14 anos de espera
Por Vitor Velloso
Quatorze anos depois do lançamento, do já considerado clássico, “Os incríveis”, A Pixar retorna com Brad Bird para dar continuidade à franquia. E a espera valeu a pena.
Abrindo com “Bao”, curta dirigido por Domee Shi, que apela para todos os tipos de fofura encontrados em grupos de facebook. É um filme fraquíssimo, diferente do que a Pixar costuma fazer. Contando inclusive com o imperialismo do padrão de beleza se apoderando de seus 8 minutinhos.
“Os Incríveis 2” começa exatamente de onde o primeiro havia terminado. Com o ataque no estacionamento. Já de primeira podemos ver que a animação se manteve aos traços do original, mas evoluiu muito em suas texturas e detalhes, os movimentos estão muito mais fluidos. E como velocidade sempre foi um dos fortes desta franquia era necessário vermos essa movimentação gráfica surgir de maneira mais orgânica. É um dos pontos fortes do filme, essa ação constante sempre brincando com a inércia que explode em movimentos absurdos. Essa quebra de tom, se reflete também nas cores, que está vividas e saltando os olhos.
A trama acompanha a família Incrível sendo surpreendida, novamente, pela lei da ilegalidade dos heróis. Ao receber uma proposta, junto ao Gelado, para trabalhar com uma empresa, um casal de irmãos especificamente, que está buscando convencer o governo que os heróis são necessários. Porém, uma surpresa, a primeira missão será realizada apenas pela Mulher Elástico, o que incomoda Sr. Fantástico. Ela vai para a missão relutante em deixar sua família. Beto (Sr.Incrível), está encarregado de ser apenas um pai comum, lidando com o crescimento de seus filhos. Enquanto surge o vilão do filme, o Hipnotizador, que Helena (Mulher Elástico) deve combater.
O interessante da história, é esse protagonismo feminino, que também se reflete na criadora da empresa. É bom ver um desenvolvimento maior da personagem de Helena e como ela reage ao saber que está sendo valorizada, sem estar a sombra de seu marido. Ao mesmo tempo que vemos Beto sofrendo horrores, por passar apenas alguns dias do que ela faz o ano inteiro. Mas o centro de desenvolvimento de personagem está girando em torno dos filhos, Flecha e Violeta, recebem mais atenção do roteiro, junto ao bebé Zezé, a grande figura do longa. Que começa a descobrir seus, muitos, poderes, mas não sabe controlá-los, gerando as situações mais engraçadas do filme.
Essa montagem paralela entre a família e a Mulher Fantástico é construída através da própria linguagem. A intensidade das ações da heroína são passadas pela duração dos planos e pela velocidade com que a “câmera se move”, além da trilha sonora, é claro. Inclusive, existe algum espaço para pequenas brincadeiras formais, como em uma luta com o Hipnotizador, vemos luzes piscando, contornos super definidos, os cortes acontecendo de forma mais brusca (há um aviso sobre os riscos que algumas cenas possuem).
Enquanto víamos um projeto original conquistando o público em 2004, hoje assistimos uma fórmula de sucesso, sendo reprisada na tela. Não há, de forma concreta, algo que justifique esta continuação. Apenas o sentimento de nostalgia que abate todos que relembram do clássico, que é utilizada como argumento para se iniciar a nova trama. Uma repaginação quanto a alguns termos é feita, como esse tema do machismo, que é abordado com frequência em diálogos. Já buscando uma normatização do protagonismo feminino.
Um pequeno paralelo pode ser feito num determinado momento com O.J Simpson, calma, vou me explicar. Sr. Incrível vê que seu carro foi comprado por um ricaço em um leilão, ele fica irritado e ameaça tomar o carro de volta, por possuir seu controle. Ao ver que sua atitude é imoral, diante da realidade dos fatos, ele desiste. O ex-jogador, assassino, monstro… foi preso exactamente por assaltar um homem que havia comprado seus itens, em um leilão. A relação dos personagens vem do fato de ambos terem sido julgados e soltos. E esta atitude pode representar o fim dessa reviravolta. Brad Bird compreende que a separação entre um homicida e um homem comum, é o moralismo.
Ainda que estes assuntos sejam pincelados durante a projeção, vemos que existe um tom brevemente mais infantil, que antes. Parece que não trata-se de uma homenagem aos fãs do original, mas sim uma tentativa de conquistar um novo público, que cresceu sem assistir o primeiro no cinema.
A previsibilidade e a repetição da fórmula tira um pouco o glamour desta continuação, ainda que vá entreter o público. 14 anos é muito tempo, podia haver uma evolução quanto a seu tom, mas boas risadas e piadinhas com o mundo empresarial, renderão boa diversão para a família.