Curta Paranagua 2024

Paraíso Perdido

A nostalgia de uma época viajante

Por Fabricio Duque

Paraíso Perdido

Não há nada de perdido em “Paraíso Perdido”, novo filme da diretora de “O Pai Ó”, Mônica Gandenberg. Mas também não há paraísos. Busca-se então uma organicidade, uma atmosfera caseira de imersão no gênero coral. É uma novela musical e musicada com sucessos abrasileirados, estes que incluem Marcio Gleyck a Ângela Maria, passando por Odair José, Reginaldo Rossi, Raul Seixas, Núbia Lafayette (“hino das mulheres traídas”), Johnny Hooker e seu “Amor Marginal” e pela versão nacional de “You are so vain”, de Carly Simon.

Tudo de forma performática e livre por seus próprios atores personagens sobre vidas que sobrevivem à margem em um mundo incompatível. É um filme de esquetes, de dramas pessoais, de causas, efeitos, sentimentos, consequências e acasos.

É um longa-metragem que usa a própria vida para realizar uma análise social. De antropologia existencialista. De espontaneidade nas ações e reações. “Paraíso Perdido” quer uma improvisação amadora do instante, não perdendo tempo com detalhes, etiquetas e com a preocupação torta dos outros.

Nós espectadores adentramos neste universo boêmio e submundo de verdades e vívidas experiências passionais, que potencializam a incondicionalidade do amor, da paixão, do desejo, da entrega e da luta diária em conservar e corroborar o que realmente são. Sem máscaras, jogos, aparências. Todos expõem seus lados primitivos, cada um em seu limite, idiossincrasia e unicidade. Juntos são invencíveis.

É um filme sobre o amor, sobre o amor, sobre não desistir das possibilidades, tampouco das ajudas do universo. E sobre mitigar todo e qualquer traço de defesa que impede a plenitude do “presente”.

“Paraíso Perdido” é para “esquecer da vida lá fora”, entrar no “lugar para aqueles que sabem amar” e sentir que vivemos um mundo Kitsch de Pedro Almodóvar com a melancolia resiliente de Portugal com a brasilidade de “Madame Satã”. Aqui, há vida no estranho distanciamento.

É um filme que quer ser como um exemplo daquelas obras que potencializam dramas populares e que dilaceram corações, entre flertes, investidas, forçadas frases de efeitos em discursos teatrais, decepções amorosas, violências físicas, sinceridades morais (“espantado não, curioso”), ingenuidades, abandonos, sensibilidades, “Kill Bill”, fotos antigos, tangos, abortos e seus procedimentos, purezas do ainda acreditar no amor (“às vezes uma carinha feliz é só uma carinha feliz”), tudo é mais romanceado e suavizado, principalmente a interpretação dos atores no “palco” e na vida, poupando o próprio espectador da realidade nua e crua com a sensação humanizada e iminente da esperança (“continue sorrindo mesmo doendo”).

“Paraíso Perdido” é objetivamente e passionalmente brega e líquido, buscando propositalmente o fora do tom e suas reviravoltas, os reencontros e os amores especiais de novela mexicana, como a redenção-salvação da mãe surda, que se comunica na linguagem de sinais com o filho “atento” e por consequência com o espectador (nos inferindo a “A Forma da Água”, de Guilhermo Del Toro; e ou o “travesti seguro que adora ser homem” (que inferimos também a música “Arrancame La Vida”, de Chivirico Davila, trilha de “Casa Roshell”).

É um filme que quer tudo. Abordar inúmeras questões sociais (ditadura, manifestações), novas histórias e novas dores com formas diferentes de reações. Ora sentimos a emoção natural, ora os diálogos são mais urgentes, mais forçados, mais diretos. Isso cria uma narrativa irregular de colagens de momentos. Ora rimos com a perspicácia de algumas tiradas (“Quando um artista precisa explicar sua arte ao público, um deles é burro”). “Ser mãe é a experiência mais radical de todas”, diz-se. Ora somos acometidos de uma picardia nostálgica de “vivo fugindo sem destino comum” quando Erasmo Carlos canta “120, 150, 200 Km por Hora” de Roberto Carlos.

“Paraíso Perdido”, com direção musical de Zeca Baleiro, é sobre uma família como qualquer outra. Disfuncional e encantadora com suas existências livres, trágicas, sedentas e sem rótulos, que vivem em paraíso perdido que não tem mais espaço nos nossos dias atuais. “Felicidade é ter um pouco e saber gostar de alguém e quem tudo quer do amor, nada terá”. É tanta reviravolta, tanto melodrama e tanto elemento açucarado que minha glicose foi à lua. Mas não podemos negar que o doce ofertado não é ruim. Com todos os altos e baixos, nos podemos dizer que ficamos na parte superior da grua contextual.

3 Nota do Crítico 5 1

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