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Crítica: Três Anúncios Para Um Crime

A força e o domínio absoluto de Frances McDormand

Por Fabricio Duque


“Três Anúncios Para Um Crime”, do diretor britânico Martin McDonagh (de “Sete Psicopatas e um Shih Tzu”, “Na Mira do Chefe”), indicado em diversas categorias ao Globo de Ouro 2018, incluindo a de Melhor Filme, é sobre uma mãe, inconformada com a ineficácia da polícia, que enfrenta uma cidade machista para lembrar a todos que o culpado pelo brutal assassinato de sua filha ainda está à solta. É um filme que se pauta na força descomunal de sua protagonista Mildred Hayes (interpretado com maestria irretocável por Frances McDormand).

A narrativa, moldada por inferências cinematográficas que ambientam o universo de Clint Eastwood com “Onde os Fracos não têm Vez”, dos Irmãos Coen, busca o conteúdo da própria trama quando conta a história pela diretiva da simplicidade. Aqui, os diálogos são mais importantes. Não há invenções de câmera, tampouco de edição. É seco, pontual e até mesmo ingênuo, este principalmente entendido por sua estrutura de novela, perceptível pelo aprofundamento dos núcleos pessoais, a fim de argumentar causas e consequências.

O roteiro “morde e assopra”. O roteiro fornece o drama temático da tragédia, que aborda o que de mais sombrio existe na alma humana, mas também suaviza com alívios cômicos de sarcasmo -espirituoso embutido e com a presença da trilha-sonora, do preâmbulo ao desenvolvimento propriamente dito (que se apresenta como protagonista, por introduzir mudanças-humores, por exemplo de uma gaita irlandesa, depois uma ópera de contraste, depois uma insinuação a um faroeste moderno, depois o folk), do renomado compositor multifacetado Carter Burwell (de “Carol”, “Fargo”).

“Três Anúncios Para Um Crime” investe na passionalidade urgente, imprudente, emocional e imediatista (de seus personagens, especialmente de Mildred, que resolve “acordar”, com a colocação de três outdoors protestantes “obscuros” (abandonados “desde 1986″), moradores e “incompetentes” policiais de Ebbing, Missouri para que possam reviver na própria pele o sofrimento da injustiça que ela sente: sua filha foi estuprada e queimada “enquanto morria”.

Mildred decide chamar atenção para o caso não solucionado alugando três outdoors em uma estrada raramente usada. A inesperada atitude repercute em toda a cidade e suas consequências afetam várias pessoas, especialmente ela própria e o Delegado Willoughby (o ator Woody Harrelson, de “Proposta Indecente”, “Assassinos Por Natureza”), responsável pela investigação.

Ela bagunça, começa uma “guerra” e expõe os erros, abusos e ditaduras do poderio incondicional dos profissionais racistas da delegacia, que seguem poucos direitos civis constitucionais, como mudar “tortura de criolos” para “tortura com os de cor”. “Se nos livrarmos de todos os policiais com inclinações racistas, então só teremos três deles que vão odiar os gays”, diz-se.

O longa-metragem caminho no limite tênue da sinestesia dos silêncios (por olhares que conversam sem palavras) e do exagero sentimental, este quando aumenta a dose de respiro do espectador, intercalando baixos e altos, ora com vitimismo sobre doenças terminais, ora com emoção naturalista, ora com digressões-lembranças, ora com ofensas provocativas, ora com o preconceito a um anão (o ator Peter Dinklage, de “Game of Thrones”), ora com violência justificada, ora com snacks para um animal, ora com o novo chefe de polícia, ora com a solidariedade da bondade de se fazer o bem sem olhar a quem.

Resumindo, é um filme de momentos. Alguns excelentes, como a perspicácia que desarticula os argumentos da Igreja Católica, e alguns inseridos ao propósito de piada gratuita, como a construção do personagem “retardado” (estilo o do seriado “Twin Peaks”, de David Lynch) e violento, Jason Dixton (o ator Sam Rockwell), manipulado pelas ideias conservadores, à moda Donald Trump, de sua mãe, que ganha a redenção e um final afetuoso de seu público.

“Três Anúncios Para Um Crime” objetiva a mensagem de que pessoas podem ser modificadas. E que se faz o que faz é por conta de algum trauma e ou uma defesa por não conhecer o lado certo. Todos são humanizados e não maniqueístas. Todos são “idiotas”, “vacas” e “bons sujeitos”.

Ao longo do filme, a encenação à teatralidade (com destaque à narração final de uma carta póstuma ultra sentimental) fica mais evidente, ainda que pela interpretação soberba, de entrega absoluta, de Frances, que rouba a cena, deixando todos coadjuvantes em seu mundo planejado. Eles entendem-se em seus conflitos, em suas farpas, em suas violências, em suas brigas. São cúmplices de um universo que já aceitaram como normal. Concluindo, como já foi dito, é um filme de momentos, de elipses unificadas e construídas para que Frances McDormand e sua Mildred Hayes possam brilhar única e majestosamente.

3 Nota do Crítico 5 1

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