Uma falha na dobra
Por Fabricio Duque
“Uma Dobra no Tempo” é a representação do universo Disney em sua forma mais pura e inocente, em uma batalha entre o bem e mal, que atravessa galáxias. É a magia da esperança que encontra a “frequência” correta para espalhar a felicidade.
É também sobre descobrir a própria força que cada um tem dentro para si a fim de transpassar barreiras, preconceitos, julgamentos, vinganças, medos e descrenças. É transcender e impedir que a maldade domine o mundo e influencie corações e mentes vulneráveis. O filme é sobre a aceitação. De uma adolescente negra que reprime a verdadeira essência do que é a uma “guerreira” que acredita incondicionalmente em seu potencial de mudar galáxias e concretizar seu maior sonho: trazer seu desaparecido pai das trevas.
“Uma Dobra no Tempo”, baseado no livro homônimo de de Madeleine L’Engle, é uma aventureira colagem de referências a outros filmes que se utilizam de metáforas para passar a mensagem que só com o amor pleno e absoluto podemos nos salvar e também as pessoas de nosso redor.
Os irmãos Meg (a atriz Storm Reid) e Charles (o ator Deric McCabe) decidem reencontrar o pai, um cientista que trabalha para o governo e está desaparecido desde que se envolveu em um misterioso projeto. Eles contarão com a ajuda do colega Calvin (o ator Levi Miller) e de três “excêntricas” e poderosas mulheres em uma ousada jornada por diferentes lugares do universo.
Quando a luta maniqueísta acontece, nós remetemos a Darth Vader da saga “Star Wars – Guerra nas Estrelas”. Quando Meg cruza galáxias temporais, pensamos em “Guardiões da Galáxia”. Quando as três “rainhas magos” (Senhoras Quéqueé, Quem e Qual, respectivamente, as atrizes Reese Whiterspoon, Mindy Kaling e Oprah Winfrey, esta, a representação feminina de Deus) aparecem, inferimos a “Mary Poppins”. Quando comida e doces são oferecidos, “João e Maria” e os doces na floresta. Quando a aventura desenvolve-se, “Alice no País das Maravilhas”. Quando o pai é procurado, então “Tron: O Legado”. Entre outras.
Dirigido pela diretora americana Ava Duvernay (de “Selma – Uma Luta Pela Igualdade”), que é a primeira mulher negra a dirigir um blockbuster, “Uma Dobra no Tempo” é uma obra de militância comportamental, que aborda inúmeros questionamentos sociais (como a diversificação multi-racial, representativa, dos membros da família – no livro todos os integrantes eram brancos) e que busca mostrar uma humanidade “limitada”, perdida e envolta nas obsessões da imagem e no seguimento de permanecer dentro da caixa, tudo repetido para agradar ao outro em detrimento da própria alegria.
Contudo, o longa-metragem apresenta um frágil resultado e está aquém da qualidade Disney de ser, tanto em conduzir seus atores, quanto em construir suas ações live-action. Soa preguiçoso, como a performance amadora de uma peça infanto-juvenil em uma escola. Tenta-se um espetáculo visual por elementos pop, de já conhecidos e confortáveis gatilhos comuns de fórmula pronta.
“Uma Dobra no Tempo” é mais entretenimento novela, à moda Sessão da Tarde da Rede Globo, que procura desesperadamente pela cumplicidade do olhar ingênuo de famílias mais tradicionais. Ainda que com poucos alívios cômicos, o filme foca completamente no politicamente correto e na digestão rápida. É uma jornada fast-food. De conhecimento. De crescimento.
Mag é a “Senhora das Estrelas”, que assim como Robin Williams em “Amor Além da Vida”, de Vincent Ward, viaja ao inferno para resgatar sua mulher amada, aqui, temos a figura de uma nova “profeta” (comparada a Ghandi, Nelson Mandela, Shakespeare), que, após “perder seu pai”, desistiu da vida, sentiu vergonha de ser quem é, piorou as notas e potencializou sua agressividade.
“Uma Dobra no Tempo” é sobre o resgate dos valores morais. De nunca abandonar amizades e perdoar parentes que trocaram estar com a família para trabalhar. É uma crítica a estes pais que “abandonam” seus filhos por preterir a própria individualidade. É um filme família, que ensina base, confiança, respeito e a sempre pensar positivo, porque assim a “energia” boa encontra a bondade e impede que o mostro da maldade domine os entes mais queridos. É também sobre a redenção. Mas a forma como é construído incomoda pela excessiva manipulação emocional, pelas tempos musicais e pela despreparada e desengonçada narrativa que se perde, encontra brechas e não as fecha. As filmagens aconteceram na Nova Zelândia.