Figurino luxuoso, roteiro padronizado
Por Vitor Velloso
Projetos com uma previsibilidade assombrosa fazem parte dos cinemas do mundo inteiro. Alguns não possuem uma fagulha de originalidade, outros assumem isso e uma parcela só quer fazer parte de um pequeno grupo de pompa. “Mademoiselle Paradis” é dirigido por Barbara Albert. Mais um longa de época europeu que busca salientar a beleza e a cultura de um tempo passado. Na Europa. As produções destes filmes são impressionantes, figurinos luxuosos, direção de arte rica em sutilezas, uma fotografia que possui presença etc. Já no roteiro e direção… Parece um pastiche de outros cineastas, é raro vermos estes longas e compreendermos uma autoria ou uma ousadia em questões formais, normalmente são planos fixos com uma música clássica tocando, que será interrompida por alguma discussão extremamente europeia (gritos e postura impecáveis)… Essa estrutura está tão datada e batida, que torna-se um exercício doloroso ir assistir uma película assim. E acredite, “Paradis”, é tudo isso.
A diferença é que Maria Paradis é interpretada por Maria Dragus (de fato brilhante como estão dizendo) e só. Toda a construção clichê está no progresso da trama do filme, ainda que a temática possua uma diferença já na essência, toda a cadência que é dada fortalece as convenções. Essa retroalimentação dos moldes desses projetos, apenas enfraquece o gênero e a indústria, que curiosamente é a que costuma impôr padronização. A mediocridade aceita pela maioria é o que salienta a fragilidade de grandes produções. E quando um lançamento deste, chega aos cinemas que 80% é ocupado por Vingadores, vemos que o Brasil está pior que parece, onde víamos um fim do poço, era só o início.
A conjuntura do mercado europeu, somado a falta de apoio à cultura brasileira, faz com que cinemas de shopping estejam exibindo Disney e os de rua, longas europeus, sobre cultura européia, com dramatizações aristocráticas. A proposta do longa é exatamente igual a de todos os últimos longas de época vindos do velho continente, não muda uma vírgula, a mesma estrutura em atos, com viradas de roteiro que respeita o “espaço da personagem”. Essa arte de contar histórias sem um mínimo brio formal, é uma das maiores covardias contemporâneas (mas já é um problema de longa data). Não que a atitude (covarde), seja algo novo na história dos europeus. Aliás, retrocesso é uma das palavras de ordem do continente na atualidade, seja politicamente, socialmente ou artisticamente, porém, a necessidade de colonizar um determinado ponto jamais é deixada para trás. A atitude canhestra de absorver as referências próprias são curiosas, ao analisarmos que tais cânones estão fora de seu tempo, há algumas décadas. Mas como a noção contemporânea é limitada aos próprios limites, não há reinvenção, e o ego destruiu a arte.
“Mademoiselle Paradis” entende-se dentro de uma limitação temporal, que tensiona sua linguagem àquela mediocridade comentada anteriormente, nada surpreende. A direção mantém-se apática diante da misancene que arquiteta, a interferência é mínima, apenas a construção imagética é “autoral”. A cultura de fixação do plano e do foco que compreende o todo, pois a pintura é fundada assim, é algo que funciona quando seu foco é historicidade, mas se a proposta é um drama que é construído a partir de uma personagem específica, e que recebe uma interpretação melhor que o filme merece, com Maria Dragus no comando, a intenção é de uma rigidez estética fajuta, porque não há de fato uma defesa plástica àquilo, apenas uma convenção que é mantida nos meios de produção. A montagem segue o padrão da métrica, mantém os planos algum breve momento após um diálogo, ou reação, a fim de estender um pouco a duração do que se vê, sem comprometer absolutamente nada.
O tédio é parte da equação, a lentidão não é contemplação e a mediocridade é a receita. Quanto mais avançamos no ano, somos capazes de perceber a vastidão de produções como essa, não trata-se de uma pequena parcela dos cinemas das áreas nobres, mas sim da maioria, pois o modelo não ficou preso apenas na Europa, ele foi importado para diversos lugares do mundo, incluindo América Latina.