Um verdadeiro filme de Superação
Por Marcus Teixeira
Antes de qualquer coisa, você precisa saber o mínimo sobre ELA, abreviação para Esclerose Lateral Amiotrófica, doença degenerativa que destrói progressivamente os neurônios motores do cérebro. A expectativa de vida, após o diagnóstico é de dois a quatro anos. No Brasil, estima-se que quatorze mil pessoas sofram da doença. Importante trazer essa informação para a crítica, para compreender o que faz de “A luta de Steve” um documentário relevante e emocionante.
“Menina de Ouro” e “Como eu era antes de você” entre outros são alguns dos vários filmes hollywoodianos que já abordaram uma questão que parece agradar os espectadores: Histórias de superação. A permissa é a mesma, pessoas bem-sucedidas que por conta de algum evento, transformam suas vidas. Nesses filmes cenas são pensadas com o único objetivo de emocionar quem assiste. As câmeras capricham no enquadramento. A trilha sonora é melancólica, dramática, assim como o texto. Todo o conjunto da obra é a emoção.
“A luta de Steve”, documentário feito com vídeos gravados pelo personagem principal do filme, Steve Gleason. Ex atleta de futebol americano que decide se aposentar dos gramados. O corpo, até então, acostumado a uma rotina de exercícios, já não reage mais com a mesma rapidez de antes. Fazendo com que ele busque ajuda de médicos, que acabam diagnosticando a Esclerose Lateral Amiotrófica.
Quase em seguida ao diagnóstico da doença, Steve descobre que a esposa, Michel, está grávida de algumas semanas. A partir desse ponto pegue o lenço e prepare sua emoção. Não vão faltar motivos para você se emocionar com a luta de Steve. Mas ao contrário dos blockbuster hollywoodianos esse documentário não foi pensado para você ou para mim, ele é todo feito para Rivers, filho, que ainda não havia nascido, de Steve e a Michel.
Com uma estimativa de vida entre dois e quatro anos, Steve, passa a criar um diário na internet, onde posta vídeos, para que seu filho possa assistir futuramente e perceber toda a importância que teve, ainda que indiretamente, na luta do pai contra a doença.
A doença a princípio não o abala o ex atleta. Com a ajuda de Michel, ele ainda tenta manter a mesma rotina. Viajando e fazendo o possível para se divertir com os amigos. É durante a gestação de Michel, que podemos acompanhar como a Esclerose age no corpo de Steve. Os sintomas começam a provocar tensão em que assiste. A dificuldade de locomoção e a dificuldade para fala, tudo isso em menos de nove meses. Causa uma empatia com o sofrimento dos personagens.
A luta do ex atleta, chama a atenção da mídia. Ele então decide fundar a Fundação Steve Gleason, para auxiliar pessoas com a mesma doença. Steve passa a se dedicar cada vez mais a fundação, recebendo apoio de várias pessoas e cobrando do Estado tratamento para os portadores da ELA. A medida que a gravidez de Michel avança, Steve se mostra mais determinado a lutar pela vida, para ter a oportunidade de conhecer o filho.
O documentário é realizado basicamente com os registros de Steve. Em quase todos os vídeos ele está falando para Rivers. Há outros depoimentos que se misturam aos vídeos. Porém, sem dúvida, o diferencial desse filme é a exposição dos personagens principais. Não é só dele o filme. A luta, ali, não é única. Todos os familiares, em especial a esposa e o pai de Steve, estão expostos. Em vários momentos parecem esquecer que estão sendo filmados e dividem de maneira muito franca, muito honesta o sofrimento deles.
Steve ciente dos estágios da sua doença, aproveita o tempo para ficar mais próximo a família. A aproximação com o pai rende cenas emocionantes. A vontade de ajustar pontos de vista divergentes, como por exemplo, formas de ver o mundo, formas de expressar a fé, formas de perceber Deus, criam cenas cheias de emoção.
Conforme o tempo passa e o, aparente, esquecimento das câmeras evidenciam o amadurecimento da família, que parece cada vez mais esgotada com toda exposição e com os efeitos da doença no cotidiano deles.
Lançado em 2016 o documentário já participou de alguns festivais. O longa venceu o Prêmio do Público no SXSW Film Festival 2016, além de ter concorrido no Festival de Sundance (2016), ao Grande Prêmio do Júri. Clay Tweel assina a direção e assina o roteiro desse documentário.
A câmera registra toda a escassez de perspectivas na melhora de Steve. O desespero. A falta da fala. O medo. Está tudo registrado. O despudor em revelar a dor, ao mesmo tempo em que luta para encorajar outras pessoas é o principal atrativo do documentário. A luta do ex atleta é um documento real do sofrimento de milhares de pessoas pelo mundo, que estão nesse momento perdendo suas falas e seus movimentos. “A luta de Steve” é um filme que merece ser visto, embora, não tenha sido pensado para nenhum de nós.