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Era uma Vez Um Deadpool

Pra quê?

Por Pedro Guedes

Era uma Vez Um Deadpool

A graça do Deadpool consiste em vê-lo falar palavrões, esquartejar seus inimigos, usar drogas pesadas, utilizar a metalinguagem para referenciar a cultura pop e se comunicar diretamente com o espectador através da “quebra da quarta parede”. Há poucos anos, existia um debate recorrente em Hollywood a respeito dos blockbusters voltados ao público adulto: será que valia a pena investir dezenas de milhões de dólares em um projeto que não poderia ser visto por crianças e adolescentes? Pois foi o primeiro (e muitíssimo bem-sucedido) “Deadpool”, lançado em 2016 sob a direção do estreante Tim Miller, quem pôs um ponto final nessa discussão – e não é à toa que, pouco mais de um ano depois, “Logan” resultou em mais um sucesso indiscutível.

O que nos traz a “Era Uma Vez um Deadpool”, que pouco mais é do que uma versão de Deadpool 2 feita para se adequar à censura PG-13 – ou seja: nada de palavrões, sangue ou drogas; somente as habituais piadas metalinguísticas e umas cenas adicionais contando com a participação de Fred Savage (em uma referência divertidinha ao clássico “A Princesa Prometida”, onde o ator – ainda criança – permanecia deitado numa cama enquanto sua avó lia um livro para ele). Ora, qual a graça de ver um filme do Deadpool se ele não vai poder exibir seu superpoder (a avacalhação)? É como um filme do Homem-Aranha onde ele não poderá disparar teias. Ou um filme do Super-Homem onde ele não voará. Ou um filme do Quarteto Fantástico onde os heróis não interagirão como uma famíl… ah, esquece: isso aconteceu em 2015, no reboot comandado por Josh Trank. E o resultado não foi nada bom.

O primeiro – e maior – problema de “Era Uma Vez um Deadpool” encontra-se no mau aproveitamento de suas boas ideias. As passagens envolvendo Fred Savage, por exemplo, são bem irregulares: de vez em quando, surge uma piada mais eficaz (como os blips que servem para esconder um palavrão e, em certo momento, acabam encobrindo um “fight” confundido com “fuck”); nos demais instantes, porém, os diálogos entre Deadpool e Fred se resumem a referências à cultura pop que raramente soam inspiradas (por que o simples fato da Disney ter comprado a Fox deveria me fazer rir?). Além disso, o roteiro e a montagem não parecem ter muita ideia de como encaixar estas sequências na narrativa, já que elas aparecem com relativa frequência nos primeiros trinta minutos de projeção e são praticamente esquecidas depois disso.

Em outras palavras: “Era Uma Vez um Deadpool” é, na maior parte do tempo, o mesmo filme ao qual assistimos há alguns meses (“Deadpool 2”), porém picotado para atender às novas necessidades comerciais da Fox. E como está picotado! As sequências de ação, que antes contavam com tiros perfurando a pele dos personagens e jatos de sangue voando para tudo quanto era lado, desta vez estão editadas justamente para remover a violência gráfica – o problema é que esses cortes frequentemente prejudicam a compreensão e a continuidade das cenas que mostram lutas/tiroteios/perseguições, já que excluem o resultado de certas ações e o desfecho de alguns planos específicos.

Não que o filme tenha ficado ruim; afinal, “Deadpool 2” é bastante divertido e continua a sê-lo mesmo com todos esses contratempos: a sequência que traz a recém-formada X-Force sendo continuamente trucidada (ao som de “Thunderstruck”, do AC/DC) segue hilária, ao passo que toda a relação entre Deadpool e Cable se estabelece através de contrastes entre ambos os personagens que tendem a tornar a interação entre eles mais interessante (e os atores, claro, cumprem bem suas funções, com Ryan Reynolds injetando carisma a um anti-herói que poderia se tornar chato, Josh Brolin conferindo intensidade a um Cable que não se leva tão a sério e Zazie Beetz brilhando como a sortuda Domino).

Ocasionalmente encontrando uma forma divertida de contornar os momentos mais pesados da versão original (quando Deadpool busca um saquinho de cocaína, este vem acompanhado de uma legenda que diz “Açúcar”), “Era Uma Vez um Deadpool” nada mais é do que um extra de blu-ray que, por algum motivo, acabou indo parar nos cinemas. E o motivo para isso não poderia ser outro: o velho e traiçoeiro dinheiro.

Tomara que essa nova versão não signifique uma mudança definitiva para a franquia e que “Deadpool 3” não dê preferência ao caminho do PG-13. Afinal, qual a graça de ver um super-herói sem que ele possa usar seus verdadeiros superpoderes?

3 Nota do Crítico 5 1

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