Ainda há espaço para o Grinch nos cinemas
Por Pedro Guedes
Escrito pelo mesmo Dr. Seuss por trás de histórias como “O Gato de Chapéu”, “Horton e o Mundo dos Quem” e “O Lorax” (todas já adaptadas para o Cinema), “Como o Grinch Roubou o Natal” é um conto infantil que vem encantando gerações de pequenos leitores desde 1957, quando foi publicado pela primeira vez. Dito isso, a trama do livro gira entorno de personagens, situações e temas que se tornaram batidos ao longo das décadas – e a história já foi transformada em animações especiais para a TV, em musicais da Broadway e, claro, num bem-sucedido longa dirigido por Ron Howard que trouxe Jim Carrey no papel principal. O que gera a seguinte pergunta: depois de todas essas adaptações, será que ainda vale a pena fazer mais um filme sobre o Grinch?
Pois a boa notícia é que, mesmo sem conseguir escapar de alguns lugares-comuns, esta nova versão comprova que um dos personagens mais populares de Dr. Seuss ainda pode ter seu espaço no Cinema. Produzida pela cada vez mais poderosa Illumination Entertainment (de “Meu Malvado Favorito” e “Pets – A Vida Secreta dos Animais”), esta animação dirigida por Scott Mosier e Yarrow Cheney segue a mesma premissa das versões anteriores: quando o Natal está chegando e os cidadãos da Quemlândia estão se preparando para celebrá-lo, o amargurado Grinch resolve pôr em prática um plano para roubar os presentes e arruinar a celebração de todo mundo.
Ambientado em um universo visualmente imaginativo e interessante, “O Grinch” acerta ao retratar como os cidadãos da Quemlândia são puros na maneira como se entregam às tradições natalinas – e isto se reflete em piadas divertidas, como aquela que envolve um coral que vive incomodando o personagem-título com suas canções a cappella. E se a fotografia acerta especialmente no momento onde um flashback revela os traumas carregados pelo Grinch (e que é pontuado por sombras e ângulos baixos que tornam tudo mais intimidador), o design de produção se destaca ao imaginar a cidade que abriga boa parte da narrativa como um lugar multicolorido e repleto de casas empilhadas, árvores de Natal colossais e decorações extravagantes. Do ponto de vista estético, o projeto é surpreendentemente dinâmico – o que é complementado pela ótima montagem de Chris Cartagena, que investe em transições elegantes e raccords que ligam uma cena à outra com criatividade.
Já os personagens seguem arquétipos bem definidos que, embora não sejam dos mais multidimensionais, ao menos surgem representados com o carisma necessário: se a pequena Cindy Lou conquista a simpatia do espectador graças à sua vontade sincera de praticar o altruísmo, o Grinch não se distancia muito do velho perfil do “cara ranzinza e amargurado que aos poucos vai recuperando sua boa vontade” (o Gru, de “Meu Malvado Favorito”, é outro exemplo deste tipo de personagem). Mas se relevarmos isto e a péssima dublagem de Lázaro Ramos (um ator geralmente admirável, mas que aqui mostra-se pouco à vontade ao emprestar sua voz ao protagonista), o Grinch ainda assim revela-se carismático e empático, o que leva o espectador a compreender seus traumas particulares e torcer para que ele os supere sem necessariamente infernizar a vida dos outros.
Por outro lado, o roteiro de Michael LeSieur e Tommy Swerdlow não consegue contornar alguns clichês naturalmente oferecidos pelo material-fonte escrito por Dr. Seuss: há um personagem rabugento que aprende “o real espírito do Natal”, uma menina simpática cujo único desejo é ver sua mãe feliz e até mesmo uma lição de moral que mostra para o personagem-título como é importante ter amigos leais ao seu redor – e qualquer um que comece a ver esse filme será perfeitamente capaz de imaginar como será seu desfecho, já que a narrativa passa longe de ser das mais criativas. Além disso, o ritmo da história perde o fôlego em seu segundo ato, que soa inchado, burocrático e repetitivo.
Em compensação, o longa recupera todo o dinamismo que havia perdido quando chega ao ato final, que, mesmo concentrando-se em lições de moral que já foram retratadas em milhares de outras obras, ainda assim revela-se fofo e tocante o suficiente para emocionar o espectador. No fim das contas, “O Grinch” pode até não ser a mais inventiva das animações, mas isto não a impede de ser adorável e divertida o suficiente.