Desejo, Paixão e Razão
Gerações e suas descobertas
Por Vitor Velloso
Cinema Virtual
“Desejo, Paixão e Razão” de Katharina Mückstein é um projeto que circula entre seus personagens para chegar a um clímax programático já explícito no título. A construção é consciente dos caminhos que toma e desenvolve seus personagens com paciência, até que a cantoria possa ser introduzida como uma catarse coletiva. Porém, a lentidão do projeto se apresenta como um desafio a ser superado, não por um tédio constante, mas um desinteresse profundo em alguns personagens. E é nessa divisão que as coisas não funcionam muito bem, porque a grande disparidade no desenvolvimento entre eles faz com que alguns eixos sejam esquecidos, até que sejam ressuscitados na tela.
Mas a estrutura das descobertas de cada um, em geral, é eficiente. A história da protagonista acaba sendo a mais clichê, com resoluções dramáticas programáticas, ainda que consiga uma boa representação da sociedade preconceituosa. Alguns breves diálogos conseguem dimensionar o que está por vir, onde a marginalização das personagens é crescente, pois nenhum dos lados está disposto a aceitá-las. E é nesse meio que o espectador precisa se manter firme diante de “Desejo, Paixão e Razão” pois a obra passa a se repetir sem parar, com os mesmos personagens fazendo as mesmas coisas em lugares iguais, por um bom tempo. O início dessa lentidão está após os vinte minutos iniciais e os últimos vinte, ou seja, não difere da grande maioria dos projetos no lugar de seu desenvolvimento.
Ainda que as coisas consigam funcionar na reta final, o clímax pode ser um pouco embaraçoso para quem não mergulhou de cabeça na situação. Os números musicais são apresentados em uma dinâmica que não convence muito a partir de sua direção em si, mas são raras as situações em que eles ocorrem.
Como dito, o problema da liga tá no meio do projeto, onde perde-se muito ritmo procurando o próprio tema, tentando encontrar algo para se apegar. Está claro que algumas muletas dramáticas são utilizadas e a história se torna uma reprodução de padrões da indústria, mas para quem chega nos créditos finais, a sensação é que o eixo de Paul (Dominik Warta) parece deslocado dos demais e um dos mais interessantes. A falta de um projeto sólido para abarcar todos os personagens é o que acaba pesando em “Desejo, Paixão e Razão” que perde muita força até se encontrar. De toda forma, algumas investidas formais aqui são funcionais, ainda que sem grandes originalidades. O filme é sintético e econômico em sua grande maioria, procura limitar a maioria das cenas em poucos planos, com uma diretriz clara das pretensões narrativas. E a fotografia acompanha essa pegada com alguma versatilidade, sem ceder ao naturalismo barato ou a intervenção brutal diante da cena, mantém um esquema de silhuetas e contornos, procurando um realce das dúvidas de seus personagens de uma forma explícita.
A perspectiva de conciliar as gerações com seus próprios questionamentos e descobertas, até é uma ideia curiosa, mas que nunca funciona tão bem na prática, já que assume um protagonismo que ofusca as demais relações. Além disso, as representações procuram essa violência mais juvenil, onde a revolta é constante e a necessidade de ser compreendido(a) é uma sina. E é exatamente onde o eixo de Paul poderia contribuir drasticamente para que as coisas se encaixassem melhor, sem tantos vácuos que reduzem o interesse do espectador em uma história que demora a deslanchar.
“Desejo, Paixão e Razão” é um produto claramente internacional e programático, mas até consegue bons momentos no marasmo de sua maior parte. Ainda que seja um “enlatado da Europa para europeus” é minimamente honesto na maneira como constrói seu drama, ainda que com diversos problemas de ritmo. Os personagens possuem algumas densidades que não costumam passar nos grandes projetos comerciais. Bem ou mal a exibição no festival de Berlim ajudou na distribuição do filme.