Curta Paranagua 2024

Fórmula Selvagem

A Grande Orgia das Tosquices

Por Ciro Araujo

Durante o BAFICI 2022

Fórmula Selvagem

A ficção científica contemporânea no cinema sofreu uma promoção. O papel, que antes correspondia aos filmes B, agora são do mais alto escalão, orçamentos absurdos e tudo que vem junto no pacote que conhecemos. Contudo, faz-se observar que no Brasil o papel ainda é mais complexo, seja por falta de apoio cultural ou aceitação. “Fórmula Selvagem”, do diretor Flávio Carnielli decide revisitar em uma espécie de pastiche-paródia à ficção em sintonia com a própria história do cinema latino-americano.

As obviedades são grandes. Panamerica, um estado bolivarianista, que parodia a América Latina. Parece com uma certa El Dorado, de Glauber, em “Terra em Transe”. Dois estados à mercê de um totalitarismo. É assim que o filme de Carnielli se entrega à paródia. Enquanto compreende sua originalidade brasileira, recebe também as obras do tipo B, as esquecidas. O australiano “Mad Max”, de George Miller, ganha automaticamente a primeira inspiração para a loucura apresentada. Uma corrida de carros que mistura com a quase tara humana em vez a sociedade se batalhando em um coliseu de sangue e ode à violência. Essa orgia cultural que o filme se aceita como é dada a largada (entenda o trocadilho, por gentileza) justamente em sua clara aceitação ao gênero. Comerciais falsos são apresentados, inclusive como muletas na história para a construção do governo local; Cortes rápidos e amadores; Um chute tão cego para o tosco que derrama no brega em automático. Essas pontuações que a obra produz são motivos para a construção visual importante com o prolongar do negócio, se não fosse sua repetição.

Está claro o interesse de Flávio Carnielli nos padrões do populismo latino-americano. E mais: na tosquices geradas pela estética da extrema-direita. Pode ser um chute forçado tal análise? Talvez, mas a verdade é que a aplicação funciona, seja pelas obsessões de valores tradicionais e masculinizados do conservadorismo, seja pela falta de refinamento dentro do filme. A verdade é que esses ismos se misturam, apesar de ser muito complicado também aceitar que todos eles estejam interligados, como uma solução homogênea. Discursos assim transformam em falas imbecis como “fascismo é a mesma coisa que comunismo”. Todavia, o debate que “Fórmula Selvagem” produz é, de fato, um escrachado do que é visto na América Latina. Excelente resultado, diga-se de passagem, pois o brega é centralidade dentro da orgia visual. Antes fosse esse cinema por alguns minutos, pois de fato foi certeiro e bem condicionado. Entretanto, a pegadinha que Carnielli se permite cair está justamente no uso repetido da piada e na falha de refinamento ao passar do filme. As piadas tentam aproveitar do caráter inventivo em que há espaço, mas parece que (o espaço) já fora usado previamente.

E então, o que parecia mais um dos interesses do longa-metragem, que neste caso era nas produções de Jairo Ferreira, se perde por excessos. E acaba sendo irônico interligar o super uso com Cinema de Invenção. “O Vampiro da Cinemateca” simplesmente explode de informações, mas ainda assim a produção antiga é definitivamente mais potente que no filme de Flávio. As chamadas “doideiras” que o diretor reproduz tem uma afinação do tempo que não se ajusta, que não se encontra. Cortes pouco identitários, um escrachado além do necessário. Talvez seja um exemplo perfeito de como trabalhar tudo que gira entorno e sabotá-lo ao ir além (do próprio além).

Assim, “Fórmula Selvagem” se descumpre de suas inúmeras influências quando se leva um pouco além das cenas cruas. Flávio Carnielli em seus momentos mais brilhantes grava e escancara a ode à violência e breguice de um militarismo extremamente burro através de racismos e bordões. O uso de clichês, ou melhor, arquétipos, para atravessar o mundo apocalíptico que se filma, uma Terra difícil de retratar com o baixo orçamento do longa. Claro, são soluções até inventivas para a produção, mas quando vai além disso as homenagens constantes às paródias de Sítio do Picapau Amarelo (e sua perversidade) se limitam apenas ao clichê. Em nenhum momento cenas individuais possuem potência, tornando-o muito mais um filme de momento em que se ri dos absurdos mas que não impressiona para mais. Será fácil ver comentários sobre que falam a respeito do quão incrível é essa mistura, porém não mais além. É essa a hora em que ele marca, enquanto desaparece pela memória.

2 Nota do Crítico 5 1

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