouTube, ao mesmo tempo em que aumenta o acervo de obras contemporâneas para o serviço Disney+. A título de curiosidade, segue a lista dos outros cinco projetos, os dois primeiros devidamente linkados: “Purl“, “Smash and Grab“, “Float“, “Wind” e “Loop“.
A repercussão de uma indicação ao Oscar faz da obra de Sullivan a mais assistida do pacote. Enquanto os outros filmes possuem entre 5 e 15 milhões de visualizações, “Kitbull” já conta com mais de 30 milhões. Trata-se de uma das poucas produções da empresa feita à mão, em animação 2D. Tem como grande qualidade um tempo de maturação certeiro, em um ritmo que concede a singeleza à qual se propõe. Humaniza a relação entre gato e cão sem apelar para representações equivocadas. Ou seja, provoca empatia sem subverter nenhum dos elementos básicos de seus protagonistas. Algo nem tão corriqueiro assim, ainda mais em uma linguagem que praticamente clama pelo caminho oposto.