Para não dizer que não falei da Ilha das Flores
Por Chris Raphael
Atemporal seria a palavra que melhor define este curta-metragem. Sendo uma produção de1989, trinta anos passados não tiraram o viço das ideias e nem o apelo didático da narração de Paulo José. Com direção, roteiro e argumento de Jorge Furtado, a película intitulada “Ilha das Flores” trata de fatos verídicos sem ser intencionalmente um documentário: vai Instigando o espectador a percorrer os caminhos que separam as “castas” da sociedade brasileira , separadas pela liberdade ou pela ausência dela. Numa mensagem totalmente explícita, as imagens ficam presas na retina de quem observa o cotidiano dos seres humanos que possuem telencéfalo altamente desenvolvido e polegares opositores.
O diferencial desta produção cinematográfica é o sarcasmo permanente entre a fala do narrador e as imagens observadas em tela. Ilha das flores existe, nos diz a primeira frase do filme. E é inacreditável. A trilha sonora escolhida para compor a produção foi retirada da peça musical “O Guarani“, de Carlos Gomes, e é amplamente conhecido por ser a introdução da Voz do Brasil, um noticiário radiofônico estatal, diário e de difusão nacional obrigatória. Com isto, a narrativa assume, por associação, uma forma oficiosa de notícia.
Enquanto o público atual assiste a exibição deste curta metragem em um misto de complacência e indignação, persiste em um país trinta anos mais velho as mesmas desigualdades sociais que assolavam o mundo em 3 décadas atrás.
Lamentavelmente, a mensagem do infortúnio encontra um público despreparado e nada acontece, apesar da gritante denúncia. ‘Que lástima’, será dito entre sussurros. Talvez uma lágrima se projete no olhar dos mais sensíveis. Algumas faces ficarão estupefatas. Ao voltar para casa, tudo que foi visto será esquecido, e servirá , no máximo, para um comentário entre colegas sobre um filme incrível assistido na noite anterior. E assim, cumprirá o papel que lhe cabe: servir de entretenimento, neste momento caótico. E nada mais.
“Ilha das Flores” foi eleito o melhor curta-metragem nacional de todos os tempos da história do Brasil, em votação realizada pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine), anunciada em maio deste ano. A produção foi lançada em 1989 e, no ano seguinte, venceu o urso de Prata de curta-metragem, no 40º Festival de Berlim, além de levar diversos prêmios nacionais, como o de melhor filme de curta-metragem no Festival de Gramado.