Mostra Um Curta Por Dia 2025

Kasa Branca

Cultura Suburbana

Por Vitor Velloso

Assistido durante o Festival do Rio 2024

Kasa Branca

Demonstrando um pouco da realidade do periférica do Rio de Janeiro, “Kasa Branca”, de Luciano Vidigal, acompanha três jovens, Dé (Big Jaum), Martins (Ramon Francisco) e Adrianim (Adriano Francisco) ao longo dos últimos dias de vida de Almerinda (Teca Pereira), vó de Dé. Por fugir da paisagem tradicional de parte dos projetos cariocas e localizando a Chatuba como território desses personagens, o filme consegue um respiro que o diferencia dos demais filmes, ainda que seja bastante irregular em sua construção. 

“Kasa Branca” consegue utilizar o drama de seus personagens para criar uma conexão com o público, sendo capaz de emocionar, ou criar identificação, com uma parcela da plateia através de situações similares que moradores do subúrbio carioca já experienciaram. O roteiro, de Luciano Vidigal, é eficiente para elaborar pequenas cenas funcionais em sua narrativa, desde a fila enorme e dificuldade em garantia de direitos junto ao Estado, e os caos nessas agências, até o carro da milícia circulando nas ruas. Porém, o longa tem dificuldade de transformar essas cenas em algo que faça a narrativa progredir para uma construção dos personagens e das situações apresentadas, pelo contrário, muitos desses segmentos parecem apenas cumprir sua função de exposição da realidade, não é exatamente algo que movimenta a trama ou a relação dos personagens. Por exemplo, após a ronda do carro da milícia e o aviso que Dé recebe na mesma cena, Martins e Adrianim discutem se o carro “estava mandado” ou não, demonstrando uma certa incompatibilidade com moradores da região, pois carro preto, todo insufilmado, é algo inquestionável. De toda forma, os problemas entre o roteiro e a montagem (André Sampaio) são notáveis em outros momentos, quando L7nnon aparece a primeira vez, Talita (Gi Fernandes) procura trocar olhares com o rapper, mas não há nenhuma menção de que eles se conhecem, em uma cena posterior isso parece uma informação trabalhada pelo longa, pois o rapper a chama para tocar em um show. Enfim, são incongruências no desenvolvimento que realmente tiram a concentração do espectador, já que são informações incompletas, fragmentadas e/ou isoladas. 

Assim, o longa vai se tornando um grande recorte dramático, que apesar de funcionar momentaneamente, perde força quando a estrutura fica mais ampla e progride para sua resolução. O efeito é bastante fragilizante, pois além de fragmentar o drama, redimensiona seus personagens à uma simplicidade limitante, que impede o projeto de desenvolver as relações e particularidades dos protagonistas, tornando a experiência repleta de entraves. Por outro lado, a obra consegue abarcar uma série de particularidades características do subúrbio carioca, retomando paisagens cotidianas, como o trem, para se tornar um hábito frequente de Dé e sua avó, apenas para Almerinda observar. E essa habilidade de transformar o ócio em um ritual de um dia-a-dia, repleto de encontros e reencontros, reproduz uma clássica dinâmica da periferia carioca, e como depoimento pessoal, foi o suficiente para me recordar de quando morei por pouco tempo em São João de Meriti. 

“Kasa Branca” é tão bem intencionado quanto ambicioso, dificultando seu pleno desenvolvimento para que seus personagens tenham uma vida mais orgânica e menos dependente de situações particulares estabelecidas como “checklist”. Isso se deve pela grande quantidade de temáticas que vão aparecendo com a progressão da projeção. Não por acaso, o número de personagens é elevado, mesmo que alguns possuam poucos minutos de tela, como Talita e o pai de Dé (Babu Santana). Contudo, deve ser mencionado o trabalho que a fotografia, assinada por Arthur Sherman, cumpre no filme, sendo capaz de criar um contraste muito forte entre as cenas prosaicas de dia e algumas tomadas noturnas, com uma luz que apesar de sua artificialidade, e justamente por ela, ajuda a construir uma dinâmica de oposição, lúdico e, por vezes, repleta de tensão sexual.  

2 Nota do Crítico 5 1

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